IMAGEM: Letycia Bond/Agência Brasil

Na última semana, a bandeira pelo fim da jornada de trabalho 6×1 retornou à agenda pública brasileira. A pauta, que tomou muitos setores da esquerda de surpresa, tem atraído milhares de trabalhadores e trabalhadoras que veem suas vidas sufocadas pela jornada extenuante e por condições de trabalho cada vez mais precárias.

Pietro Borsari, Ezequiela Scapini,
José Dari Krein e Marcelo Manzano*

Não são poucos os relatos nas redes sociais de sobrecarga e assédio no âmbito de trabalho e só a petição pública feita pelo VAT (Movimento Vida Além do Trabalho) já conta com mais de 2 milhões de assinaturas.

A forte adesão à proposta de acabar a jornada 6×1 e reduzir a jornada é 1 grito de socorro contra a subordinação do tempo da vida somente ao trabalho, com escalas que desorganizam a vida, com baixos rendimentos e ausência de oportunidades de trabalho. O grito é tão forte que sensibiliza grande parte da sociedade, especialmente, a juventude que busca ter horizontes mais promissores para a vida.

A vida não é só trabalho. Pelo contrário, o trabalho precisa proporcionar as condições para as pessoas viverem essa em todas as dimensões. Mesmo quem trabalha na jornada “padrão” 5×2 está cansado o suficiente para saber que deve ser desumano trabalhar 6 dias e folgar 1, que nem sempre coincide com o domingo. O fim de semana de 2 dias é curto e passa rápido — mal se descansou e o final de domingo se apresenta angustiante com o retorno ao trabalho na manhã seguinte. Na 6×1 não há fim de semana, há respiro breve entre outros 6 dias de trabalho.

As pessoas querem viver além do trabalho

A onda de protestos na sociedade contra a jornada 6×1 expressa descontentamento mais amplo das pessoas com o mundo do trabalho. O sentimento é que se trabalha muito, se recebe insatisfatoriamente e resta pouco tempo para o descanso, o ócio, o lazer, a sociabilidade com a família e os amigos, o estudo, o cuidado com a saúde física e mental, a vida sexual e outras tantas dimensões que compõem o ser humano para além do trabalho. Ecoa-se o grito desesperado de quem percebe que vida está toda em função do trabalho e da reprodução social, ao passo que as coisas que importam são postas em segundo plano.

Não há dúvida que o trabalho é 1 eixo estruturante da vida social. O problema não é trabalhar, mas somente trabalhar e entrar em dinâmica de luta pela sobrevivência que não lhe permite viver. Vale lembrar que a média salarial no Brasil, ainda que tenha tido crescimento anual de 4%, é de R$ 3.222, segundo dados da Pnad (abril, 2024), e que 53 milhões de brasileiros necessitam ocupação ou ocupação melhor, somando desocupados, desalentados, pessoas sem condições de trabalhar, mas que gostariam, trabalhadores sem carteira assinada ou que estão em busca de estratégias de sobrevivência. Ainda, possuir trabalho formal não é garantia de que se tenha trabalho não precário.

A juventude tem encontrado 1 mundo do trabalho que lhe parece insuportável, para o qual está levantando a voz e dizendo: isso não é vida. Ainda que a atenção no último período tenha se dado aos chamados “jovens sem-sem” — sem estudo e sem trabalho —, o que corresponde a 25% dos jovens brasileiros, há hoje 70% de jovens inseridos no mercado de trabalho.

Não à toa o movimento VAT é encabeçado por jovens, a exemplo do principal expoente Rick Azevedo. A promessa de que a educação lhes salvaria tem resultado em frustração para muitos, apesar de ter níveis de escolaridade superiores aos dos pais, não tem garantido vida melhor.

Aproximadamente 15% dos jovens que se formaram no ensino superior conseguem emprego na sua área de formação (Nube, 2020). Há ainda grande frustração com o que se encontra no mercado de trabalho, que não somente é incapaz de proporcionar recompensas financeiras satisfatórias como oferece ocupações em que as pessoas não se realizam.

Nesse sentido, mais que crítica pontual ao regime de jornada trabalho 6 por 1, há manifestação social latente sobre as relações com o trabalho e as condições em que se trabalha. O nível de adoecimento psíquico decorrente do trabalho é alarmante e atinge toda a classe trabalhadora. Só em 2022, segundo o INSS, mais de 209 mil pessoas foram afastadas do trabalho por transtornos mentais em nosso País.

Reproduz-se sociedade adoentada, com jornadas exaustivas, assédios de diferentes natureza, pressões por resultados crescentes, insegurança financeira e a convivência com o medo permanente de perder o emprego. Para a OIT (2022), houve aumento significativo no número de pessoas com algum problema de saúde mental, com total de 13% de pessoas em 2019 em nível mundial e, estima-se, que 12 bilhões de dias de trabalho são perdidos devido a esse tipo de problema, custando ao redor de 1 trilhão de dólares à economia. Há relação direta entre jornadas extenuantes e adoecimento físico e mental do trabalhador.

Quanto à juventude, segundo o Dossiê da Fiocruz de 2024, Panorama da situação de saúde de jovens brasileiros, entre 2016 e 2022 , identificou-se que a taxa de acidente de trabalho foi maior entre os jovens em comparação com as demais faixas etárias — 219,78 casos para jovens de 20 a 24 anos, 209,44 no caso de jovens de 25 a 29 anos, ambos calculados por 100 mil habitantes —, indicando maior exposição dos jovens ao acidente de trabalho, tendo como causa primeira as circunstâncias relativas às condições de trabalho.

Os grupos profissionais mais notificados entre os jovens foram os trabalhadores da produção de bens e serviços industriais e os inseridos nas atividades de serviço, vendedores do comércio em lojas e mercados. Além disso, na última Conferência da Juventude, em 2023, o tema da saúde mental foi o mais lembrado, recebendo 41% das propostas para resolução do problema.

Não à toa, já que 8 a cada 10 jovens entre 15 e 29 anos apresentaram algum transtorno de saúde mental em 2022. Para a Fiocruz, o número de notificações de jovens com transtorno mental relativo ao trabalho é maior entre os jovens de 25 a 29 anos, com prevalência do sexo feminino. As principais causas são estresse pós-traumático, transtornos de adaptação, transtorno misto ansioso e depressivo e ansiedade generalizada. Em síntese, é quadro assustador para o futuro do País.

A jornada 6×1 é apenas parte do problema. Não obstante, seu enfrentamento tem o potencial de mobilizar pautas historicamente centrais das lutas dos movimentos dos trabalhadores. Revogar a jornada 6×1 parece passo importante na direção da redução da jornada de trabalho em geral — nunca é demais lembrar que as 44 horas por semana (acrescidas das horas extras) foram instituídas há 36 anos na Constituição Federal de 1988 e que o Brasil está bastante defasado frente experiências bem-sucedidas de implementação de jornadas laborais abaixo das 40 horas semanais em diversos países, tais como as experiências recentes de instituição de jornadas de 4 dias na Islândia, Alemanha, França, Inglaterra, Bélgica, nos Emirados Árabes, entre outros1.

Vale também lembrar que parte significativa dos trabalhadores brasileiros não tem acesso aos direitos do trabalho, muitas vezes trabalhando numa escala 7×0, isto é, 7 dias de trabalho sem descanso, a exemplo de muitos trabalhadores informais, por conta própria e de empresas de plataformas digitais — atualmente cerca de 40% dos trabalhadores estão na informalidade, traço histórico da formação do nosso mercado de trabalho.

Com excedente estrutural de força de trabalho que se manteve durante o processo de industrialização e da expansão do assalariamento, o nosso passado escravocrata legou à população negra, especialmente às mulheres, os trabalhos mais precários, com os piores salários e as piores condições laborais. Em mercado de trabalho heterogêneo e marcado pela desigualdade, a informalidade e a precariedade não são específicas de 1 ou outro momento, mas marcas estruturais que se acentuaram no período neoliberal.

Falacioso argumento econômico

os principais argumentos daqueles que se posicionam contrariamente ao fim da jornada na escala 6×1 são de natureza econômica — o que por si só é fato interessante, pois no campo da sociabilidade, da autonomia humana e da saúde física e mental não há margem para dúvida: a escala 6×1 é péssima.

A síntese do argumento econômico é que eliminar a possibilidade de escala 6×1 teria por efeito a redução de empregos e o aumento de custos para os negócios e, portanto, aumento de preços para os consumidores e prejuízo para as empresas. Os defensores da manutenção atual fazem “terrorismo” ao dizer que a simples aprovação da proposta seria ruim para o conjunto da economia, com perda de competitividade (e falência) das empresas, gerando aumento do desemprego.

Trata-se de argumento recorrente, utilizado em outros momentos históricos para alarmar a sociedade que a introdução de direito ou proteção social quebraria a economia e o País — foi assim quando da implementação do 13º salário ou do salário mínimo. Para exemplificar, se o governo brasileiro tivesse ouvido os economistas hegemônicos (neoclássicos), a grande mídia e os setores empresariais, não teria instituído a política de valorização do salário mínimo em 2004 em diante.

Os argumentos hegemônicos apontavam que a elevação do salário mínimo geraria inflação, desemprego, informalidade e imenso déficit nas contas públicas. Todos sabemos que os resultados não foram os previstos, pelo contrário, é incontestável que o salário mínimo teve efeitos muito positivos sobre a economia e melhora do bem estar de muita gente.

