Atraso na ratificação do acordo de livre comércio assinado há dois anos com o bloco deixa o caminho livre para que o gigante asiático continue se fortalecendo em uma região vital no setor alimentar
A Europa tem cada vez menos peso no Mercosul: o bloco integrado por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai agora olha em direção à China. Enquanto a ratificação do acordo de livre comércio assinado em 2019 ainda precisa do visto de alguns membros da União Europeia (França, Áustria, Países Baixos, Bélgica e Irlanda), o Cone Sul americano multiplica seu comércio de matérias-primas com o gigante asiático. E, ainda mais importante, se abre ao imenso caudal investidor do gigante asiático. Com os números na mão, o tratado comercial acertado após duas décadas de intermináveis negociações pode ter chegado tarde demais, deixando à mercê da China um mercado de 265 milhões de habitantes.
As vozes de advertência, quando não de alarme, pela perda de músculo das empresas europeias no Mercosul vêm de diversas frentes, e todas elas pedem para que se pise no acelerador na ratificação do acordo. Um estudo recente elaborado pelo prestigioso instituto Ifo alemão alerta para a “perda de importância da Europa como parceiro comercial dos países do Mercosul”, em detrimento do mastodonte asiático. Quando o bloco sul-americano completa 30 anos, “as importações e exportações do Mercosul para e da Europa estão diminuindo em geral”, diz o texto, assinado pela própria diretora do Ifo, Lisandra Flach.
No caso das vendas sul-americanas à UE, a queda foi de 25% desde 2015. Em comparação, a participação da China nas exportações totais do Mercosul se multiplicou por 11 entre 2000 e 2018: de 2% a 22,1%. A segunda potência mundial —que já se aproxima da primeira, os EUA, em muitos indicadores de envergadura— é agora o mercado de vendas mais importante para o bloco. Com desvantagem, em grande medida, para a União Europeia, que em um dia não tão distante foi o mais importante parceiro comercial do Cone Sul americano.
“Sem acordo comercial não há uma plataforma para se relacionar com o Mercosul. Se fosse fechado a tempo, 15 anos atrás, a história teria sido outra’, diz Ignacio Bartesaghi, diretor do Instituto de Negócios Internacionais da Universidade Católica do Uruguai e um dos maiores especialistas em comércio da América Latina.
Rachaduras nos membros comunitários
O pacto com o Mercosul, o maior já feito pela Europa, significaria a redução gradual de 90% das barreiras alfandegárias em um prazo de 10 anos. As resistências, entretanto, impedem sua ratificação tanto no Parlamento Europeu como em um número razoável de Estados membros. O texto ainda se encontra em processo de tradução para as 24 línguas da União e se choca contra uma frente integrada pela França, que oculta por trás de questionamentos ambientais seu protecionismo agrícola, e outros como a Áustria e os Países Baixos, que não estão de acordo com a política de proteção da Amazônia feita por Jair Bolsonaro. No lado dos defensores do acordo estão a Espanha – seu presidente do Governo (primeiro-ministro), Pedro Sánchez, acaba de prometer que o texto poderá entrar em vigor “antes tarde do que nunca” – Portugal e os países nórdicos.
Com a Europa negociando as regras do jogo em sua relação com o Mercosul e precisando apagar os incêndios internos, nos últimos 20 anos a China teve campo aberto no Cone Sul americano. E aproveitou a oportunidade de se tornar forte em um mercado com o qual, ao contrário do Velho Continente, não tem nenhum vínculo cultural e histórico. “O Mercosul se transformou na principal plataforma de produção de proteínas no mundo, na frente dos Estados Unidos e muito mais do que a União Europeia”. Por isso a região tem um vínculo privilegiado, de caráter estrutural, com a China, que é o eixo da demanda global de agroalimentos”, diz Jorge Castro, analista argentino e presidente do Instituto de Planejamento Estratégico. “Tudo isso acontece em um momento em que a China experimenta um boom de consumo de mais de sete trilhões de dólares (37 trilhões de reais) em 2021, que deixa os EUA pela primeira vez na história do capitalismo em segundo lugar”.
A China coloca a demanda e o Mercosul a oferta
O Mercosul coloca a oferta de alimentos e outras matérias-primas, e a China uma demanda voraz. Em sentido contrário, o país asiático está disposto a verter seus excedentes financeiros em uma região sedenta de investimentos em infraestrutura e financiamento: entre 2008 e 2018, o Brasil foi o quinto maior destinatário do capital chinês, após os EUA (a maior economia do mundo), a Austrália (dentro de sua área geográfica de influência),o Reino Unido e a Suíça (que, por sua vez, serve de trampolim para terceiros países). Pouco mais de um de cada 20 dólares investidos por empresas chinesas no estrangeiro acabaram no gigante sul-americano, segundo os dados do American Enterprise Institute e a Fundação Heritage.
“A Europa perdeu peso, em primeiro lugar, porque não conseguiu aprovar o acordo preferencial: isso não só freia o comércio, como também os investimentos”, alerta Bartesaghi por telefone. “E, do outro lado, os investimentos da China nos 10 últimos anos foram enormes, sobretudo ao Brasil e à Argentina”. Carlos Malamud, pesquisador principal para a América Latina do Real Instituto Elcano, concorda: “O estoque — volume acumulado— de investimento europeu continua sendo muito maior, mas o chinês foi se expandindo muito mais rápido nos últimos anos”. A relação China-Mercosul se expandiu muito além dos setores mais comuns: a dependência tecnológica dos quatro integrantes do bloco começa a ser substancial e “já existe até uma base de satélites chinesa na Patagônia argentina”, diz Malamud.
