CRÉDITO: REPRODUÇÃO/CORREIO BRAZILIENSE
Sem reformas ou venda de estatais, geração de emprego se concentra em leilões do Ministério da Infraestrutura
O plano de retomada do emprego comandado pelo ministro Paulo Guedes (Economia), antes centrado na atração de investimentos por privatizações e reformas, só conseguirá decolar graças ao programa de concessões, liderado pelo ministro Tarcísio de Freitas (Infraestrutura).
Os leilões devem gerar 3,6 milhões de empregos até 2022 caso o governo cumpra com o cronograma previsto para rodovias, ferrovias, aeroportos e terminais portuários.
Boa parte desses novos postos de trabalho —1,2 milhão de vagas— virá das concessões deste ano, particularmente ferrovias e terminais portuários. Os empregos —diretos e indiretos— serão garantidos por contratos de investimentos obrigatórios atrelados à concessão.
Na avaliação de Tarcísio, até o final de 2022, serão R$ 260 bilhões em investimentos caso todos os projetos sejam concedidos. Neste ano, serão 50 empreendimentos, totalizando R$ 84 bilhões em investimentos.
A maior parte sairá de grandes projetos na área de ferrovias e portos —R$ 32 bilhões e R$ 41,6 bilhões, respectivamente. Ambos devem puxar a geração de empregos —1,1 milhão de novos postos.
Com esse resultado, Tarcísio assume o discurso da geração de empregos durante a pandemia no lugar de Guedes. O ministro da Economia patina no plano de privatizações, venda de estatais, e nas reformas.
Para Guedes, a combinação desses fatores colocaria o país de volta aos trilhos do crescimento e a geração de emprego seria uma consequência. Por isso, ele nunca definiu oficialmente uma meta de geração de empregos para sua gestão.
Durante o governo de transição, no entanto, Carlos da Costa, atual secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, afirmou que a ideia era criar 10 milhões de empregos durante o primeiro mandato de Bolsonaro. Segundo o secretário, somente durante os dois primeiros anos seriam 6 milhões de postos.
Naquele momento, Guedes estava mais preocupado na flexibilização das leis trabalhistas para retirar custos da contratação formal. Em outra frente, o ministro pretendia criar um programa que pudesse formalizar os trabalhadores informais.
Desta ideia surgiu o programa Carteira Verde e Amarela. Lançado no início do ano passado para estimular a criação de vagas por meio da redução de encargos pagos pelos patrões que admitissem trabalhadores jovens, só gerou 13 mil contratações de janeiro a abril —período em que ficou vigente. Isso representou 0,25% dos contratos de trabalho formais assinados no país nos quatro meses.
A equipe econômica esperava criar 1,8 milhão de vagas formais até 2022 com a proposta da Carteira Verde e Amarela porque, na estimativa do governo, o novo contrato de trabalho reduzia de 30% a 34% no custo da mão de obra.
Os avanços planejados por Guedes para a geração de emprego cederam à escalada do desemprego agravada pela pandemia. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a taxa de desocupação atingiu 14,2% no trimestre encerrado em janeiro. Ao todo, 14,3 milhões de brasileiros estavam em busca de uma vaga no período.
Esse é o maior número de desempregados desde o início da série histórica da pesquisa. São cerca de 200 mil pessoas a mais do que no trimestre encerrado em outubro, e 2,4 milhões de pessoas a mais do que no mesmo trimestre de 2020, antes do início da pandemia.
O desemprego preocupa o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que passou a atacar a metodologia de pesquisa do IBGE na aferição do dado no país como forma de frear a queda de sua popularidade em razão, primordialmente, da condução das políticas de combate ao coronavírus.
Para Bolsonaro, o aumento está relacionado aos trabalhadores informais que passaram a procurar emprego formal e agora são considerados desempregados, de acordo com a metodologia do IBGE.
A única proteção que a equipe de Guedes conseguiu garantir foi a proibição de demissão aos empregadores que reduziram jornada e, consequentemente, salários durante a vigência do programa que autorizou a flexibilização dos contratos de trabalho.
Enquanto o chefe da Economia discute uma nova rodada da redução de jornada como forma de evitar mais demissões, Tarcísio bate martelos na B3, a Bolsa de São Paulo, fechando contratos de concessão de infraestrutura com a iniciativa privada.
Guedes costuma dizer que não existe essa separação entre ministérios, que as concessões também fazem parte da estratégia de atração de investimentos para o plano de recuperação econômica conduzido por sua pasta.
Porém, coube a Tarcísio a liderança —do discurso e dos projetos do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos), como é conhecido o plano de concessões federais.
Somente com a Infra Week, série de três leilões de concessões em infraestrutura ocorridos no início de abril, foram concedidos à iniciativa privada três blocos com 22 aeroportos, o trecho inicial da Fiol (Ferrovia de Integração Oeste-Leste) e cinco terminais portuários.
Tarcísio atribuiu o sucesso do programa a Bolsonaro e ao trabalho dos técnicos das agências reguladoras —todas vinculadas à Infraestrutura.
O discurso também foi um ataque à equipe econômica, que chamou de "loucura", segundo assessores de Tarcísio, o projeto de concessão em meio a uma crise econômica tão grave.
O ministro da Infraestrutura rebateu, defendendo que o momento era de ousadia. Para técnicos da Economia, ele repetia que países como Índia, Turquia, dentre outros em desenvolvimento, estavam paralisando projetos de concessão. Investidores, porém, nunca estiveram com tanto dinheiro em caixa.
Para o ministro, era a hora perfeita de aproveitar não somente essas vantagens, mas também a desvalorização do real ante o dólar para atrair esse grupo para o Brasil.
Além disso, diferentemente da venda de empresas (privatizações), muito mais suscetíveis às intempéries da economia, concessões têm contratos de longa duração (30 anos), atravessando diversos governos, o que, para Tarcísio, praticamente elimina o caráter político da decisão de investimento.
Os contratos ferroviários que recentemente foram renovados pelo Ministério da Infraestrutura vinham desde a gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e foram cumpridos nos demais governos —PT e MDB.
Pela renovação de suas concessões, a Vale terá de construir a Fico (Ferrovia de Integração Centro-Oeste). Futuramente, o empreendimento será leiloado.
Essa lógica, conhecida como subsídio cruzado, também valerá para os demais trechos da Fiol. As obras consumiriam ao menos R$ 7,4 bilhões dos cofres públicos somente na construção das vias.
A estratégia funcionou por enquanto. Com a Infra Week, um empacotamento de projetos que já estavam previstos no cronograma do PPI, Tarcísio assegurou R$ 10 bilhões em investimentos ao longo dos contratos (que variam entre 30 e 35 anos).
Esse pacote vai gerar 208 mil postos de trabalho. A maioria será criada nos primeiros cinco anos. Isso representa metade dos postos formais —com registros em carteira— gerados no ano passado.
Segundo dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), no total, o mercado formal medido abriu 412 mil vagas de forma líquida —contratações menos demissões— nos 12 meses terminados em fevereiro deste ano.
R$ 84 bilhões
É o investimento esperado com contratos de concessão de 50 projetos neste ano
R$ 260 bilhões
É o investimento projetado pelo governo para as concessões até o final do mandato de Jair Bolsonaro, em 2022
3,6 milhões
É a quantidade de empregos diretos e indiretos que devem ser gerados caso todos os projetos sejam concedidos à iniciativa privada até 2022
Fonte: Ministério da Infraestrutura
FONTE: FOLHA DE S.PAULO