O fato é que o custo do trabalho é baixo no Brasil e não representa ameaça à competitividade das empresas. Entre 2012 e 2019, o custo unitário do trabalho na indústria teve tendência de queda. Em 2019 a queda foi de 3,6%, sendo o terceiro país com maior redução, atrás da Argentina e da França, respectivamente, em primeiro e segundo lugar. Segundo a CNI (Confederação das Indústrias) (2020), o principal fator para a queda do custo do trabalho foi o aumento da produtividade, cujo crescimento médio foi de 2,9%, somado à queda do salário real em 1,3%.

Na comparação do salário mínimo no plano internacional, segundo levantamento da OCDE em 2021, considerando seus países integrantes, mais Brasil e Rússia, o valor da hora trabalhada foi de US$ 5,2 para o Brasil, deixando o País na 30° posição, a frente somente do México, cujo valor/hora trabalho é de US$ 3,3. Em primeiro lugar com o melhor valor/hora trabalho está Luxemburgo com US$ 27,7, seguido de Holanda com US$ 26,2 e Austrália, com US$ 25,2.

Por outro lado, o Brasil possui 1 das mais altas jornadas anuais do mundo. Segundo levantamento da OCDE (2022), o Brasil ocupa a 4° posição de 46 países considerados, com média anual de 1936 horas trabalhadas. Em primeiro lugar está o México com 2.128 horas, seguido de Costa Rica, com 2.073 horas e, em terceiro lugar, Colômbia com 1.964 horas anuais. Recordar-se que, durante o discurso de posse da presidente do México, Claudia Scheinbaum, em outubro de 2024, a nova mandatária apontou como promessa do governo a redução da jornada de trabalho de 48 horas semanais para 40 horas. Os países com a menor média anual são Alemanha, em primeiro lugar, com 1349 horas anuais, seguido de Dinamarca, com 1.363 horas, e Luxemburgo, com 1.382 horas.

O importante é enfatizar que a redução da jornada de trabalho é demanda elementar dos trabalhadores no capitalismo, vez que os ganhos de produtividade decorrentes dos avanços tecnológicos, de processos e de gestão permitem se produzir cada vez mais com menos trabalho. Reduzir a jornada de trabalho com preservação dos salários é 1 forma de distribuir esses ganhos de produtividade construídos pela coletividade.

Fim da escala 6×1 e adequação dos negócios à nova realidade

A benéfica extinção da jornada 6×1 produziria efeitos modestos e diferenciados entre as empresas, conforme o setor de atividade, a estrutura de mercado e o porte do negócio. Em todo caso, as empresas se adequariam à nova realidade e essa excrescência que pesa sobre os ombros de milhões de trabalhadores deixaria de ser prevista na lei.

Para a economia como 1 todo, nada mudaria significativamente. Embora a alteração dos custos das empresas e o repasse para os preços dependam de muitos fatores, qualquer impacto seria pontual — once and for all, isto é, caso ocorra aumento de preços em determinados bens e serviço, esse aumento não se repetirá, pois no momento seguinte, a legislação será a mesma e, portanto, os custos também.

A elevação dos custos somente ocorreria simultaneamente ao aumento do nível de emprego, na medida em que os negócios que utilizam a escala 6×1 decidam contratar novos trabalhadores para suprir a ausência de força de trabalho ocasionada pela transição para outras escalas, como a 5×2 ou até mesmo a 4×3. Vale notar que, se isso acontecer, haveria duplo benefício social: menos trabalhadores em jornadas degradantes e o aumento dos postos de trabalho. Portanto, o aumento de custos, por 1 lado, poderia produzir efeitos compensatórios na economia como 1 todo, em virtude do aumento da massa salarial — mais gente trabalhando e proporcionando maior dinamismo econômico.

Como indicado, o repasse de custos para os preços depende de muitos fatores e pode variar significativamente de acordo com o segmento de atividade, a concorrência e a estrutura de mercado. Em mercados muito competitivos, como bares e restaurantes em grandes centros urbanos, o movimento dos preços deverá acompanhar a dinâmica de acomodação das novas escalas de trabalho.

Certamente, parte dos estabelecimentos buscará absorver a mudança legal sem novas contratações de trabalhadores, sem que os custos sejam impactados nesse caso. E, outra parte, que considera lucrativo manter o mesmo padrão de funcionamento do estabelecimento, poderá ampliar as vagas, incorrendo em algum aumento de custos, mas que se justificaria pelo volume de vendas — caso contrário não haveria contratação adicional.

Ao mesmo tempo, com mais tempo livre para as pessoas, as atividades de lazer e cultura podem aumentar, o que traria mais clientes. Por outro lado, em mercados dominados por redes de grandes empresas, como os supermercados e farmácias, os novos custos associados à eliminação da jornada 6×1 podem ser absorvidos por esses negócios, de modo a produzir diferentes combinações entre redução marginal da taxa de lucro e aumento marginal nos preços dos bens e serviços vendidos.

Esses seriam os efeitos econômicos mais gerais que poderiam ser esperados com o fim da jornada na escala 6×1. Mas a realidade pode variar entre indústria, comércio e serviço; entre pequena, média e grande empresa. A esse respeito, faremos alguns apontamentos, destacando que a mudança é benéfica em todos os sentidos para os trabalhadores e trabalhadoras, e em nada impactaria negativamente a vida social — ao contrário.

Assim como pode ser benéfica para economia, com menor nível de absenteísmo, adoecimentos, ganhos de produtividade, com trabalhadores satisfeitos e descansados, maior nível de atividade, pois pode ampliar o consumo.

Pequenos negócios

A realidade dos pequenos empreendimentos no País é penosa independentemente das possibilidades de jornada de trabalho. De acordo com levantamento do Sebrae, a partir dos dados da Receita Federal do Brasil entre 2018 e 2021, 21,6% das microempresas encerraram seus negócios após 5 anos de atividade, sendo essa taxa de mortalidade ligeiramente menor para as empresas de pequeno porte (17%)2. Tais dados estão considerando somente os empreendimentos formalizados.

Segundo o Sebrae, aponta-se como justificativa o pouco preparo pessoal, dado que é pequeno o número de pessoas que passaram por algum tipo de capacitação; o planejamento deficiente do negócio, dado que 17% dizem não ter feito nenhum planejamento e 59% dizem ter feito para no máximo 6 meses; assim como gestão deficiente.

Esses fatores se associam à baixa produtividade que caracteriza a dinâmica dos pequenos negócios no País, que operam com reduzida intensidade de capital (tecnologia, máquinas e equipamentos). Alterações nas possibilidades de jornada de trabalho dos empregados não seriam determinantes para modificar a realidade dos pequenos negócios.

Caso 1 negócio dependa integralmente da jornada 6×1 para se manter lucrativo, ou seja, necessite superexplorar os trabalhadores para sobreviver, não é exatamente negócio virtuoso. Cabe pensarmos se desejamos 1 sociedade que ratifique nos termos da lei os negócios que impõem jornadas exaustivas aos trabalhadores para se manter operante.

Mas esse não é o caso predominante. Em geral, ou o pequeno negócio já está na informalidade — isto é, não tem a totalidade dos empregados com carteira assinada —, ou ele conseguiria reorganizar a força de trabalho em torno de outros regimes de jornada. Assim, para os negócios que operam na informalidade (com escala 6×1, 7×0, sem direitos trabalhistas etc.), pouco mudaria com o fim da jornada legal 6×1 — esses continuariam superexplorando a força de trabalho à revelia da lei.

Modificar a jornada de trabalho não é solução econômica para os problemas dos pequenos negócios, mas 1 avanço em torno de condições mais humanas de trabalho e de possibilidade de sociedade mais organizada, além de poder abrir novas oportunidades. Para enfrentar o problema econômico, o fundamental é construirmos projeto político de desenvolvimento socioeconômico que ofereça melhores condições para aqueles que desejam empreender. Caberia, portanto, elaborar e aprofundar as políticas de democratização do acesso ao crédito, suporte e capacitação para a gestão de negócios, ampliação de programas de compras públicas no âmbito das prefeituras e, sobretudo, projeto mais amplo de desenvolvimento econômico que coloque a estrutura produtiva do País em melhores condições de geração de postos de trabalho de qualidade, o que por sua vez reverberaria positivamente sobre os pequenos negócios. Os pequenos negócios dependem do nível de renda da sociedade, ou seja, de dinâmica econômica com crescimento, visto que salário é renda e esta se converte em consumo.

Médias e grandes empresas: o capital preocupado

Em momentos de questionamentos da exploração, os especialistas e representantes das grandes empresas buscam justificar a manutenção do status quo sob argumento de perda de competitividade e posição oportunista de defesa dos pequenos negócios.

Esse fato chama a atenção, pois é sempre em torno da defesa dos “vulneráveis” (pequenos negócios, trabalhadores e consumidores pobres, etc.) que se mobilizam os principais discursos do grande capital. No momento da competição econômica de mercado, os grandes negócios não se importam em quebrar os menores, mas quando os direitos trabalhistas são postos na mesa, o que ocorre é manipulação oportunística em defesa dos mais vulneráveis.

Os grandes negócios operam com escala elevada, possuem estrutura de custos enxuta, têm poder de negociação com fornecedores, gozam de amplo acesso ao crédito (a despeito da elevadíssima taxa de juros no País), departamentos de contabilidade, marketing, tributos etc., que superam sobremaneira qualquer capacidade de competição dos pequenos negócios.

Nos bairros, os pequenos mercadinhos, mercearias, frutarias, farmácias etc. não conseguem competir no preço com as grandes redes. Os que sobrevivem o fazem à duras penas, amparados por combinação de elementos que vão desde a clientela fiel ou o serviço diferenciado, até a sonegação de impostos e o não cumprimento das leis trabalhistas. Portanto, o fim da escala 6×1 não é o problema e a dinâmica da concorrência permaneceria a mesma. Melhorar a condição dos pequenos negócios está em outra esfera que não a da redução de direitos trabalhistas, como enfatizamos anteriormente.