O avanço da China na região tensionou o debate ideológico nos países do Mercosul sobre a conveniência de mudar o tradicional eixo Atlântico (EUA-Europa) pelo de Pequim. Mas as necessidades, pelo menos até agora, podem mais do que a política. “Quando a Argentina está em crise, sabe que conta com o financiamento da China; quando precisa de investimentos, lá está a China. E isso permitiu ao gigante asiático entrar em setores estratégicos nesses países, nos quais antes não estava”, diz Bartesaghi. O último exemplo desta entrada com força da China no Cone Sul veio do lado das vacinas contra a covid-19, auxiliando os países do Cone Sul com milhões de doses enquanto os governos do bloco lutam com os fornecedores ocidentais para que cumpram com seus acordos de entrega.
As relações Pequim-Mercosul já estão tão entrelaçadas que, nessa altura, quase ninguém pensa que a ratificação do tratado entre a UE e o Mercosul consiga frear seu avanço e reequilibrar, sequer minimamente, as forças. “Pode ser um estímulo às trocas e criará uma base mais favorável aos investimentos”, diz Malamud, “mas é preciso abandonar a ideia de que a Europa irá substituir a China na região: independentemente do tratado o que se vê é uma clara aposta dos países do Mercosul em comercializar com eles”. Castro também acha que a tendência é pouco menos do que imparável. Os tempos mudaram, o Mercosul e a China se beneficiam mutuamente e a Europa — com ou sem acordo — passou à retaguarda.
A Petrobras assinou um “grande contrato” com a companhia de serviços do setor de petróleo Subsea 7 para o desenvolvimento de equipamentos e instalações para a terceira plataforma do campo de Mero, no pré-sal da Bacia de Santos, informou a fornecedora em nota nesta segunda-feira.
O valor exato do contrato não foi revelado, mas a Subsea 7 pontuou considerar que “define um contrato muito grande entre 500 milhões e 750 milhões de dólares”.
O escopo do contrato inclui engenharia, fabricação, instalação e pré-comissionamento de 80 quilômetros de “risers” rígidos e “flowlines”, 60 quilômetros de linhas de serviços flexíveis, 50 quilômetros de umbilicais e infraestrutura associada, bem como a instalação do sistema de ancoragem da plataforma do tipo FPSO, informou a empresa.
“O gerenciamento e a engenharia do projeto começarão imediatamente nos escritórios da Subsea 7 no Rio de Janeiro e em Paris”, disse a companhia.
“A fabricação dos dutos ocorrerá na base da Subsea 7 em Ubu (ES) e as operações offshore estão programadas para serem executadas em 2023 e 2024, usando a frota de embarcações de dutos rígidos da Subsea 7.”
A plataforma Mero 3 está prevista para entrar em operação em 2024.
Presente no Brasil há 35 anos, a Subsea 7 já instalou mais de 1.000 km de linhas rígidas e mais de 4 mil km de linhas flexíveis no país, e atualmente tem uma frota composta por 4 PLSVs e mais de 40 ROVs.
O campo de Mero terceiro maior produtor do país está contido no bloco de Libra, no pré-sal da Bacia de Santos, primeiro a ser ofertado em um leilão de partilha de produção, em 2013.
A operadora da área é a Petrobras, com 40% de participação, tendo como sócias a anglo-holandesa Shell (20%), a francesa Total (20%) e as chinesas CNODC (10%) e CNOOC (10%).
Uma consultora de vendas foi demitida após votação pelos colegas de trabalho, em um procedimento tipo "paredão de eliminação do BBB".
A Justiça do Trabalho do Ceará condenou uma empresa de turismo a pagar indenização por danos morais à consultora de vendas que foi demitida após votação pelos colegas de trabalho, em um procedimento tipo "paredão de eliminação do BBB".
A decisão do juiz Ney Fraga Filho foi publicada no início do mês de maio pela 16ª vara do Trabalho de Fortaleza/CE e determina o pagamento das verbas rescisórias, além dos danos morais. O valor total da condenação foi em torno de R$ 14 mil.
Em abril de 2020, a consultora de vendas ajuizou ação trabalhista contra as empresas em que laborou. A empregada informou que foi contratada em julho de 2019 e trabalhou em diversos estabelecimentos de Fortaleza. Ela afirmou que foi demitida pouco mais de um mês após sua admissão, mas não recebeu as verbas trabalhistas a que teria direito.
Paredão BBB
A trabalhadora narrou que recebia tratamento constrangedor por parte de seu superior hierárquico. O gestor restringia as idas ao banheiro, além da alimentação dos empregados. Sua demissão foi concretizada através de um procedimento inspirado no "paredão de eliminação do BBB", em referência ao popular programa de televisão Big Brother Brasil.
Na ocasião da "eliminação", os funcionários foram coagidos a votar em um colega de trabalho e dizer o porquê este deveria ser dispensado. A consultora foi escolhida por meio desse "paredão". Ela alega que ainda sofre com depressão e traumas psicológicos em decorrência dessa exposição.
Depoimento
Constou no registro de audiência de instrução que uma das testemunhas foi também desligada na mesma situação.
"Depois de atender entre 5 e 6 clientes, o gestor reuniu todos e os levou para uma antessala, alegando que eles não haviam efetuado nenhuma venda e que eles só estavam preocupados em comer; informou que naquele exato momento ia fazer um "Big Brother" e mandou escolher um vendedor e um fechador para votar para sair da equipe; que naquele momento o depoente ficou constrangido e se recusou a votar."
Contestações
A empresa, em sua contestação, negou o vínculo de emprego com a ex-funcionária, tampouco qualquer prestação de serviços a seu favor. Requereu pela improcedência total dos pedidos e condenação da reclamante na multa por litigância de má-fé.
Por sua vez, a outra empregadora alegou que não houve relação jurídica com a vendedora, sustentando que sua real empregadora era a outra empresa, negando a existência de grupo econômico.
Sentença
A decisão de primeiro grau julgou parte dos pedidos procedentes e condenou solidariamente as empresas, de forma que todos os devedores são responsáveis pela totalidade da obrigação.
Diante das provas documentais e testemunhais, o magistrado Ney Fraga reconheceu a ocorrência do assédio moral.
