Uma das principais fontes de sobrevivência de entidades sindicais de empresas e de trabalhadores será extinto se for aprovado o substitutivo da proposta de reforma trabalhista enviado pelo governo do presidente Michel Temer.
Trata-se do chamado imposto sindical. É uma contribuição paga por todos os trabalhadores com carteira assinada, mesmo que não seja associado de entidade sindical. Equivale a um dia de trabalho por ano. Desse valor, 10% vão para as centrais sindicais às quais o sindicato da categoria de cada trabalhador é filiado. A maior parte é distribuído por 17 mil sindicatos. Em 2009, foram arrecadados $ 3,5 bilhões.
"Os sindicatos vão sobreviver com o auxilio dos seus associados", previu o relator em entrevista ao DCI, no caso de aprovação da proposta. Acrescentou que o efeito será tirar de cena os chamados "sindicatos de fachada".
"Aqueles que vivem em função de uma verba pública, que tem natureza tributária e não é fiscalizada, esses não representam o conjunto dos trabalhadores", avaliou.
Segue a entrevista do relator da reforma trabalhista:
DCI - O senhor já tem definido quando será apresentado o seu relatório?
Rogério Marinho - Se não houver nenhuma mudança, dia 12 de abril a gente apresenta o relatório, quanto a ser votado, vai depender do trâmite interno, dentro da comissão, acredito que até meados de abril, princípio de maio deverá ser votado.
DCI - O senhor já tem uma visão das 842 emendas?
RM - Visão sim, mas não analisei todas ainda. Observei menos de 300.
DCI - Já fizeram o balanço analítico, já separaram e tal.
RM - Mas, eu não vi, vi menos de 300.
DCI - O que o senhor considera inegociável e o que é negociável nessas emendas?
RM - Eu não tenho essa condição de definir o que é ou não negociável. Só posso dizer que tudo o que vier para aperfeiçoar o texto será bem vindo. Mas eu não tenho ainda nenhuma visão sobre isso. Ainda é prematuro falar sobre.
DCI - Conforme notícia da Agência Câmara, a maioria das emendas, 155 delas, são sobre a questão do negociado sobre o legislado. Essa é a espinha dorsal do projeto?
RM - É natural que as emendas versem sobre a negociação, já que é a principal base do projeto apresentado pelo governo federal.
DCI - Alguma mudança nesse sentido poderia desconfigurar o projeto?
RM - Eu entendo que há uma ansiedade natural. Há a necessidade de termos a retirada da obrigatoriedade do imposto da contribuição sindical. Isso vai constar no relatório, porque acho que isso fortalece o movimento sindical, retirando os sindicatos de fachada.
DCI - O senhor não teme uma reação violenta por parte de empresários e trabalhadores?
RM - São 17.081 sindicatos, dos quais mais de cinco mil de empresários e os demais dos empregados. Reação haverá, violenta, se não chegar no limite do esforço físico, está de bom tamanho. Estão no papel deles. Quem achar que é necessária a preservação vai fazer o debate, estabelecer o contraditório, vai propor alterações ou simplesmente a supressão do texto, por ocasião da votação do relatório. É natural numa democracia, ninguém pode querer cercear o debate. Esse é um ponto.
DCI - Já se mostrou contrários a isso uma parte das centrais sindicais e também as grandes confederações, isso não pode dificultar a aprovação da proposta, deputado?
RM - Eu desconheço o que você está falando, eu não vi ninguém falar, publicamente, o contrário. Com a exceção de algumas centrais sindicais que falaram em tese não há nenhuma manifestação formal. A CNI [Confederação Nacional da Indústria], pelo contrário, me disse na semana passada que é favorável. Então, vamos aguardar...
DCI - Então, eles aceitam perder R$ 3 bilhões?
RM - Mas, isso não é só deles. Você divide isso com 17 mil sindicatos. São R$ 3,5 bilhões no total daqueles que são favorecidos pela questão do imposto. Se eu tivesse dificuldade de enfrentar pressão, eu não estaria na relatoria.
DCI - O senhor acha, então, oportuno entrar nessa questão, porque ela pode democratizar a atividade sindical?
RM - Eu tenho absoluta e certeza e convicção de que, para termos liberdade sindical, melhoria no processo de representatividade e diminuição da pulverização desse mundo de sindicatos, que geram toda a sorte de dificuldades e distorção, e principalmente a legitimidade da atuação, essas organizações ficariam mais fortalecidas, se os sindicatos que fizessem as negociações, não fossem apenas sindicatos de fachada.
Os sindicatos vão sobreviver com o auxilio dos seus associados, aqueles que vivem em função de uma verba pública que tem natureza tributária e não fiscalizada, esses não representam o conjunto dos trabalhadores.
DCI - Nesse mesmo caminho o senhor também propõe o fim da contribuição assistencial, que incide sobre os não sindicalizados, em casos de acordos coletivos?
RM - Não. Eu vou avaliar. Eu não estou propondo o fim da contribuição sindical, estou propondo o fim da obrigatoriedade. A contribuição vai continuar existindo, desde que o cidadão não seja obrigado e esteja confortável para fazê-la. Se é compulsivo, tem natureza tributária, é imposto, e se é imposto tem que ser fiscalizado. Lula, quando foi presidente da República, aboliu a fiscalização. Você tem uma montanha de quase R$ 18 bilhões que não foram fiscalizados, desde o fim da fiscalização. Dinheiro público que entrou em cofres do Brasil inteiro e ninguém fiscalizou. Dinheiro fruto de uma tributação. Então, é diferente, ninguém está tirando a contribuição, até porque ela está prevista na constituição. Estamos tirando a obrigatoriedade, que é uma determinação de uma lei ordinária, para fortalecer os sindicatos.
