A pasta ainda aponta que os técnicos tiveram dificuldade para analisar os códigos-fontes dos sistemas eleitorais por causa das restrições impostas pelo TSE.
Como a Folha revelou, a equipe da Defesa passou duas semanas no tribunal analisando os códigos com anotações em caneta e papel. Como sugestão, a pasta pede que seja possível levar equipamentos próprios para a etapa de auditoria.
O relatório propõe ainda que as entidades fiscalizadoras possam usar "ferramentas de análises dinâmicas" para analisar os códigos e que seja concedido o "acesso às bibliotecas de software desenvolvidas por terceiros".
Em outra frente, o Ministério da Defesa afirmou que o projeto-piloto do teste de integridade com biometria teve baixa participação, o que, na avaliação da pasta, não permite tirar conclusões efetivas do resultado.
A pasta destaca, como outras "deficiências", o fato de alguns estados não participarem do projeto e a escolha pré-definida das seções eleitorais cujas urnas seriam testadas, sem o conceito da aleatoriedade.
Apesar das sugestões de melhoria e dos problemas apontados, a Defesa afirmou que todos os procedimentos estatísticos ocorreram sem ressalvas.
A análise dos boletins de urnas, como revelado pela Folha, não identificou divergência nos dados registrados com os votos totalizados pelo TSE.
"[No segundo turno,] por meio da comparação de 501 BU (Boletins de Urna), é possível inferir, com um nível de confiança de 95%, que a média de BU com inconsistências, dentro todos os BU do espaço amostral, é 0%, com um erro de até 4,38 pontos percentuais", concluiu.
Em outra frente, o teste de integridade tradicional também não registrou problemas —o que mostra que as urnas testadas computaram corretamente os votos.
"O Teste de Integridade (sem biometria) não encontrou, em todos os TRE, inconsistências nas urnas escolhidas e sorteadas. Conclui-se que o Teste de Integridade foi realizado em conformidade com o previsto."
O relatório é assinado pelo ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, e os coronéis integrantes da equipe de fiscalização Marcelo Nogueira (Exército), Wagner Oliveira (FAB) e Marcus Rogers Cavalcante (Marinha).
Segundo informações do TSE, os repositórios usados para o desenvolvimento dos sistemas não estão expostos na internet e, no casos em que foi necessário acesso remoto, ele foi realizado por meio de acesso individualizado, com uso de VPN e múltiplo fator de autenticação.
As Forças Armadas foram incluídas na lista de entidades fiscalizadoras da eleição em 2021, por decisão do então presidente do TSE, Luís Roberto Barroso.
A medida, cujo objetivo era reduzir as manifestações golpistas de Bolsonaro, foi vista na cúpula do Judiciário como um tiro no pé, já que a atuação dos militares deu ainda mais munição para o presidente atacar as urnas e criar desconfiança no processo eleitoral.
Paulo Sérgio Nogueira, visto na caserna como um político habilidoso, com capacidade de reverter situações adversas, passou a ser alvo de críticas de colegas de farda por fazer coro às reclamações de Bolsonaro. Em defesa, o ministro diz que a atuação da Defesa no processo eleitoral sempre foi técnica.
Durante a gestão de Edson Fachin à frente do TSE, a relação do tribunal com o Ministério da Defesa foi marcada por desavenças. O ministro negou pedidos de Paulo Sérgio para que as equipes técnicas da pasta e do tribunal se reunissem para tirar dúvidas.
Em resposta, a Defesa enviou uma série de ofícios com questionamentos para o tribunal. No momento de maior crise, em junho, Paulo Sérgio disse que as equipes da pasta não se sentiam "devidamente prestigiadas" na discussão sobre o processo eleitoral.
Alexandre de Moraes assumiu a presidência do TSE em agosto e definiu a mudança na relação com o Ministério da Defesa como uma das prioridades de sua gestão.
Antes de completar uma semana no cargo, Moraes recebeu o ministro Paulo Sérgio e técnicos da Defesa para discutir a criação de um projeto-piloto do teste de integridade com biometria –a principal sugestão da equipe militar.
Em 13 de setembro, 19 dias antes da eleição, o TSE aprovou a mudança no teste de integridade e firmou um armistício com o Ministério da Defesa.
O mal-estar voltou após a Folha revelar, em setembro, que os militares planejavam analisar 385 boletins de urna para checar a contagem dos votos feita pelo TSE —trabalho permitido para qualquer cidadão ou entidade fiscalizadora.
A crise voltou a se intensificar após a Defesa se negar a enviar um relatório com os resultados da fiscalização do primeiro turno das eleições, como fizeram outras entidades fiscalizadoras, como o TCU e a Transparência Eleitoral.
Sem o documento, Moraes chegou a se negar a analisar sugestões apresentadas pela Defesa de melhoria no segundo turno das eleições.
"Noticia que as sugestões recebidas do Ministério da Defesa serão analisadas assim que esta Corte Superior venha a receber o relatório final das Forças Armadas acerca do assunto", disse o ministro, em ofício.