"A hipótese de assédio pela chefia, ensejando dano moral indenizável, sem sombra de dúvidas restou provado nos autos. A prova foi sobeja em confirmar a dispensa da reclamante através de um paredão realizado pelo superior hierárquico, expondo a autora a uma situação extremamente vexatória e humilhante na presença dos demais empregados."
A sentença determinou a anotação da carteira de trabalho, o pagamento de aviso-prévio, 13º salário, férias, horas extras, repouso semanal remunerado, multa, FGTS e indenização por danos morais.
Países não reconhecem covid como doença profissional e deixam trabalhadores desprotegidos
Segundo entidades sindicais internacionais, “os programas seguridade social e os sistemas de saúde pública quase nunca são suficientes para mitigar os impactos da pandemia”
Levantamento elaborado por entidades sindicais internacionais mostra que muitos trabalhadores atingidos na pandemia ficam à margem de qualquer proteção porque seus respectivos governos não reconhecem a covid-19 como doença profissional. Até abril, estimam, 3 milhões de pessoas morreram em consequência da covid. “E 2020 foi o ano mais perigoso para muitos setores econômicos, especialmente os da saúde”, afirmam a UNI Global Union e a Confederação Sindical Internacional (CSI).
Segundo informe conjunto, a pandemia atingiu de maneira desproporcional “mulheres, negros, migrantes, trabalhadores precários e outros vulneráveis”. Muitos estão na linha de frente de combate à covid, “sub valorizados e mal remunerados”.
Sem acesso a direitos
Mas, “desafortunadamente”, ressaltam as entidades, milhões desses trabalhadores não têm acesso a direitos ou benefícios legais. Isso porque “seus governos não reconhecem a covid-19 como uma doença profissional”. Esse tipo de enfermidade se contrai devido a fatores de risco no trabalho. “Em muitos países, se as condições de trabalho causam uma enfermidade, os trabalhadores podem receber proteção social ou benefícios vitalícios. Isto inclui pagamento de despesas médicas, salários e outros custos de saúde a longo prazo”, diz a nota.
Os sindicalistas observam que, se já é difícil comprovar a relação entre lesão e trabalho, a tarefa se mostra ainda mais desafiadora no caso de uma doença que circula na comunidade. “Em muitos desses casos, a carga probatória recai sobe os trabalhadores, que devem demonstrar a evidência médica que relacione a doença diretamente com o lugar de trabalho.”
Para tentar resolver o problema, alguns governos têm adotado políticas e normas legais específicas. Mas, ainda no caso da covid, a questão se tornou controversa. Muitos casos são, pelo menos a princípio, assintomáticos.
Políticas públicas
Assim, a melhor política seria de “posição de presunção” da doença, o que permite acesso imediato aos benefícios, mas poucos países adotam essa iniciativa. A UNI Global e a CSI analisaram políticas em 181 locais – 124 países, 37 estados americanos, 13 províncias e territórios do Canadá e sete estados da Austrália. “O que encontramos foi preocupante”, afirmam.
“Os sistemas de indenização de trabalhadores, os programas de seguridade social e os sistemas de saúde pública quase nunca são suficientes para mitigar os impactos da pandemia entre os trabalhadores”, apontam as entidades sindicais.
Segundo o levantamento, em pouco mais da metade (98) dos locais analisados se reconhece a covid-19 como doença profissional por meio de um processo regulatório. Mas apenas 6% tem “políticas de presunção” para todos os trabalhadores e 17% para os da área de saúde. As 10 áreas com melhores resultados concentram apenas 2% do total dos trabalhadores, “deixando a grande maioria com direitos e benefício limitados quanto ao impacto da covid-19”.
Apelo à OIT
O relatório aponta o Brasil como país com baixo índice de atenção ao problema. “Em uma situação mais perigosa, o governo do Brasil reconheceu a covid-19 como enfermidade profissional, mas os trabalhadores informaram que é impossível ter acesso a qualquer tipo de benefício por parte do Estado.” A Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, do Ministério da Economia, diz que, conforme o caso, a covid-19 pode ser considerada doença do trabalho. Já existem decisões judiciais nesse sentido.
“Sem o apoio necessário, os trabalhadores e suas famílias devem enfrentar, por si próprios, as enormes consequências do vírus, incluindo os impactos de longo prazo, os problemas psicológicos e sanitários e outras enfermidades cardíacas e pulmonares relacionadas”, alertam. “A OIT (Organização Internacional do Trabalho) deve atuar urgentemente para reconhecer a covid-19 como uma doença profissional. Esse reconhecimento estimularia os estados-membro a fazer o mesmo, aumentando assim a proteção social dos trabalhadores em nível mundial.”
Comissão Europeia lança roteiro para combater as empresas de fachada e limitar os seus benefícios fiscais
A Comissão Europeia vai apresentar, ainda este ano, uma proposta legislativa destinada a “neutralizar a utilização indevida de entidades fictícias”, empresas que são apenas uma caixa de correio, sem uma atividade econômica real e criadas apenas para fins fiscais.
A iniciativa está prevista no plano de ação fiscal publicado pelo executivo comunitário na última semana, uma das etapas do programa de reformas que Bruxelas apresentou no último Verão, baseado no princípio de que “a boa governação fiscal é a base para uma tributação justa” na Europa.
É um projecto que será complementar de outras medidas que visam travar a utilização de estruturas m paraísos fiscais (centros financeiros de baixa ou nula tributação) para a transferência de lucros, como são os casos da medida que obrigará as multinacionais a divulgarem onde pagam impostos ou da ideia de criar um nível mínimo de tributação de IRC a nível mundial, actualmente em discussão entre 139 países no âmbito do “Quadro Inclusivo da OCDE/G20”.
No programa sobre a fiscalização das empresas para o século XXI, a Comissão Europeia afirma que “as entidades jurídicas sem substância ou com uma atividade econômica mínima continuam a representar um risco de serem utilizadas para fins impróprios, tais como o planejamento fiscal agressivo, a evasão fiscal ou o branqueamento de capitais”.