DCI - Qual o outro ponto que o senhor já definiu?
RM - O outro ponto que nós queremos anunciar são as novas fórmulas de relação ao trabalho. Existem uma série de relações de trabalho, no Brasil, hoje, que não estão na CLT [Consolidação das Leis do Trabalho], como, por exemplo, a questão da robótica, aplicativo de internet... Nós estamos buscando uma redação, verificar de que maneira se faz isso, mas não tenha dúvida de que há uma necessidade de se adequar lei ao que existe, hoje.
DCI - Essa questão incluiria também o trabalho intermitente (jornada parcial) e o teletrabalho?
RM - Todas as formas de trabalho que estão fora da CLT. A CLT, quando foi feita, levou em consideração, como modelo, a ideia de que todo o trabalhador brasileiro, ou grande parte, seria o trabalhador de fábrica, que hoje representam 14% ou 15% da nossa força de trabalho. Então, é necessário adaptar a Lei. Não há de nossa parte nenhuma de vontade de inovar, tirando direitos ou precarizando essa relação, mas adequar ao espírito do tempo. Isso é concreto, real, existe.
DCI - Como o senhor avalia essa ideia que é sempre colocada de que a reforma vai tirar direitos trabalhistas?
RM - Quem faz essa acusação não leu a proposta ou a interpretou de maneira equivocada, ou ainda tem má-fé. Os direitos individuais dos trabalhadores, desde a Constituição de 1988, estão garantidos. É uma lei ordinária, ninguém no nosso Estado de Direito, na nossa conformação da hierarquia das Leis, uma lei ordinária não contradiz e não altera a Constituição.
DCI - O senhor pretende contemplar alguns pontos relativos à terceirização, que podem não ter sido contemplados no projeto aprovado no dia 22, na Câmara [sancionado pelo presidente Temer na sexta-feira passada]?
RM - Se houver essa possibilidade, sim.
DCI - O senhor foi consultado a respeito?
RM - Conversei com o governo, com o senador Eunício de Oliveira, presidente do Senado, e me coloquei à disposição.
DCI - Tem alguns pontos que também são interessantes, algumas propostas pedem o fim do depósito recursal. A extinção dessa exigência pode ser contemplada no seu relatório?
RM - Nós vamos avaliar. Estou falando em caráter geral dessas emendas que nós recebemos e estamos avaliando. Tem uma série de modificações até de natureza processual. Então nós vamos avaliar o que é possível ser colocado, ou não, para que, ao mesmo tempo, seja mantido o direito do trabalhador, mas que permita um ambiente negocial adequado pra quem vai empreender. Um equilíbrio que a gente vai tentar encontrar para o relatório. Vamos olhar tudo com calma e com carinho para ver o que pode ser feito e o que fazer.
DCI - Uma das proposta pede que seja aceita o negociado sobre o legislado, desde que seja mais favorável para o trabalhador. É possível?
RM - Essa questão já está prevista na Constituição. Você está entrando no detalhe de uma emenda, tem 842. Eu vou olhar com mais calma.
DCI - O senhor viu as recentes pesquisas sobre o presidente Temer?
RM - Sim, vi.
DCI - E o que o senhor achou?
RM - Acho que o presidente Temer está tendo muita coragem para propor ações importantes, estruturantes e inadiáveis, que foram procrastinadas por muito tempo. Esse adiamento e a corrupção que se estabeleceram no governo, esse descompasso gerencial que se estabeleceu em 13 anos de PT fizeram com que o País entrasse no maior processo de recessão econômica em 116 anos. Então, ele tem muita coragem de enfrentar isso, mesmo com toda a desonestidade daqueles que passaram 13 anos destruindo o País e agora se colocam como salvadores da Pátria. E essas reformas promovidas precisam ser ainda mais radicalizadas.
DCI - O senhor acha que essas críticas que estão sendo feitas às propostas podem dificultar a corrida eleitoral de quem for se candidatar no ano que vem?
RM - Sou o mais votado da minha cidade, capital do meu Estado, combatendo o Partido dos Trabalhadores e as mentiras que eles propagaram por todo esse tempo. Estou absolutamente tranquilo, porque o que estou defendendo vai ao encontro do que pensam os meus eleitores, que me apoiaram e me ajudaram o tempo todo. Estou tranquilo porque estou sendo coerente nas minhas ações.
DCI - E aquela ideia defendida por alguns sindicalistas de que o que gera emprego, hoje, é a redução da jornada de trabalho e não o aumento?
RM - Têm estudos que são apresentados no nosso comitê e na imprensa pra todo os gostos. É o copo meio cheio ou meio vazio, depende de quem olha. Então, escutar barbaridades e maluquices a gente tem escutado muito, mas a gente tem escutado muitas propostas sérias, também.
Essa agenda de redução de jornada é do pós-guerra, depois da segunda guerra mundial. Toda Europa está revendo isso. Então, a gente tem que olha os países com economia mais consolidada que a nossa e verificar que estamos defendendo uma agenda de 60 anos atrás. A França, que era um País com a jornada reduzida, fez uma mudança, ano passado, pra colocar jornada de até 60 horas por semana. As coisas não estão bem por aí.
DCI - O que dá pra melhorar nesse projeto do governo?
RM - Eu já falei tanta coisa! Vamos aguardar um pouco. O projeto veio tímido e vai ser robustecido, melhorado.
DCI - Outros pontos da CLT podem ser aprimorados?
RM - Aprimorados, sim, vamos aguardar um pouco.