Quem está verdadeiramente preocupado com a mudança são as grandes empresas, que operam na legalidade e teriam de se adequar, imediatamente, aos novos parâmetros de definição da jornada de trabalho. Para essas, todo avanço na legislação trabalhista que possa implicar em redução da lucratividade e de poder sobre a gestão da força de trabalho é problema.

Apenas 3 grandes grupos de redes de farmácias detêm 40% do mercado no Brasil3: Grupo RD (Raia e Drogasil), Grupo Pague Menos (Pague Menos e Extrafarma) e Grupo DPSP (Pacheco e São Paulo). Em 2023, o faturamento do setor cresceu 13,5%, atingindo R$ 91,3 bilhões4, liderados pelas grandes redes. Resta pouca dúvida sobre a capacidade financeira dos grandes grupos em absorverem eventuais elevações dos custos com o trabalho decorrentes do fim da exploração ao nível percebido na jornada com escala 6×1. Não obstante, embora o lucro das grandes redes de farmácia possa absorver tais custos, a disputa com o capital nunca é fácil — somente com muita pressão e mobilização social este avanço poderá ser atingido.

O caso das grandes redes de supermercado não é muito diferente. De acordo com a Abras (Associação Brasileira de Supermercados), os 15 maiores supermercados faturaram mais de R$ 348 bilhões em 20235. A liderança do ranking é do Carrefour, que faturou R$ 115,4 bilhões (33% do total), seguido pelo Assaí Atacadista (R$72,7 bilhões) e Mateus Supermercados (R$30,2 bilhões). Juntos, as 3 redes foram responsáveis por 62,6% do faturamento das grandes redes, o que revela certa concentração de mercado no segmento econômico. Novamente, pergunta-se: o fim da escala 6×1 é inviável para esses grupos?

E o trabalhador?
Como visto, não há razões para crer que, por si só, o fim da jornada 6×1 reduziria os empregos, ao contrário, abre-se espaço para eventuais novas contratações que compensam o tempo de trabalho liberado em determinados negócios em que a conta da lucratividade faça sentido econômico e que tem funcionamento nos fins de semana.

Ora, no âmbito individual, caso a escala 6×1 seja abolida, pode haver parcela dos trabalhadores, cuja renda variável sofreria eventual redução — o caso dos trabalhos que incluem comissões por vendas ou recebimento de gorjetas. É verdade que parte dos trabalhadores nessa situação buscaria compensar a redução do rendimento em outros postos de trabalho, sobretudo realizando bicos ou freelancers. Nesse caso, seu rendimento poderia ser preservado ou até mesmo elevado, a depender do trabalho eventual que o trabalhador encontrar.

No entanto, para outra parte dos trabalhadores migrar para jornada convencional 5×2 ou até 4×3 pode ser alívio no sentido de devolver algum controle sobre seu próprio tempo de vida. As pessoas estão exaustas e não querem escolher entre trabalhar muito e não viver, ou trabalhar pouco e não receber o suficiente para gozar vida digna. Elas querem exercer atividades que façam sentido para si e para a comunidade, com alguma autonomia sobre seu tempo, com remunerações compatíveis que lhes permitam vida que valha à pena viver. Certamente, a existência da jornada 6×1 não contribui em nada nessa direção.

Em relação à dinâmica prática do consumo, a redução na jornada de trabalho não significa que bares, farmácias e supermercados terão necessariamente seu horário de funcionamento diminuído. E, caso isso ocorra pontualmente em determinados segmentos e localidades, observamos que diversos países operam com horários muito mais restritos de funcionamento de mercados e farmácias aos fins de semana, por exemplo, quando comparados com o Brasil.

As pessoas deixam de consumir por isso? Não, simplesmente assumem essa condição como dado — inclusive muito saudável para a estruturação dos tempos de trabalho e de não trabalho da sociedade — e se organizam da mesma forma que o fazem para levar os filhos de segunda à sexta na escola, frequentar cultos e igrejas aos sábados e domingos, entre outras tantas definições do tempo da vida social que organizam a vida dos indivíduos e da coletividade.

Insistimos que não se trata somente da questão econômica. Exagerando no argumento, o que seria mais lucrativo para os negócios do que reduzir a jornada 6×1? Aumentar para 7×0! Então por que isso não ocorre, já que seria mais lucrativo? Porque há limites físicos (capacidade de o ser humano aguentar) e éticos (o quanto a sociedade tolera certos parâmetros de exploração). Acontece que a escala 6×1 está adoecendo os trabalhadores de forma mais acelerada que a jornada convencional 5×2, inclusive contribuindo para o aumento. O limite físico já está sendo rompido, porém os trabalhadores adoecidos pelo excesso de trabalho são, via de regra, rapidamente descartados e substituídos por outros, e assim a roda continua a girar.

O que tem sustentado até então a existência da escala 6×1 é o silenciamento da pauta e do sofrimento associado, amparado pela força do empresariado do comércio e de algumas atividades de serviço, que impuseram esse modelo de jornada em seu próprio proveito. Agora estamos assistindo à onda de contestação social da 6×1 — sua razoabilidade está sendo questionada pela sociedade. O resultado pode ser 1 grande marco para a renovação da agenda da classe trabalhadora em torno de pautas poderosas como a da redução da jornada de trabalho.

Necessidade de agenda a favor dos trabalhadores

As mobilizações pelo fim da jornada 6×1 podem significar o início de processo que aprofunde a realidade complexa e penosa do mundo do trabalho em que nos encontramos.

Não só aprofundar como apresentar mudanças significativas na realidade de milhões de trabalhadores e trabalhadoras, apresentando agenda do trabalho que redefina as condições laborais, que abarque todos os trabalhadores sob o leque dos direitos trabalhistas e que ressignifique o que é trabalhar. Por isso, a luta pela redução da jornada 6×1 é só 1 dos desafios que estão colocados, fazendo-se necessário também considerar ao menos 10 pontos essenciais para a construção de agenda a favor dos trabalhadores e das trabalhadoras:

• primeiro, que o trabalho possui centralidade na vida das pessoas, ainda que esse tenha passado por reconfigurações e ressignificações profundas;

• segundo, que as perspectivas neoliberais para resolver o problema do emprego e do trabalho fracassaram. A diminuição e retirada dos direitos do trabalho, a exemplo da Reforma Trabalhista de 2017, e o incentivo ao empreendedorismo comprovadamente acentuaram a precariedade do trabalho;

• terceiro, que o crescimento econômico é necessário para geração de empregos. Contudo esse, por si só, não resolve o problema do trabalho;

• quarto, que os postos de trabalho sejam repensados, considerando sua articulação e existência, a partir de demandas reais e concretas para atender as necessidades sociais e ambientais contemporâneas;

• quinto, que o Estado também seja fomentador e garantidor da geração de empregos, dado o problema estrutural tanto da falta de trabalho quanto da falta de trabalhos dignos;

• sexto, que a luta pelos direitos trabalhistas precisa vir articulada à luta de demais formas de discriminação, exclusão e opressão, considerando gênero e raça;

• sétimo, que a proteção social e a proteção trabalhista abranjam todos os trabalhadores, independentemente da relação de trabalho estabelecida;

• oitavo, que as instituições públicas responsáveis pela regulação do trabalho sejam fortalecidas e não solapadas, como vem ocorrendo;

• nono, que a diminuição da jornada de trabalho venha acompanhada de condições mais dignas para os trabalhadores, garantindo tempo para o desenvolvimento de outras dimensões da vida fora do trabalho, fazendo com que o trabalho tenha real sentido e significado, assim como garantia salarial; e

• décimo, que os ganhos de produtividade acumulados ao longo do tempo, fruto de inovações produzidas pelo conjunto dos atores sociais, seja melhor distribuído entre trabalhadores e capitalistas.

Por fim, que se possa viver além do trabalho. Como disse Antonio Candido, “a luta pela justiça social começa por 1 reivindicação do tempo: eu quero aproveitar meu tempo de forma que eu me humanize”. A necessidade de agenda humanizadora a favor dos trabalhadores e das trabalhadoras há muito já está colocada.

FONTE: DIAP

(*) Pesquisadores do Cesit (Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho) da Unicamp (Universidade de Campinas)
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1 Como mostra Dal Rosso et al. no livro O futuro é a redução da jornada de trabalho (2022, p. 26): “[…] algumas experiências começam a chamar atenção, tais como na Finlândia (que está experimentando jornada de 4 dias por semana e há proposta da atual primeira-ministra de instituir no país jornada de 6 horas diárias); experimentos, ainda que localizados, de redução da jornada de trabalho estão em curso na Bélgica, na Escócia, na Islândia, na Espanha, no Japão, nos Emirados Árabes, entre outros. Na Coréia do Sul, ainda que a jornada permaneça longa, houve redução de 6,3 horas por mês a partir de 2019. Na mesma perspectiva, a agenda da redução da jornada de trabalho ganhou visibilidade com a posição do IG Metal da Alemanha a favor da Jornada de Trabalho de 32 horas; o movimento “4dayworkweek” que iniciou na Nova Zelândia e rapidamente teve adesão de empresas nos EUA, Grã-Bretanha, Irlanda e logo depois em muitos outros países, inclusive no Brasil; na Grã- Bretanha, em 2019, o líder do Partido Trabalhista se posicionou favorável a semana de 4 dias sem perdas de salários e, como último destaque, em outubro de 2020, o CES (Comitê Executivo da Confederação Europeia de Sindicatos) sugeriu agenda coordenada de negociações para a redução da semana de trabalho sem redução dos salários e medidas para o controle do tempo de trabalho, qualidade de vida no trabalho e garantia de renda em caso de doença”..