O Parlamento já tinha pedido ao executivo comunitário mais medidas para conter a utilização das empresas de fachada, ao aperceber-se de que os registros nacionais usados nos vários Estados-membros para identificar os beneficiários efetivos, mesmo com as regras comuns que já existem a nível europeu, ainda têm limitações, continuando a ser difícil saber quem está por detrás de uma entidade nos casos em que alguém usa “uma rede de empresas fictícias” para ocultar a sua ligação a uma empresa ou a uma entidade.
A Comissão Europeia entende que, “embora possam existir razões válidas para a utilização de tais entidades”, é necessário evitar que estas “entidades ou estruturas” sejam criadas com o objetivo principal de “reduzir a responsabilidade fiscal ou dissimular a conduta imprópria de um grupo ou das suas operações sem substância e atividades econômicas reais” no local onde essas entidades são criadas.
Bruxelas diz ser preciso atuar em três dimensões. Entende que é necessário “exigir às empresas que comuniquem à administração fiscal as informações necessárias para avaliar se têm presença substancial e atividade econômica real” nas jurisdições onde estão presentes; considera ser preciso “rejeitar benefícios fiscais ligados à existência ou utilização abusiva de empresas fictícias”; e defende a criação de “novos requisitos de informação fiscal, controle e transparência fiscal”.
O plano de ação está dividido entre uma visão de curto prazo e outra de um horizonte médio-longo para que, de forma progressiva, a tributação das empresas nos países europeus responda à evolução da economia na era digital e trave as estratégias de planejamento agressivo no mercado interno.
Há uma outra novidade. Bruxelas vai retirar uma proposta sobre a matéria coletável comum consolidada do IRC, que tem estado parada há vários anos por falta de acordo entre os governos europeus, e vai substitui-la por uma outra que — acompanhando as negociações internacionais na OCDE — pretende criar um “conjunto único de regras em matéria de impostos a aplicar às empresas na UE”, onde se inclui “uma repartição mais equitativa dos direitos de tributação entre os Estados-membros”.
A proposta será apresentada em 2023. A iniciativa surge no contexto em que 139 países estão a debater, no quadro da OCDE, um conjunto de reformas fiscais divididos em dois pilares. Um passa pela criação do patamar mínimo de IRC a nível global (para combater os paraísos fiscais), outro pela definição de novas regras sobre a tributação dos lucros globais das multinacionais e sobre a repartição dos direitos de tributação em função não apenas da presença física, mas também da conexão de um negócio a uma geografia pela interação digital com os clientes ou utilizadores locais.
A Comissão reafirma ainda a intenção de propor a criação de um imposto digital.
Os Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais somam sozinhos mais da metade do PIB (Produto Interno Bruto) do país. Considerando também o Espírito Santo, a região Sudeste concentra 55% da soma de todos os bens e serviços finais produzidos pelo setor.
São Paulo é o Estado que mais ocupa o PIB industrial em uma mesma região. A Unidade Federativa é responsável por 54,2% do indicador no Sudeste. Os dados são de levantamento da CNI (Confederação Nacional da Indústria) divulgado nesta 2ª feira (24.mai.2021).
Pensando a importância do setor para o PIB de cada Estado, porém, o destaque é o Amazonas, único na qual a indústria representa mais de ⅓ do PIB estadual (34,3%). No Distrito Federal, no outro lado da escala, ela é responsável só por 4,2% das riquezas produzidas.
Eis um infográfico com os dados de cada unidade da federação:
Segundo a confederação, ainda que a indústria seja responsável por 20,4% das riquezas produzidas no Brasil, responde por 33% do pagamento dos impostos federais, 31,2% da arrecadação previdenciária, 69,2% das exportações brasileiras de bens e serviços e 69,2% do investimento empresarial em pesquisa e desenvolvimento.
O presidente do BC (Banco Central), Roberto Campos Neto, disse nesta 3ª feira (25.mai.2021) que a diferença de vacinar 1.000 e 2.000 pessoas por dia contra a covid-19 tem um “impacto brutal” no PIB (Produto Interno Bruto). De acordo com ele, o processo de imunização da população é uma “luz no fim do túnel“.
Campos Neto falou em evento do banco BTG Pactual. Ele afirmou que o Brasil tem uma estrutura boa para aplicar as doses. Comemorou a possibilidade de vacinar 40 milhões de pessoas em junho, como foi dito pelo ministro Marcelo Queiroga (Saúde), e a sobra de doses em países desenvolvidos, como os Estados Unidos.
Citou ainda que outros antivirais e sprays que estão em experimentos podem ajudar no processo de normalização da economia.
“O tempo é essencial. Se fizer um estudo e ver o impacto no PIB de vacinar 1.000 pessoas por dia ou 2.000 mil por dia, é um impacto brutal”, afirmou. “Cada mês, ou semana, que fica com o distanciamento social tem um custo econômico elevado, lembrando que eu mostrei que a eficácia acaba sendo reduzida nos países emergentes, onde as pessoas precisam trabalhar, estão muito tempo em casa”, completou.
Campos Neto disse que o Brasil voltou a ter uma pequena aceleração dos casos da covid-19, mas com número de óbitos baixos nos últimos dias. “Obviamente isso sempre nos preocupa. A gente tem que avançar com a vacinação o mais rápido possível”, declarou. Segundo ele, países da Europa aceleraram o processo de vacinação, como, por exemplo a Alemanha. A China vacinou quase 20 milhões de pessoas em um único dia.
“A gente precisa participar desse movimento e acelerar. O Brasil tem feito um trabalho relativamente bom, tem uma capilaridade de vacina”, afirmou.
De acordo com ele, as medidas de restrição de mobilidade social são cada vez menos efetivas. Levantou o questionamento sobre a eficácia das restrições, principalmente em países emergentes. Ponderou, porém, que os setores têm conseguido produzir o mesmo ou até mais em home office, o que demonstra uma adaptação da economia brasileira.