2 Os MEI (microempreendedores individuais) são os que possuem a maior alta taxa de mortalidade empresarial, com 29% encerrando suas atividades em até 5 anos.

https://medicinasa.com.br/redes-farmacias/

https://gironews.com/farma-cosmeticos/principais-redes-de-farmacias-faturaram-r-913-bilhoes-em-2023-rd-segue-no-topo-do-ranking/

https://exame.com/negocios/quais-sao-os-15-maiores-supermercados-no-brasil-e-quanto-eles-faturam-veja-a-lista/

IMAGEM: VALDO VIRGO/CB

No trimestre encerrado em setembro, a desocupação atinge o segundo menor patamar da série histórica do IBGE

O desemprego caiu para 6,4% no trimestre de julho a setembro de 2024, atingindo a segunda menor taxa de desocupação da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, iniciada em 2012. A menor taxa de desocupação foi registrada no trimestre encerrado em dezembro de 2013, de 6,3%, conforme dados divulgados, ontem, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O índice recuou 0,5 ponto percentual frente ao dado registrado no trimestre de abril a junho, 6,9%; e ficou 1,3 ponto abaixo da taxa de 7,7% registrada no mesmo trimestre de 2023.

De acordo com os dados do IBGE, a taxa de ocupação no país bateu novo recorde, totalizando 103 milhões. Esse dado é resultado do avanço de 1,2% na população ocupada no trimestre, aumento de 1,2 milhão de trabalhadores. Na comparação anual, a alta foi de 3,2%, ou mais 3,2 milhões de pessoas ocupadas.

Diante da queda de desemprego, o número de pessoas desocupadas que buscavam uma ocupação passou para 7 milhões, o menor desde o trimestre encerrado em janeiro de 2015. O resultado apresentou recuos significativos nas duas comparações: de -7,2% no trimestre, ou menos 541 mil pessoas buscando trabalho, e de -15,8% frente ao mesmo trimestre móvel de 2023, ou menos 1,3 milhão de pessoas.

Na avaliação de Adriana Beringuy, coordenadora de Pesquisas Domiciliares do IBGE, a trajetória de queda da desocupação resulta da contínua expansão dos contingentes de trabalhadores que estão sendo demandados por diversas atividades econômicas.

Maior contingente

A indústria e o comércio foram as atividades que puxaram o aumento da ocupação no trimestre, com altas, respectivamente, de 3,2% e de 1,5% em seus contingentes. Juntos, absorveram 709 mil trabalhadores, na comparação trimestral (416 mil da indústria e 291 mil do comércio). Além disso, a população ocupada no comércio foi recorde, chegando a 19,6 milhões de pessoas. Os outros grupamentos mantiveram estabilidade na comparação trimestral. "Em particular, a indústria registrou aumento do emprego com carteira assinada. Já no comércio, embora a carteira assinada também tenha sido incrementada, o crescimento predominante foi por meio do emprego sem carteira", explicou a técnica do IBGE.

Analistas lembram que o recuo no desemprego representa um avanço histórico no mercado de trabalho, mas acende o alerta para que o Banco Central mantenha a política monetária mais restritiva. Em setembro, o Comitê de Política Monetária (Copom) deu início ao novo ciclo de alta da taxa básica da economia (Selic), atualmente em 10,75% ao ano.

"Essa melhoria no mercado de trabalho acontece em um ambiente macroeconômico delicado, onde a inflação e o custo do crédito podem exigir uma resposta mais intensa do Banco Central em ajustes na Selic, especialmente se o aumento da massa de trabalhadores pressionar o consumo e dificultar o controle inflacionário", afirmou Jefferson Laatus, chefe-estrategista do grupo Laatus.

Os especialistas lembraram também que o mercado de trabalho mais aquecido ajuda a pressionar a inflação, pois, aumenta o consumo das famílias devido ao maior poder de compra da população, deixando a demanda aquecida. "Embora isso seja positivo para a renda das famílias, o aumento no consumo, aliado à inflação, pode exigir que o Banco Central tenha uma política de juros ainda mais restritiva. Essa medida, se necessária, poderá desacelerar investimentos e afetar o crescimento, sinalizando um período de desafios para equilibrar a expansão do emprego com a estabilidade econômica", alertou Alex Andrade, CEO da Swiss Capital Invest.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

 

IMAGEM: Eduardo Valente/GOVSC

Portos públicos crescem 5,42% no terceiro trimestre do ano e batem recorde para o período

A movimentação atingiu 128,73 milhões de toneladas de cargas
 

Os portos públicos apresentaram um aumento de 5,42% na movimentação do terceiro trimestre deste ano, atingindo 128,73 milhões de toneladas de cargas, segundo os dados do Estatístico Aquaviário da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ). O número foi recorde para o período.

O porto público que mais movimentou no país, entre julho e setembro, foi o Porto de Santos (SP) com 37,44 milhões de toneladas (+0,97%), seguido pelo Porto de Itaguaí (RJ) com 17,31 milhões de toneladas (+8,17%), e o Porto de Paranaguá (PR) com 16,44 milhões de toneladas (+5,58%).

No trimestre, as cargas que tiveram o maior destaque foram Gás De Petróleo (+56,12%), Trigo (+31,43%) e Adubos Fertilizantes (+23,68%).

O acumulado da movimentação portuária total, entre julho e setembro, foi de 351,82 milhões de toneladas de cargas, um decréscimo sutil de 0,28% em comparação com o mesmo período do ano passado. 

Cargas 

Em relação às cargas conteinerizadas, a movimentação do trimestre atingiu 38,40 milhões de toneladas, um aumento de 12,27% em comparação com o mesmo período do ano passado, representando 3,52 milhões de TEUs. Desse total, 2,35 milhões de TEUs foram movimentados em longo curso e 1,12 milhão por cabotagem.

Cargas gerais apresentaram crescimento de 7,21% frente ao terceiro trimestre de 2023. Foram 15,56 milhões de toneladas registradas no período. Por sua vez, granel sólido e granel líquido tiveram queda de 0,51% e 6,07%, respectivamente. 

Navegação

Apoio portuário cresceu, entre julho e setembro, 1,3% comparado ao mesmo trimestre de 2023. Foram movimentados 0,47 milhão de toneladas de cargas. A movimentação de cargas de longo curso foi de 257,40 milhões de toneladas no terceiro trimestre de 2024, apresentando crescimento de 1,17% em comparação com o mesmo período do ano passado.

A cabotagem decresceu 1% em comparação com o mesmo período do ano passado, atingindo uma movimentação de 73,83 milhões de toneladas. As operações de carga em navegação interior apresentaram recuo de 13,56%, totalizando 19,8 milhões de toneladas movimentadas.

Terminais Privados

Nos terminais autorizados houve uma queda de 3,3% na movimentação em relação ao terceiro trimestre do ano passado. O setor movimentou 223,09 milhões de toneladas de cargas.

O maior volume de movimentação no setor privado aconteceu no Terminal Marítimo de Ponta da Madeira (MA) com 50,56 milhões. O crescimento percentual na comparação com o ano de 2023, no acumulado dos meses entre julho e setembro, foi 3,06%.

Painel Estatístico

O Painel Estatístico da ANTAQ pode ser acessado via smartphones e tablets, disponível no site da Agência. Na consulta eletrônica podem ser checados dados de transporte de longo curso, cabotagem, vias interiores, além da movimentação portuária de contêineres.

FONTE: ANTAQ

IMAGEM: JOÉDSON ALVES/AGÊNCIA BRASIL

Enquanto brasileiros que ganham mais de R$ 4.664 mensais pagam 27,5% de IR, 0,2% da população com renda superior a R$ 83 mil mensais pagam 13,3%

Estar no topo do topo da pirâmide social no Brasil traz benesses financeiras que vão muito além dos altos valores naturalmente disponíveis a esse estrato social. Essa ínfima fatia da população é privilegiada, também, por um sistema que não tributa sua renda de acordo com o seu tamanho, o que o torna altamente regressivo e injusto. 

Apesar de as alíquotas cobradas pelo Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) serem progressivas, elas são aplicáveis apenas sobre uma parte dos rendimentos, como é o caso dos salários, de maneira que a partir de um determinado nível de ganhos, ela deixa de ser progressiva e se torna nula ou até regressiva justamente para aqueles que poderiam pagar mais. 

Esta é uma das constatações feitas por um estudo publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) nesta terça-feira (29). As evidências trazidas pela nota técnica confirmam que “a tributação da renda deixa de ser progressiva no ponto mais alto do topo da pirâmide e, na média, não passa de 14%, o que é um patamar muito baixo em perspectiva internacional”. 

Cabe destacar que a tabela do imposto de renda, sem considerar os isentos, vai de 7,5% a 27,5%, a depender da renda, sendo esta última aplicada a brasileiros que ganham mais de R$ 4.664,68 mensais, ou seja, pessoas que estão muito longe de serem consideradas ricas. 

“Existem outras rendas que estão submetidas a outras alíquotas e, no caso extremo, temos muitos rendimentos que são isentos, como ocorre com os lucros e dividendos distribuídos pelas empresas para os seus acionistas. Esse lucro é tributado na empresa, mas é livre de qualquer imposto na distribuição para as pessoas físicas”, explica Sérgio Wulff Gobetti, pesquisador do Ipea responsável pela nota técnica. 

Para chegar a essa conclusão, o estudo considerou três cenários diferentes. Em todos, leva em conta a hipótese de a totalidade do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (IRPJ/CSLL), incidente no caso das empresas do Simples Nacional, ser de fato transferida aos acionistas. Mas, para os demais dividendos, foram assumidos três distintos graus de repasse: 0%, 50% e 100%. 

Observando os cálculos resultantes desses cenários, verificou-se que, mesmo no caso hipotético em que todo imposto pago pelas empresas seja transferido aos acionistas, a taxa média de tributação chega a um máximo de 14,2% na fatia de renda em torno de R$ 516 mil anuais (R$ 43 mil mensais). A partir daí, começa a cair, atingindo uma média de 13,3% entre as pessoas com renda superior a R$ 1 milhão (R$ 83 mil mensais), grupo que representa os 0,2% mais ricos da sociedade brasileira.

O fato de os 14% pagos por quem está no topo ser um percentual médio, conforme assinala o estudo, “não atenua, mas agrava o problema, porque isso significa que, se alguns contribuintes no topo estão suportando uma carga maior do que essa, há outros que usufruem de níveis de tributação ainda mais baixos. Esse é o caso de um grupo de 38,4 mil pessoas que, segundo dados do IRPF, são os mais ricos entre os declarantes que se identificam como sócios de empresas do Simples Nacional, com renda individual média de R$ 1,6 milhão em 2022”. 

Segundo Gobetti, situações como essas ocorrem porque “a carga tributária efetiva sobre o lucro das empresas é mais baixo do que a gente imagina quando a gente olha só para as alíquotas nominais. Estudos recentes da Receita Federal mostram que a alíquota efetiva sobre o lucro do Simples está em torno de 4%, no lucro presumido chega a 11% e para as empresas do lucro real, varia de 22% a 30%”. 

A nota técnica ressalta que “os milionários do Simples Nacional pagam, em média, apenas 7,4% de imposto sobre tudo que ganham, incluindo aí os valores imputados de IRPJ/CSLL sobre os R$ 48 bilhões de dividendos recebidos em 2022 (sendo R$ 2 bilhões de dividendos de outras empresas). Ou seja, a carga tributária suportada pelos super-ricos do Simples Nacional é inferior àquela paga por um trabalhador assalariado que ganhe R$ 4,5 mil mensais e inferior também àquela paga por outros empresários com mesmo nível de renda”. 

De acordo com estimativa do pesquisador, entre 2015 e 2019, cerca de R$ 300 bilhões em valores corrigidos deixaram de ser arrecadados por empresas enquadradas nos regimes do Simples Nacional e do Lucro Presumido. 

Privilégios históricos

Em suas considerações finais, o estudo argumenta que essa distorção em favor dos ricos resulta de uma série de privilégios que foram sendo perpetuados no sistema tributário ao longo da história, entre as quais estão não apenas a isenção sobre lucros e dividendos distribuídos a pessoas físicas — que salienta ser um caso raro no mundo — como também os benefícios inerentes aos regimes especiais de tributação e as brechas existentes no regime de Lucro Real.

Enfrentar esse privilégio demanda o enfrentamento de obstáculos que vão além daqueles de ordem política, ou seja, o eterno “lobby” em defesa dos endinheirados que não se limita aos parlamentos. “É preciso mesclar mudanças de caráter estrutural, como a retomada da tributação de dividendos a partir de modelos internacionais, com ajustes pontuais na legislação que sejam capazes de reduzir (mesmo sem eliminar por completo) as distorções que estão presentes hoje nos diferentes regimes de tributação do lucro”, sugere o estudo. 

Leia também: Fazenda quer imposto mínimo para milionários

Do ponto de vista do debate público, o documento assinala a necessidade de mostrar à sociedade, governos e parlamentos que “a falta de equidade com que a renda em geral (e o lucro das empresas, em particular) é tributada tem consequências negativas não só sobre a justiça fiscal, mas também sobre a eficiência econômica”. 

Afinal, acrescenta, “um sistema tributário que premia os empresários que adotem mais estratagemas de planejamento tributário ou simplesmente restrinjam a escala de seus negócios aos limites dos regimes especiais, como no caso brasileiro, gera vantagens comparativas que nada têm a ver com a atividade econômica em si”. 

FONTE: PORTAL VERMELHO

IMAGEM: ALEXANDRE MACIEIRA/RIOTUR

Estudo da OCDE aponta o Rio de Janeiro como um polo emergente da Economia Azul na América Latina

Um estudo recente da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) posiciona o Rio de Janeiro como um dos principais candidatos a polo de Economia Azul na América Latina. A prévia do estudo, divulgada no Green Rio 2024, evento de sustentabilidade realizado na Marina da Glória, destaca a capacidade do estado de impulsionar uma economia sustentável baseada no uso responsável dos recursos aquáticos e marítimos.

A subsecretária de Recursos Hídricos e Sustentabilidade do Rio, Ana Asti, já havia antecipado o tema durante o Fórum Massy Comexlog, realizado no início de outubro no Píer Mauá. Ela explicou que a Economia Azul busca o equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a preservação ambiental, promovendo o bem-estar social e a criação de empregos. Durante o evento, a OCDE confirmou o Rio de Janeiro como um dos polos emergentes dessa economia para o Brasil e a América Latina.

Programa Guanabara Azul: estratégia para a economia costeira

Entre os avanços mencionados pelo relatório estão as ações de despoluição da Baía de Guanabara e o Programa Guanabara Azul, voltado para o fortalecimento das atividades econômicas costeiras. A iniciativa busca mobilizar parcerias entre municípios para captar investimentos e desenvolver projetos voltados à inovação tecnológica e ao fortalecimento das atividades econômicas na região metropolitana do Rio.

Segundo a OCDE, a economia do mar já representa 9,74% do PIB do Rio de Janeiro, gerando cerca de R$ 242,1 bilhões anuais. Em 2021, o setor empregava 301.122 trabalhadores com carteira assinada e representava 15,15% das atividades produtivas ligadas ao mar.

Perspectivas e impacto global

O estudo da OCDE projeta um crescimento substancial para a economia marítima mundial, que pode atingir U$ 3 trilhões até 2030, impulsionado pelo comércio, indústrias e serviços aderentes às práticas sustentáveis. No Rio de Janeiro, onde cerca de 80% da população vive em áreas litorâneas, os impactos socioambientais dessas iniciativas são promissores.

A Economia Azul também estará em destaque durante o G20, que será realizado no Rio de Janeiro em novembro, com discussões voltadas para a preservação e restauração dos oceanos.

Próximos passos e políticas públicas

O governo do Rio de Janeiro planeja implementar a Política Pública de Economia Azul, que englobará ações de mapeamento de indicadores sociais e econômicos, gestão integrada das águas e criação de um fundo para a preservação de ecossistemas aquáticos. A iniciativa ainda incluirá programas de educação para promover a cultura oceânica, visando o desenvolvimento sustentável e inclusivo.

O estudo completo da OCDE será publicado às vésperas da cúpula do G20, trazendo novas diretrizes para o fortalecimento da Economia Azul no Rio de Janeiro e no Brasil.

FONTE: DIÁRIODORIO

IMAGEM: IBAMA

Ibama indefere pedido para exploração de Petróleo na Foz da Bacia do Amazonas e solicita mais informações da Petrobras

Exploração de petróleo na costa brasileira figura entre os principais planos da Petrobras. No entanto, o Ibama entende que não estão claras as medidas para evitar desastres ambientais.

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) indeferiu pedido da Petrobras para exploração de petróleo na região da Foz da Bacia do Amazonas (na Margem Equatorial) e requereu mais informações à empresa sobre os planos para o local.

A exploração de petróleo na costa brasileira figura entre os principais planos da Petrobras. No planejamento estratégico, a companhia prevê investimento de US$ 3,1 bilhões para a perfuração de 16 poços na Margem Equatorial – área que se estende pela costa do Amapá, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte - no período de 2024 a 2028.

Um dos focos é na região da Foz do Amazonas, onde a estatal possui projeto para perfuração de poço a cerca de 170 km da costa do Amapá e a 2.880 metros de profundidade.

Para avançar, o empreendimento precisa da concessão de licença para Avaliação Pré-Operacional (APO), que ainda está em análise pelo Ibama, considerando os indicadores de biodiversidade, magnitude dos impactos, persistência dos impactos e comprometimento da área prioritária.

Em maio do ano passado, o Ibama negou um pedido feito pela Petrobras para perfurar a bacia da foz do rio Amazonas com objetivo de explorar petróleo na região. A decisão opôs os ministros Marina Silva (Meio Ambiente) e Alexandre Silveira (Minas e Energia), que é aliado do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

A Petrobras recorreu da decisão do Ibama. Na época, o órgão ambiental apontou uma série de ajustes que a estatal teria que adotar para conseguir a licença.

Uma das principais críticas do Ibama ao plano apresentado pela empresa era o tempo de reação após eventual acidente –embarcações chegariam ao local cerca de 48 horas depois, apenas, aumentando assim o risco de que óleo atinja a costa brasileira.

“Naquele momento, a proposta que havia sido apresentada pelo Petrobras foi uma proposta que os servidores do Ibama entenderam que, por uma série de motivos, pela grande biodiversidade, pela sensibilidade ambiental daquela área, pelas fortes correntes marinhas que existem naquele local e pela falta de estrutura, aquela licença não deveria ser liberada naquele momento sob aquelas condições”, explicou Agostinho.

Segundo ele, a situação é desafiadora, mas o órgão vai fazer a “análise técnica com muita tranquilidade”.