Repetiu que o Banco Central deve reajustar o crescimento do PIB do país em 2021 para perto de 4%. Segundo o presidente do BC, a prévia do PIB do 1º trimestre surpreendeu positivamente. Ele espera um resultado positivo de abril a junho. No 2º semestre, afirmou que dependerá do ritmo de vacinação.
Afirmou ainda que o Pix, o sistema de pagamentos instantâneos do BC, possibilitará um acompanhamento quase que em tempo real do PIB com a popularização da ferramenta.
Centrais sindicais, entre elas a CUT (Central Única dos Trabalhadores) e a UGT (União Geral dos Trabalhadores) vão a Brasília entregar pessoalmente aos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), uma série de propostas que elaboraram em conjunto.
A entrega da chamada “Agenda Legislativa das centrais sindicais”, marcada para a próxima 4ª feira (26.mai.2021), será acompanhada por um ato.
Segundo nota da CUT, “o ato do dia 26 não promoverá ações de rua que gerem aglomeração”.
A agenda legislativa elaborada pelas centrais sindicais contém 23 proposições. Uma delas é para que o auxílio emergencial volte a ter o valor de R$ 600 e seja pago enquanto durarem os efeitos econômicos da pandemia. Outro ponto debatido pelos sindicatos e que será apresentado ao Congresso é o fortalecimento de medidas de proteção ao emprego.
Além de CUT e UGT, fazem parte da iniciativa a Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares), o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra) e as frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo.
Sérgio Nobre, presidente da CUT, afirmou que “o povo está passando fome, o custo de vida aumentou, os preços dos alimentos, do gás subiram e o auxílio emergencial foi reduzido. Uma grande tragédia”.
Segundo ele, a redução do valor do auxílio é “um crime”.
“Mas um crime ainda maior é o governo Bolsonaro ter reduzido o número de pessoas que podem receber esse auxílio, hoje indispensável para evitar ainda mais brasileiros passem fome e que o país enfrente uma convulsão social”.
Cortes nos benefícios por falta de prova de vida começam pela competência do mês de maio, para os residentes no Brasil
A partir de 1º de junho deste ano, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) retoma o bloqueio de benefícios de aposentados e pensionistas por falta de prova de vida. O procedimento estava suspenso desde março do ano passado, devido à pandemia de covid-19.
A medida foi publicada na Portaria 1.299, do último dia 13 de maio, apesar do contexto acentuado de pandemia de coronavírus no Brasil.
De acordo com o Instituto, cerca de 11 milhões de pessoas precisam de comprovação de vida para continuarem cadastradas. Em caso de bloqueio do pagamento, suspensão ou cessação, a regularização deve ser feita na agência bancária em que é feito o pagamento do benefício ou em agência no INSS.
Prova virtual
A comprovação de vida é feita anualmente e alguns beneficiários podem fazer o procedimento pela biometria facial, ou seja, de forma virtual. Assim, 5,3 milhões de beneficiários participantes do projeto poderão realizar o benefício sem sair de casa, por meio do aplicativo “Meu gov.br”.
Os beneficiários que farão parte do projeto irão receber uma mensagem de texto no celular ou um e-mail com as orientações. Os convocados devem ter biometria cadastrada na Justiça Eleitoral ou no Departamento de Trânsito (Detran), além de um celular com câmera fotográfica.
O INSS apresentou uma tabela com as colunas de competência de “vencimento da comprovação de vida” e da “retomada da rotina”. Aqueles que não fizeram a comprovação mesmo antes de março de 2020 devem ser os primeiros a realizar o procedimento.
O INSS organizou o procedimento da seguinte maneira: os beneficiários cuja prova de vida venceu entre março e abril de 2020 devem realizar a comprovação em junho de 2021. O grupo que tinha limite entre maio e junho do ano passado deve fazer em julho deste ano. Quem estava registrado com vencimento em julho e agosto de 2020 deve fazer a prova até agosto de 2021. Setembro e outubro de 2020: setembro de 2021. Novembro e dezembro de 2020: outubro de 2021. Janeiro e fevereiro de 2021: novembro de 2021. E, por fim, março e abril de 2021: em dezembro de 2021.
O principal projeto entre os que devem ser votados no Congresso na semana que se inicia ainda está longe dos plenários. Trata-se da reforma administrativa, que provavelmente será analisada na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara na 3ª feira (25.mai.2021).
O colegiado deve passar toda a 2ª feira (24.mai) na discussão da proposta, ou seja, com deputados se alternando para discursar. A comissão discute a admissibilidade do projeto. Por exemplo, se não há nada no texto que vai contra uma cláusula pétrea da Constituição.
Depois, a proposta ainda precisa passar por uma comissão especial, onde o mérito é analisado, antes de ir para o plenário da Câmara. Sem contar a tramitação posterior no Senado.
O relator, Darci de Matos (PSD-SC), fez alterações no projeto, de autoria do governo. Ele retirou alguns princípios que o Executivo gostaria de incluir nas diretrizes do serviço público na última versão do relatório. Mas as principais mudanças já haviam sido realizadas por Darci em versão anterior do documento:
atividades remuneradas – retirou da proposta a proibição de servidores públicos terem “qualquer outra atividade remunerada”, que impediria, por exemplo, um técnico do governo de dar aulas (remuneradas) em instituições de ensino;
decretos – retirou da proposta do governo trecho que dava ao presidente da República o poder de extinguir e fundir entidades da administração pública por decreto.
A nova versão do relatório de Darci de Matos foi publicada no sistema da Câmara nesta 5ª feira (20.mai.2021). Leia a íntegra (294 KB). Apesar de ser só uma etapa inicial de tramitação, a aprovação do projeto na CCJ será uma boa notícia para o governo.
Ainda não há uma pauta definida para o plenário da Casa. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), deve almoçar com líderes de bancadas aliadas na 3ª feira (25.mai). É provável que nesse encontro se discutam as prioridades da semana.
Líderes ouvidos pelo Poder360 disseram que há chances de ser pautado o projeto que estabelece regras para micro e minigeradores de energia elétrica. O tema é conhecido como geração distribuída. Tramita no PL (projeto de lei) 5.829 de 2019.
Além disso, algumas comissões da Casa Baixa convidaram ministros para participar de audiências. O Poder360 as lista a seguir.
(2ª feira) Venda da Eletrobras – ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, é convidado de duas comissões da Câmara para falar sobre o assunto:
(5ª feira) Câmara & Cidadania – Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa tem audiência pública sobre “as políticas públicas e as boas práticas voltadas às pessoas idosas no Brasil”. O Ministro da Cidadania, João Roma, é convidado. Às 10h.
(6ª feira) Câmara & Comunicações – ministro das Comunicações, Fábio Faria, é convidado para audiência pública na Comissão de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e da Amazônia. O tema: “Serviços prestados pelos Correios na Amazônia e PL (projeto de lei) 591 de 2021 (privatização da estatal)”. Às 9h.
CPI AMORNA
A CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid continua sendo o principal assunto do Senado. Nesta semana, porém, deverá ter menos destaque do que na semana passada. Os depoentes não são badalados como os ex-ministros general Eduardo Pazuello (Saúde) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores), que falaram há alguns dias.
A seguir, os compromissos marcados da comissão. Apenas um deles já tem horário.
(3ª feira) Mayra Pinheiro – ouve a secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro. Às 9h;
(4ª feira) Próximos passos – vota requerimentos e define próximos depoentes;
(5ª feira) Élcio Franco – ouve o ex-secretário executivo do Ministério da Saúde.
O ministro Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia) será ouvido na 2ª feira (24.mai) na comissão que acompanha o combate à pandemia. Trata-se de um colegiado anterior à CPI. Pontes falará sobre cortes nas verbas para pesquisa de vacinas.
Os senadores ainda não definiram qual será a pauta de votações do plenário. Normalmente essa decisão é tomada em reunião dos líderes de bancada no início da semana.
A pandemia da Covid-19 piorou dramaticamente as condições de um mercado de trabalho que já carregava os efeitos da recessão e do baixo crescimento.
Virginia Rolla Donoso e Carlos Henrique Horn
Nos primeiros quatorze anos deste século, a economia brasileira vivenciou um processo de crescimento contínuo do emprego. Em média, o nível geral da ocupação aumentou 1,8% a.a. entre 2001 e 2014, quando se atingiu o auge dessa expansão no terceiro trimestre. E mesmo quando o país foi atingido pela crise iniciada no mercado subprime norte-americano no fim de primeira década, o impacto sobre o mercado de trabalho foi menos intenso e mais breve do que se observou nas economias desenvolvidas. A contraface da persistente expansão no nível geral do emprego foi a queda na taxa de desocupação. Em 2014, a taxa de desocupação estimada pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) do IBGE[1] havia diminuído para 6,8% da força de trabalho, tendo chegado a um piso de 6,5% no quarto trimestre do ano.
O crescimento do emprego e a relativa baixa taxa de desemprego – associados à alta gradual no salário mínimo, aos resultados favoráveis nas negociações coletivas de salário, à formalização dos trabalhadores, ao aumento nas taxas de escolarização etc. – configuravam um ambiente francamente mais positivo para os trabalhadores. Houve, à época, quem interpretasse a maior atividade no mercado de trabalho como um processo mais amplo de mudança na sociedade, de significativa expansão da classe média, quando o que se verificava era uma melhora nas condições de vida de assalariados e de trabalhadores em outras formas de ocupação, com ampliação de oportunidades e elevação da renda.
Este processo, no entanto, foi interrompido com o início da recessão econômica no segundo trimestre de 2014 e, sobretudo, com seu agravamento nos anos de 2015 e 2016. A redução anterior no desemprego era entendida por alguns analistas como um dos fatores explicativos da alta na inflação. O então economista-chefe do Itaú Unibanco, por exemplo, assim escreveu, sem meio-termo, em 2013:
[…] o combate à inflação requer estar disposto a abrir mão de coisas valiosas. A sociedade está preparada para (temporariamente) reduzir o consumo e desaquecer o mercado de trabalho para reduzir a inflação? … O mercado de trabalho aquecido tem gerado aumentos de salários que, repassados aos preços, têm gerado resistência à queda da inflação. (Ilan Goldfajn, Combater a inflação, mexer no emprego).
Esta e tantas outras observações semelhantes, que dirigem o foco de suas preocupações aos menores níveis de desemprego, fazem lembrar o ensaio seminal de Michal Kalecki, Os aspectos políticos do pleno emprego, em que o economista polonês enumera os motivos pelos quais os empregadores resistem a aceitar baixos níveis de desemprego. Uma taxa de desocupação que reflita apenas o que os economistas denominam desemprego friccional tem o dom de arrefecer o poder disciplinador do mercado de trabalho. Um resultado da redução do desemprego pode ser a diminuição da desigualdade distributiva, com melhora na participação das rendas do trabalho. A resistência à redistribuição da renda surge por meio da inflação provocada por quem procura defender suas margens de lucro, ou da mudança recessiva na orientação da política econômica que induza ao aumento no desemprego, ou de outras ações regressivas nos campos da economia e da política.
Nos primeiros meses de 2015, após a troca nos condutores da política econômica nacional, a medicação recessiva foi aplicada em doses fartas, o que logo se fez sentir no mercado de trabalho. Entre dezembro de 2014 e março de 2017, o país perdeu 3,8 milhões de postos de trabalho. Esta contração de 4,1% no número de pessoas ocupadas foi acompanhada por um salto na taxa de desocupação, que mais do que duplicou no mesmo período – passando de 6,5% para 13,7% da força de trabalho. Neste cenário, o número de desempregados, de pessoas que procuravam ativamente trabalho e renda para sobreviver, chegou a 14,1 milhões de pessoas.