FONTE: G1

IMAGEM: DEFESANET

Syndarma, que completa 90 anos, destacou defesa permanente do arcabouço legal para que novo ciclo de contratações repita resultados positivos dos Prorefam’s, com expansão da frota de bandeira brasileira

O Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima (Syndarma) avalia que, apesar do impacto positivo do marco regulatório na frota brasileira de embarcações de apoio marítimo, o setor continua atento na defesa do arcabouço legal e do ambiente de negócios edificado há quase 30 anos. O entendimento é que, no atual ciclo de crescimento do segmento, o setor já experimenta grandes desafios, como na regulamentação da Reforma Tributária (PLP 68/2024), que exigiu a mobilização para preservação da competitividade da bandeira brasileira, mantendo benefícios do Registro Especial Brasileiro (REB) instituído pela Lei 9432/1997.

“Na dura batalha junto ao Congresso, o setor produtivo se mobilizou — como há muito não se via — e armadores e construtores, além dos trabalhadores, vêm trabalhando unidos em prol da bandeira brasileira e do desenvolvimento do país”, comentou Luís Gustavo Bueno Machado, que também é presidente da Associação Brasileira das Empresas de Apoio Marítimo (Abeam), durante evento de comemoração dos 90 anos do Syndarma, na última quarta-feira (30), no Rio de Janeiro (RJ).

Machado destacou que o desenvolvimento da navegação de apoio marítimo no Brasil se deu a partir da edição da Lei 9432/1997, marco regulatório da navegação, consagrando a política pública de desenvolvimento da frota nacional e confirmando a prioridade de emprego da bandeira brasileira, delineada pela Constituição Federal de 1988. Ele considera que a legislação, junto à demanda induzida pela Petrobras, contribuiu para montar a equação de fomento para construção de embarcações no Brasil e a constituição de frota própria, protegendo da investida de terceiros com interesses ‘particulares, imediatistas e sem qualquer compromisso com a navegação brasileira’.

O presidente do Syndarma/Abeam acredita que a Petrobras entendeu novamente a necessidade estratégica da frota nacional e celebrou o anúncio de licitações da companhia para novas construções no Brasil, com uma demanda de 30 embarcações de apoio marítimo. O primeiro processo tem regras semelhantes aos programas de renovação da frota de apoio marítimo (Prorefam) e prevê a construção e afretamento de 12 PSVs (transporte de suprimentos) de grande porte.

As regras atuais estão atreladas a contratos operacionais de até 12 anos, 40% de conteúdo local, além de possibilitar o emprego de novas tecnologias engajando a frota nas medidas de descarbonização. “Para as próximas rodadas de licitações, estão previstos mais 10 OSRV (combate a derramamento de óleo) e 8 RSV (embarcações equipadas com robôs). As empresas [brasileiras de apoio marítimo] se preparam para apresentar suas propostas”, afirmou Machado.

Para o Syndarma/Abeam, o marco regulatório da navegação brasileira e a legislação associada instituíram regras claras e favoráveis para o ambiente de negócios, atraindo investimentos para o país. Em menos de 25 anos, foram construídas em estaleiros brasileiros cerca de 250 embarcações de variados tipos, desde unidades para movimentação de pessoas e cargas, até embarcações mais sofisticadas como AHTS (manuseio de âncoras), gerando milhares de empregos na indústria da construção naval e no setor de navegação.

A indústria de petróleo e gás representa hoje 15% do PIB industrial brasileiro e 97% da exploração e produção acontecem nos campos marítimos. “O robusto arcabouço regulatório, o necessário suporte governamental, o empenho da Petrobras e, nesse momento, boa disposição das demais operadoras e empresas de serviços contratantes das embarcações de apoio marítimo, fazem dessa modalidade de navegação o último elo direto da cadeia produtiva de energia no mar”, ressaltou Machado.

“São embarcações brasileiras relativamente jovens, tecnologicamente sofisticadas, estado da arte, e capazes de atender às demandas com competências em águas rasas, profundas e ultraprofundas”, destacou Machado. O Syndarma/Abeam estima que, em toda cadeia produtiva dos estaleiros, foram aportados quase US$ 11 bilhões, aproximadamente 50% dos recursos do Fundo da Marinha Mercante (FMM) desembolsados nos últimos anos para desenvolver a frota de apoio marítimo de bandeira brasileira. “Nossa frota ostenta a 6ª posição de maior frota de apoio marítimo do mundo. Desconsideradas as bandeiras de conveniência, só ficamos atrás em número de embarcações dos EUA e da China”, salientou.

FONTE: Portos e Navios – Danilo Oliveira

IMAGEM: MARINE INSIGHT

O presidente Joe Biden anunciou um financiamento de 3 bilhões de dólares destinado a transformar a infraestrutura portuária da América.

O financiamento será fornecido pela Agência de Proteção Ambiental com subsídios para Portos Limpos disponibilizados pela Lei de Redução da Inflação. A significativa injecção de financiamento destina-se a modernizar e electrificar os portos em todo o país, criando cerca de 40.000 empregos bem remunerados e, ao mesmo tempo, abordando as preocupações ambientais.

“Os portos do país são o eixo central das cadeias de abastecimento do nosso país e empregam mais de 100.000 trabalhadores sindicalizados em todos os Estados Unidos”, afirmou a Casa Branca num comunicado. “Este financiamento protegerá e criará empregos bem remunerados e sindicalizados e melhores condições de trabalho, modernizando as operações e infraestruturas portuárias para equipamentos mais limpos, garantindo ao mesmo tempo um ar mais limpo para os trabalhadores portuários e comunidades próximas.”

O programa Portos Limpos, financiado pela Agência de Proteção Ambiental, distribuirá subsídios a 55 beneficiários em 27 estados e territórios.

Um beneficiário notável é a Administração Portuária de Maryland, recebendo US$ 147 milhões para implementação e planejamento. O financiamento permitirá a compra de equipamentos com emissões zero, a instalação de infraestruturas de carregamento e melhorias de energia, apoiando mais de 2.000 empregos no processo.

Espera-se que a iniciativa tenha um impacto ambiental significativo, eliminando mais de 3 milhões de toneladas métricas de poluição por carbono na sua primeira década – o equivalente ao consumo anual de energia de quase 400.000 residências. O programa facilitará a aquisição de mais de 1.500 unidades de equipamentos de movimentação de carga, 1.000 caminhões, 10 locomotivas e 20 navios, todos movidos por fontes de energia limpa.

Para o Porto de Baltimore, este investimento é particularmente crucial. Sendo um dos portos mais movimentados da Costa Leste e um centro nacional de importação e exportação de automóveis, apoia diariamente mais de 20.000 trabalhadores e contribui significativamente para a economia de Maryland. O impacto económico do porto é estimado em 192 milhões de dólares por dia, ou mais de 70 mil milhões de dólares anuais, representando 13% do produto interno bruto de Maryland

O anúncio faz parte da agenda mais ampla de Investimento na América da administração Biden, que já entregou mais de 13 mil milhões de dólares para mais de 970 projetos só em Maryland. Isto inclui investimentos substanciais em projetos de infraestruturas críticas, como a substituição do túnel Frederick Douglass, no valor de 4,7 mil milhões de dólares, e 213 milhões de dólares para a modernização de veículos ligeiros sobre trilhos.

Após o colapso da ponte Francis Scott Key em Baltimore, que matou seis trabalhadores e interrompeu o tráfego portuário, o Presidente Biden prometeu o total apoio da sua administração para reabrir o porto de Baltimore. “Hoje, os trabalhadores portuários estão de volta ao trabalho, movimentando mais uma vez mais de 100 mil toneladas de carga por dia”, disse a Casa Branca.

O programa Portos Limpos não só se alinha com a Iniciativa Justiça40 do Presidente, mas também apoia o objectivo da administração de um sector de transporte de mercadorias com emissões zero. À medida que os portos transitam para tecnologias mais limpas, as comunidades vizinhas podem esperar uma melhor qualidade do ar e uma redução dos riscos para a saúde associados à poluição relacionada com os portos.

FONTE: GCAPTAIN

IMAGEM: LEONARDO SIMPLÍCIO/DIVULGAÇÃO

Prefeitura vai investir R$ 137,5 milhões nas obras para revitalizar o parque naval

Niterói - A Prefeitura segue avançando com os trabalhos de dragagem do Canal de São Lourenço. A obra, considerada a maior deste porte no Brasil, tem previsão de ser concluída em 15 meses. Ao todo, a expectativa é que sejam dragados 1.600.000 m³ de sedimentos da Baía de Guanabara. Destes, mais de 183.808,40 m3 já foram dragados. A Prefeitura investe R$ 137,5 milhões nas obras, com o objetivo de revitalizar o parque naval, o acesso ao Porto e a indústria pesqueira. A meta é alavancar a economia desses setores e gerar cerca de 20 mil empregos.

Nesta fase, três equipamentos realizam a dragagem de material no espaço próximo às ilhas de Santa Cruz, Conceição e Mocanguê.

A dragagem do Canal de São Lourenço era esperada há mais de 30 anos e permitirá o desassoreamento do trecho da Baía de Guanabara entre a Ilha da Conceição e a Ponte Rio-Niterói. A profundidade (calado) aumentará de 7 para 11 metros, o que possibilitará a ampliação da função operacional dos estaleiros, o estímulo a novas construções de embarcações e a movimentação dos setores de reparos e offshore. Os equipamentos executam a dragagem de acordo com o calado de cada espaço, que é variável.

"A dragagem é uma intervenção que vai alavancar a indústria naval e de pesca, gerando emprego e renda para Niterói e fazendo a economia girar em todos esses setores. É um trabalho importante para revitalizar um setor que sempre foi referência na cidade", explicou o prefeito de Niterói, Axel Grael.