Desde então, o mercado de trabalho brasileiro não recuperou as condições mais favoráveis aos trabalhadores que haviam vigorado nos primeiros quatorze anos deste século. Uma lenta recuperação da atividade econômica levou a que apenas em outubro de 2018 o nível de emprego voltasse a atingir o patamar anteriormente observado em dezembro de 2014. Em 2019, o número de pessoas ocupadas era tão somente 1,9% maior do que o estimado para o ano de 2014. Quanto à taxa de desemprego, que chegara ao ápice em março de 2017, recuou também lentamente até atingir 11% da força de trabalho no fim de 2019. Naquele momento, havia 11,6 milhões de pessoas em busca de emprego e renda no Brasil, um número 81,5% maior do que o registrado em dezembro de 2014.
A pandemia da Covid-19 piorou dramaticamente as condições de um mercado de trabalho que já carregava os efeitos da recessão e do baixo crescimento. O impacto da crise sanitária, contudo, foi muito mais intenso do que o da recessão de 2015-16. A Figura 1 mostra a conhecida trajetória do nível da ocupação e do tamanho da força de trabalho no ano de 2020, sendo possível contrastá-la com o que ocorreu no biênio recessivo. Afora a marcante diferença de intensidade na queda do nível de ocupação, outra diferença básica entre os dois períodos é que, no ano da pandemia, a redução no nível de emprego se desdobrou, sobretudo, em uma saída massiva de pessoas da força de trabalho, o que não se constatou durante a recessão anterior, quando a rápida piora na ocupação resultou em um aumento substancial no desemprego sem redução do tamanho do mercado de trabalho.
Figura 1: Evolução da ocupação e da força de trabalho, Brasil, 2014-2020 (mil pessoas)
Duas severas crises em tão curto intervalo temporal transformaram o perfil da inserção da população brasileira na atividade produtiva, sendo o efeito da pandemia da Covid-19 especialmente devastador em termos de destruição de empregos, empresas e meios de subsistência e da multiplicação do número de pessoas em condição de pobreza. Para evidenciar a drástica mudança no perfil da inserção produtiva da população, apresentamos a Figura 2, elaborada com base em estimativas da PNAD Contínua. A Figura mostra o percentual de pessoas em três grandes grupos populacionais em relação ao total da população com 14 anos ou mais de idade – chamada de população em idade de trabalhar – nos anos de 2014 e 2020. Os grupos populacionais são os seguintes: (i) pessoas ocupadas e que julgavam trabalhar um número suficiente de horas; (ii) pessoas em condição de subutilização da sua força de trabalho, ou seja, que manifestam vontade e/ou necessidade de trabalhar ou de trabalhar mais horas; e (iii) pessoas inativas para o mercado de trabalho, ou seja, que não trabalham, nem manifestam vontade presente de trabalhar.
Figura 2: Perfil da população em idade de trabalhar, 2014/2020 (%)
A grande mudança ocorrida no perfil da inserção da população em idade de trabalhar foi a queda acentuada na participação das pessoas ocupadas com horas suficientes e sua contrapartida direta no aumento da participação das pessoas em condição de subutilização da força de trabalho. Em 2014, para cada pessoa em condição de subutilização, havia 5,7 pessoas ocupadas, auferindo rendimentos e que consideravam trabalhar um número suficiente de horas. Em 2020, essa relação despencou para 2,6 pessoas. Quanto às pessoas classificadas como inativas perante o mercado de trabalho, pois não trabalham, nem estão à procura de ocupação ou manifestam vontade de trabalhar, o percentual se manteve no mesmo patamar, de 36,4% da população com 14 anos e mais de idade.
A trajetória de expansão do número de pessoas que precisam trabalhar e se encontram em condições de subutilização foi cumulativa entre 2014 e 2020. Neste período, o aumento no número de pessoas nesta categoria foi colossal, passando de 15 milhões em dezembro de 2014 para 32 milhões em dezembro de 2020. A Figura 3 apresenta a evolução da taxa de subutilização da força de trabalho no Brasil, onde fica clara a tendência ascendente a partir de 2015. Em janeiro daquele ano, o contingente de pessoas com sua capacidade de trabalho subutilizada era de 15% da força de trabalho ampliada, o que praticamente duplicou até atingir 28,7% no fim de 2020. Em setembro deste ano, o indicador atingiu um pico de 30,6% no contexto da crise sanitária, ou seja, três em cada dez pessoas na força de trabalho (ampliada) necessitando trabalhar ou trabalhar mais horas a fim de prover a sobrevivência de sua família.
Figura 3: Evolução da taxa de subutilização da força de trabalho, Brasil, 2014-2020 (%)
Os indicadores sobre a subutilização da força de trabalho fornecem uma visão mais detalhada sobre as condições do mercado de trabalho do que o indicador singular da taxa de desemprego. Há três categorias de subutilização nas estatísticas da PNAD Contínua, a saber: (i) as pessoas desocupadas, ou seja, que não têm trabalho e procuram ativamente por um trabalho; (ii) as pessoas ocupadas, mas que julgam trabalhar um número insuficiente de horas e buscam ampliar sua carga de trabalho e rendimentos; e (iii) a assim-chamada força de trabalho potencial. Este último grupo é tradicionalmente apresentado como uma parcela da população em idade ativa que se encontra fora do mercado de trabalho. Nele, o IBGE considera duas situações: (i) pessoas que recentemente teriam realizado busca efetiva por trabalho, mas não se encontram disponíveis para trabalhar quando foram entrevistados, e (ii) pessoas que não teriam realizado essa busca, mas declaram que gostariam e estariam disponíveis para trabalhar. Conquanto sejam classificadas como parte da população fora da força de trabalho (efetiva), essas pessoas são passíveis de mais rápida mobilização num contexto de recuperação do mercado de trabalho. Donde a expressão força de trabalho potencial.
A força de trabalho potencial cresceu rapidamente em virtude dos desdobramentos da crise sanitária no Brasil, quando houve massiva saída de pessoas do mercado de trabalho por perda de ocupação e desistência de procurar novo trabalho. Atingiu 11,5 milhões de pessoas no ano de 2020, um contingente pouco inferior ao dos desempregados, que chegaram a 13,4 milhões de pessoas na média do ano. Portanto, somados os desocupados e a força de trabalho potencial, havia 24,9 milhões de brasileiros e brasileiras que, em graus diversos, careciam de trabalho e renda no ano passado. Ao incluir também os subocupados por insuficiência de horas, o resultado é um nível notavelmente elevado de 31,2 milhões de pessoas que padeciam de subutilização da sua força de trabalho.
A piora geral das condições de vida dos trabalhadores brasileiros desde 2014 pode ser evidenciada no aumento do número de pessoas na condição de subutilização. A Figura 4 mostra o crescimento no número de pessoas em cada categoria – desocupados, subocupados com insuficiência de horas e força de trabalho potencial. Mostra, ainda, o crescimento de um subgrupo da força de trabalho potencial, o dos desalentados. São pessoas que, segundo a PNAD Contínua, não procuraram trabalho nos trinta dias de referência da pesquisa, mas estariam disponíveis para trabalhar. Os motivos para terem deixado de buscar uma ocupação são variados: insucesso na obtenção de trabalho após longa procura, falta experiência, ser considerado muito jovem ou idoso, não encontrar trabalho na localidade em que tem moradia. Em qualquer caso, demonstram disponibilidade para assumir um posto de trabalho. Com o efeito cumulativo da piora na economia brasileira desde 2014, o número de desalentados passou de 1,5 milhão para 5,2 milhões de pessoas no intervalo de seis anos.
Figura 4: Número de pessoas nos grupamentos da subutilização da força de trabalho, Brasil, 2014/2020 (mil pessoas)
O economista institucionalista norte-americano John Rogers Commons, um dos fundadores do campo de investigação sobre as relações de trabalho (industrial relations) nos Estados Unidos no início do século XX, contemplava quatro métodos de melhora das condições dos trabalhadores: políticas macroeconômicas de incentivo ao emprego; legislação protetiva do trabalho; negociação coletiva de trabalho e a administração de recursos humanos das empresas. Destes, considerava como mais efetivo a política econômica que lograsse reduzir a taxa de desemprego. Ela funcionaria como o mais relevante elemento singular, aquele capaz de alargar – ou de contrair, no caso de aumento da taxa de desemprego – as possibilidades de sucesso dos demais métodos.
O ambiente de 2021 é dramático para as condições dos trabalhadores brasileiros. A precarização do mercado de trabalho evidenciada nos indicadores de subutilização é tamanha que não há método capaz de lhe fazer oposição. Neste ambiente, a legislação se tornou menos efetiva – ainda mais diante do ataque sistemático de que é alvo desde o golpe de 2016 –, os sindicatos perderam poder de barganha e as empresas, mesmo aquelas que procuram praticar uma política progressista de recursos humanos, se veem tentadas ou forçadas a rebaixar custos pelo caminho regressivo da contenção salarial. É provável que, no período de boom pós-pandemia – que, no momento, carece de perspectiva clara no caso do Brasil –, ocorra uma melhora natural nas condições do mercado de trabalho. A questão que importa é saber se o país conseguirá dar continuidade a este sopro de recuperação, enfrentando os enormes desafios para inserir as pessoas que estão à margem de um trabalho que lhes assegure sobrevivência justa e digna. Não haverá tarefa mais importante no tempo imediato. Este enfrentamento, todavia, exigirá uma nova política econômica. E uma real política de desenvolvimento da nação.
Notas
[1] Este artigo e tantas outras análises do mercado de trabalho brasileiro muito devem à atividade do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a principal instituição brasileira de produção de estatísticas socioeconômicas e de enorme variedade de dados que nos permitem melhor conhecer o país. Em 29 de maio de 2021, o IBGE completa 85 anos de existência num contexto pouco favorável aos que labutam em prol da ciência. Registramos nossos agradecimentos aos que perseveram em manter acesa a chama do rigor científico em todas as áreas do IBGE.
Virginia Rolla Donoso é economista e trabalha no site Democracia e Mundo do Trabalho. É mestre em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Carlos Henrique Horn é economista e professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É doutor em Industrial Relations pela London School of Economics and Political Science.
IMAGEM: RONALDO SILVA/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
Negócios que relatam problema subiram de 22% para 34% em seis meses, mostra FGV
Uma em cada três empresas brasileiras cita a existência de trabalhadores em licença por Covid-19 entre os problemas enfrentados durante a pandemia, de acordo com sondagem especial realizada pelo FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) em abril.
Os dados mostram que os setores que enfrentaram menos restrições de funcionamento neste ano são aqueles com maiores índices de empresas que citam a questão da contaminação de seus funcionários.
No geral, 34% das empresas reportaram afastamento de funcionários aos pesquisadores. No levantamento anterior, realizado em outubro do ano passado, eram 22%.
Afastamento de funcionário por Covid afeta um terço das empresas
Na indústria, o percentual passou de 24% para 42% nesses seis meses. O segmento de vestuário se destaca nos dois levantamentos com os maiores percentuais, ambos próximos de 75%. Na construção, passou de 25% para 39%, chegando a 47% nas edificações residenciais.
No comércio, que enfrentou mais restrições, o número continua em torno de 25%. Hiper e supermercados, que são serviços essenciais e não fecharam, apresentam percentual acima da média do setor (31%).
Nos serviços, as empresas que citam afastamentos passaram de 18% para 32%, resultado puxado por segmentos como serviços administrativos, transporte rodoviário e armazenagem e correio, todos em torno de 40%.