"Não foi um trabalho fácil. Nos últimos anos, fizemos vários estudos de viabilidade técnica, orçamentos para adequar as obras, além de muitas adaptações ao projeto executivo, obtenção de licenças dos órgãos competentes e muitas conversas com os setores envolvidos. Ouvimos a necessidade de cada um deles para fazermos um planejamento de curto, médio e longo prazo", explica o secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, Luiz Paulino Moreira Leite, pasta que liderou todos os processos e iniciativas para que a dragagem saísse do papel.

Luiz Paulino reforça que a dragagem vai tornar a cidade novamente um berço da indústria naval e as atividades portuárias também serão incrementadas gerando mais receita para o município.

“Já estamos recebendo informações dos setores que existe um aquecimento de segmentos, que estão se preparando para ampliar as atividades. Já temos gigantes do setor com contratos adicionais com empresas de tecnologia energética para a entrega de sistemas de tubulações flexíveis e serviços associados em vários campos do pré-sal. Estamos nessa rota com esquema de off shore e agora”, explica Luiz Paulino.

Para garantir a execução das obras, a Prefeitura de Niterói investiu, inicialmente, R$ 772 mil na elaboração do Estudo de Impacto Ambiental (EIA/Rima). O estudo foi entregue ao Instituto Estadual do Ambiente (Inea) e, após análise para liberação das licenças, os resultados foram apresentados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Hidroviárias (INPH) aos órgãos do Governo Federal. Após os trâmites burocráticos com órgãos de fiscalização, como a Marinha e a Capitania dos Portos, a dragagem propriamente dita começou em julho deste ano.

Um dos equipamentos utilizados durante este período, a draga Kenford tem capacidade de cerca de 3 mil m3, medindo 81,8m de comprimento e 14m de largura, com tubulação de sucção de 800 milímetros, podendo atingir uma velocidade de 11,1 nós, o que corresponde a 20,55 km/h.

Outro equipamento utilizado no processo, o Clamshell atua acoplado a uma balsa, removendo solos submersos com profundidade de até 50 metros e volume de 9 metros cúbicos por içamento. O funcionamento se dá por meio do manuseio de um operador, que lança as caçambas ao solo, no fundo do Canal, realizando a escavação e a retenção do material, até o içamento. O sistema é apoiado por batelões TS12, onde o material é depositado numa cisterna com capacidade para 1.400 metros cúbicos.

Todo o material coletado pelas dragas Kenford e Clamshell é transportado pelo mar até uma área determinada pelo INEA (bota fora oceânico), onde ocorre o despejo.

As intervenções estão sendo executadas pelo Consórcio Fluminense, vencedor da licitação, formado pelas empresas DTA Engenharia Ltda. e SK Infraestrutura Ltda. O consórcio já realizou trabalhos em locais como Ilha Comprida (SP) e Balneário Camboriú (SC).

Memória

Em 2000, o Brasil passou por uma retomada do setor naval com políticas de controle nacional. Nos últimos seis anos, o setor sofreu com a perda de mais de 15 mil postos de trabalho. A expectativa do município é elaborar, junto com o Governo Federal, uma agenda de estímulo ao setor, já que a política da indústria naval está ligada a medidas macroeconômicas.

Na década de 1970, a construção naval chegou a empregar mais de 40 mil trabalhadores no estado do Rio. Em 2014, a Frente Marítima, baseada em offshore e no setor pesqueiro, também chegou a empregar cerca de 40 mil pessoas. Só em Niterói, eram mais de 20 mil trabalhadores.

A cidade tem 35 berços de atracação (públicos e privados) homologados pelo Governo Federal, somando mais de 3.300 metros lineares de cais acostáveis, com profundidades entre 4 e 9 metros em áreas que já tiveram intervenções.

Dos 4 milhões de barris de petróleo produzidos no Brasil, o Rio de Janeiro é responsável por 3 milhões e 500 mil. Isso corresponde a cerca de 85% da produção de petróleo brasileira e 75% de gás natural.

Estudo
O estudo para a realização da dragagem do Canal São Lourenço levou em consideração a geologia, com análise do solo, níveis de ruídos subaquáticos, caracterização da qualidade da água e sua qualidade química e microbiológica.

O levantamento da Prefeitura incluiu o uso e a ocupação do solo urbano, além dos usos residenciais, comerciais, de serviço, lazer, industrial e público. O aspecto econômico, que inclui economia social e renda média da população no entorno, também foi levado em consideração, assim como nível de empregabilidade, proporção da população economicamente ativa, número de habitantes por idade, etnia e sexo.

Após a conclusão da dragagem do Canal de São Lourenço, o Município pretende estimular a revitalização do Terminal Pesqueiro de Niterói. A ideia é transformar o terminal em um Entreposto de Pesca, aproveitando o espaço e infraestrutura já existentes. O terminal chegou a ser inaugurado há 10 anos pelo Governo Federal, mas nunca funcionou. A Prefeitura já assinou um acordo com o Ministério da Pesca e assumiu a gestão do espaço.
 
FONTE: O DIA

IMAGEM: CTB

A comissão de juristas criada pela Câmara dos Deputados para propor atualizações na Lei dos Portos (Lei 12.815/2013) analisará nesta quarta-feira (23/10), a partir das 9h, o relatório final com as propostas de mudanças no arcabouço legal que regula o setor.

Nesta terça (22/10), um dia antes da votação, trabalhadores portuários de todo o Brasil entraram em greve por 12 horas. 

A ação foi coordenada pela Federação Nacional dos Portuários (FNP), pela Federação Nacional dos Estivadores (FNE) e pela Federação Nacional dos Conferentes e Consertadores de Carga e Descarga, Vigias Portuários, Trabalhadores de Bloco, Arrumadores e Amarradores de Navios (Fenccovib).

Os sindicatos questionam alterações que permitem a terceirização de algumas atividades, como a de guarda portuário, e afirmam que as mudanças devem extinguir o adicional noturno e o pagamento por adicional de risco.

A proposta de revisão que será votada nesta quarta foi feita pela Comissão Especial sobre a Revisão Legal da Exploração de Portos e Instalações Portuárias (Ceportos), presidida pelo ministro do Tribunal Superior do Trabalho Douglas Alencar. O relator-geral é o desembargador Celso Ricardo Peel Furtado de Oliveira, do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (Grande São Paulo e litoral paulista). 

Em audiência pública feita em maio, Alencar afirmou que, por ter mais de dez anos, a Lei de Portos precisa de revisão.

“É preciso repensar se as opções de 2013 ainda permanecem adequadas para os grandes desafios que se colocam para a economia nacional, em temas como a verticalização e a forma de atuação das autoridades portuárias”, afirmou ele na ocasião.

Especialistas consultados pela revista eletrônica Consultor Jurídico no começo do ano afirmaram que a atualização da legislação portuária pode identificar e destravar gargalos do setor e aumentar a sua eficiência.

Greve

A greve dos portuários teve início às 7h desta terça, com duração de 12 horas. Os sindicatos buscaram pressionar a Ceportos, grupo criado a pedido do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). O objetivo da comissão é atrair investimentos, modernizar o setor, desburocratizar a Lei dos Portos e simplificar o processo e descentralização da administração.

Três sindicatos de São Paulo aderiram a uma cláusula proposta pela Justiça do Trabalho da 2ª Região prevendo a manutenção de 50% dos serviços ao longo desta terça-feira. O dissídio foi estabelecido depois de o Sindicato dos Operadores Portuários do Estado de São Paulo (Sopesp) pedir a declaração da abusividade da greve e 100% do contingente de portuários. 

No Paraná, a Justiça determinou que os trabalhadores atendessem a no mínimo 60% das ofertas de trabalho requisitadas no Órgão de Gestão de Mão de Obra (OGMO) de Paranaguá em cada uma das empresas representadas pelos sindicatos do estado.A comissão

A Ceportos foi criada com o objetivo de apresentar uma proposta de revisão do arcabouço legal que regula a exploração direta e indireta pela União de portos e instalações portuárias no país. Após a conclusão dos trabalhos, o grupo encaminhará à presidência da Câmara o relatório final dos estudos desenvolvidos e uma proposta legislativa.

Em janeiro, o presidente da Federação Nacional das Operações Portuárias (Fenop), Sérgio Aquino, elogiou a composição da comissão e avaliou que ela pode reforçar a iniciativa do Ministério dos Portos e Aeroportos de identificar problemas e buscar melhorias no sistema.

“A atividade portuária no Brasil é extremamente importante para a economia. O Brasil fechou ano passado com saldo positivo na balança comercial de US$ 100 bilhões, sendo que 95% dessas cargas transitam pelo sistema portuário brasileiro. Mas há problemas e questões que precisam ser equacionados na legislação brasileira”, disse ele.

FONTE: CONJUR

 

 

IMAGEM: OUTRAS PALAVRAS

Presidente da CTB destacou a importância do acordo entre Ministério do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho para unir forças no combate à precarização

Em um passo importante para fortalecer a proteção dos direitos trabalhistas no país, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) assinou um acordo de cooperação técnica com o Ministério Público do Trabalho (MPT) na última quarta-feira, 30 de outubro. Com foco em aprimorar a promoção do trabalho digno e prevenir conflitos institucionais, o acordo prevê o intercâmbio de dados entre as duas entidades e a realização de pesquisas conjuntas sobre condições de trabalho no Brasil.

O ministro Luiz Marinho, do MTE, reforçou a importância da parceria, destacando a necessidade de um esforço conjunto para enfrentar desafios no cenário atual das relações de trabalho. Segundo Marinho, a atuação dos servidores do MTE e do MPT deve ser pautada por “cautela, paciência e inteligência” para promover condições justas e seguras para todos os trabalhadores brasileiros. “A união de forças entre MTE e MPT fortalece nossa capacidade de proteger o direito ao trabalho digno e de enfrentar as adversidades com mais eficiência”, afirmou o ministro.

O procurador-geral do Trabalho, José de Lima Ramos Pereira, também destacou o valor da colaboração. Embora o MTE e o MPT mantenham independência em suas funções, o procurador-geral ressaltou que a parceria potencializa o alcance de ambos os órgãos na proteção dos trabalhadores. “A união fortalece ambas as instituições na superação dos desafios que enfrentamos na defesa dos direitos trabalhistas. Ainda que nossas atuações sejam independentes, podemos trabalhar em uma visão compartilhada, voltada ao diálogo social e à proteção do trabalho digno”, explicou Ramos Pereira.

Adilson Araújo, presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), reforçou em entrevista ao Portal Vermelho a necessidade de união e ações efetivas para combater os impactos negativos das contrarreformas trabalhista e previdenciária. Segundo Araújo, essas mudanças, junto com a terceirização irrestrita, desfiguraram a legislação trabalhista brasileira e enfraqueceram os direitos dos trabalhadores. Ele destacou que as reformas, propostas pelo governo anterior sob o pretexto de gerar emprego, trazer segurança jurídica e modernizar as relações de trabalho, acabaram se tornando uma “grande lorota”. “A soma das mudanças resultou no maior fake news da nossa história”, afirmou.

Para Araújo, a parceria entre o MTE e o MPT representa uma importante sinalização de que é possível unir forças para defender o trabalho digno e combater a precarização. Ele acredita que o acordo de cooperação técnica firmado entre as instituições é um passo importante em uma agenda de equidade, segurança e saúde no ambiente de trabalho.

Acordo focado em capacitação e políticas conjuntas

Uma das iniciativas previstas pelo acordo é a capacitação especializada dos servidores dos dois órgãos, abordando temas como saúde e segurança no trabalho, combate ao trabalho infantil, e inteligência e contrainteligência no contexto das relações laborais. Com base em planejamento conjunto, o MTE e o MPT pretendem desenvolver políticas e programas para garantir que as ações estejam alinhadas e sejam mais eficazes.

A capacitação específica tem como objetivo capacitar servidores para lidarem com as diversas situações que envolvem os direitos dos trabalhadores, ao mesmo tempo em que fortalece a comunicação entre o MTE e o MPT para prevenir possíveis conflitos e garantir um processo de inspeção e fiscalização mais eficiente. Para Luiz Marinho, a formação dos servidores é essencial para garantir uma atuação qualificada e alinhada aos princípios do trabalho digno.

Em sua análise, Araújo observou que as reformas fazem parte de uma “restauração neoliberal” promovida após o impeachment de 2016, que ele define como um golpe institucional. Para o líder da CTB, essa agenda representa uma “era de regressão do trabalho”, que colocou em xeque conquistas históricas e aumentou a vulnerabilidade dos trabalhadores. “Interromper esse ciclo e retomar uma agenda nacional desenvolvimentista é o caminho para um Brasil próspero, igualitário e soberano”, declarou.

Segundo Araújo, é fundamental que o movimento sindical brasileiro, mantendo sua autonomia e independência, apoie e contribua para o êxito do governo Lula em pautas que respondam aos interesses da classe trabalhadora. Ele defende que o movimento sindical deve radicalizar na luta por transformações que fortaleçam a valorização do trabalho e a dignidade dos trabalhadores.

Trabalho digno: um compromisso social

O conceito de trabalho digno, estabelecido pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), abrange uma série de aspectos fundamentais para o bem-estar dos trabalhadores, como remuneração justa, ambiente de trabalho seguro, proteção social, e respeito à liberdade e dignidade dos trabalhadores. A ideia é que o trabalho não apenas evite violações de direitos, mas seja um meio de promover o desenvolvimento humano e social, essencial para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva.

Para o MTE e o MPT, o trabalho digno vai além de evitar abusos e fraudes trabalhistas: trata-se de garantir que o trabalho contribua para o desenvolvimento humano e social, respeitando a dignidade e promovendo o bem-estar dos trabalhadores. O acordo assinado nesta semana simboliza o compromisso de ambos os órgãos com essa missão e destaca a importância do diálogo e da cooperação como elementos fundamentais para uma atuação eficaz.

Retomada da luta pela redução da jornada e combate à precarização

Para Araújo, é essencial que o Brasil retome a luta pela redução da jornada de trabalho sem diminuição de salários, o que pode contribuir para a geração de empregos e a valorização dos trabalhadores. Ele também destacou a importância de combater a precarização e a informalidade, que vêm crescendo nos últimos anos.

“A centralidade da luta contemporânea passa pela valorização do trabalho e do trabalhador, e essa luta está em harmonia com a redução da jornada de trabalho, geração de empregos, combate à precarização e informalidade”, reforçou. A aliança entre MTE e MPT, segundo Araújo, é um exemplo de como as instituições podem unir esforços para proteger os direitos trabalhistas e avançar em pautas fundamentais para o desenvolvimento social e econômico.

O caminho para um trabalho digno e igualdade de direitos

A busca por um trabalho digno inclui, para a CTB, a garantia de equidade e equiparação salarial entre homens e mulheres e o fortalecimento dos investimentos em saúde e segurança no trabalho. Araújo defende que essa agenda, se colocada em prática, poderá reverter o cenário atual e contribuir para um país mais justo. “Valorizar o trabalhador é garantir um trabalho digno, seguro e que respeite os direitos fundamentais. Só assim construiremos um Brasil verdadeiramente soberano e igualitário.”

Araújo encerrou sua análise afirmando que a recente parceria entre MTE e MPT traz perspectivas promissoras, e que o movimento sindical deve se manter atuante, pressionando por mudanças e por uma agenda que favoreça a classe trabalhadora em sua totalidade.

O evento de assinatura do acordo contou com a presença de diversas autoridades ligadas ao MTE e ao MPT, entre elas Marcelo Crisanto Souto Maior, vice-presidente da Associação Nacional dos Procuradores e das Procuradoras do Trabalho; Rafael Dias Marques, secretário de Relações Institucionais do Ministério Público do Trabalho; Francisco Macena, secretário executivo do MTE; Rogério Silva Araújo, secretário de Inspeção do Trabalho substituto; Ricardo Augusto Panquestor Nogueira, consultor jurídico do MTE; e José Cloves Dias Moraes, presidente da Fundacentro.

FONTE: PORTAL VERMELHO

IMAGEM: Eduardo Knapp/Folhapress

Demanda inicial e dificuldades na logística impedem escoamento do insumo do Nordeste para o Sudeste

Os grandes projetos de hidrogênio verde que começam a nascer próximo ao litoral nordestino ainda estão em fase de planejamento e construção, mas quando ficarem prontos vão mirar o mercado internacional, sobretudo o europeu. Devido a dificuldades tecnológicas para transportar o insumo, é improvável que haja escoamento da produção para a indústria nacional, hoje localizada em grande parte no Sudeste.

Essa situação cria desafios para a tentativa do governo brasileiro de fazer com que o país exporte produtos de maior valor agregado, em vez de apenas insumos energéticos. O hidrogênio verde é considerado uma commodity por alguns especialistas e, à medida que os projetos no mundo ganham escala, seu preço tende a cair –cenário ainda restrito à próxima década.

De acordo com um levantamento feito pela Folha com base em entrevistas próprias e dados da ABIHV (Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde), o país tem hoje doze projetos avançados, sendo apenas um –bem pequeno– em operação. Desse total, apenas dois estão fora do Nordeste e só três estão sendo construídos especificamente para atender à demanda interna. 

Todos os outros sonham com o mercado europeu. Por dois motivos: 1) as políticas de controle de emissões da União Europeia são mais exigentes e alguns setores, como as refinarias, já correm para adquirir hidrogênio verde até o final da década. 2) A Europa tem pouca área suficiente para aumentar sua geração de energia renovável, base da produção do hidrogênio verde. É de lá, portanto, que virá a maior demanda inicial.

"A gente não vai escapar de exportar commodity. Para destravar projetos a gente precisa ter contratos de offtake de longo prazo, e os primeiros que estão surgindo são fora daqui, porque a Alemanha precisa muito de hidrogênio verde e criou agências para fomentar a produção em vários países do mundo, inclusive no Brasil", diz Luciana Costa, diretora de Transição Energética do BNDES.

Offtake é o termo técnico usado para contratos em que o comprador antecipa o pagamento do insumo, assumindo riscos, para propiciar a construção do projeto. A falta dessa figura no mercado atual, aliás, tem atrapalhado alguns negócios, inclusive na Europa.

Nesse cenário, é improvável que a primeira leva de grandes projetos de hidrogênio verde no Brasil seja para abastecer a indústria pesada nacional, como de aço, cimento, cerâmica, vidro e setor químico, as que mais precisarão do insumo.

Além disso, escoar o hidrogênio produzido no litoral nordestino para fábricas instaladas em outras regiões, inclusive do Nordeste, é hoje impraticável. Isso porque transportar o hidrogênio em forma gasosa só compensaria economicamente, segundo quem acompanha o mercado, se fosse em grandes volumes –nesse caso, porém, seria necessária uma rede de dutos mais extensa que a atual e o investimento não seria viável.

De acordo com a BloombergNEF, transportar hidrogênio via caminhão por uma distância superior a 100 quilômetros torna o insumo muito mais caro do que se transportado por gasoduto. E isso só seria viável se a produção fosse pequena. Já por cabotagem (navegação que faz rotas apenas dentro do mesmo país) seria caro demais.

Transportar o hidrogênio em sua forma líquida exigiria temperaturas abaixo de -252ºC –a temperatura mais baixa já alcançada no mundo foi de -273ºC.

FONTE: FOLHA DE S.PAULO