É o chamado regime de capitalização, em que cada um contribui para a sua própria aposentadoria
Tema tratado com cautela pelos candidatos à presidência, a mudança nas regras da Previdência Social passou a incluir uma alternativa ao regime atual: um modelo de contas individuais em que cada trabalhador faz a sua própria poupança para aposentadoria.
No regime atual, de repartição, as contribuições vão para uma conta comum em que os mais jovens financiam a aposentadoria dos mais velhos e o governo entra para cobrir eventuais insuficiências.
A conta para o governo cobrir, porém, se tornou insustentável. O buraco hoje é de R$ 189,5 bilhões apenas no regime geral (que exclui os servidores públicos), e tende a se agravar com o envelhecimento da população.
Como forma de contornar o déficit crescente da Previdência, o regime de capitalização é defendido, em maior ou menor grau, por três dos cinco primeiros colocados nas pesquisas: Jair Bolsonaro (PSL), Marina Silva (Rede) e Ciro Gomes (PDT).
O tema, porém, é polêmico. Segundo críticos, num momento de penúria orçamentária não haveria recursos para financiar a fase de transição entre os regimes, que poderia custar até R$ 15 bilhões por ano, a depender da conta.
Em seu programa de governo, Bolsonaro diz que pretende introduzir gradualmente o sistema de contas individuais, mas que os novos participantes terão a possibilidade de optar entre os sistemas novo e velho. Guru do candidato, Paulo Guedes, já disse que uma forma de financiar essa transição seria criar um fundo com os recursos da privatização de empresas públicas.
O QUE DIZEM OS CANDIDATOS SOBRE A PREVIDÊNCIA
Jair Bolsonaro (PSL) - Pretende introduzir paulatinamente modelo de capitalização e diz que reformas serão necessárias tanto para aperfeiçoar o modelo atual como para introduzir um novo modelo. A grande novidade será a introdução de um sistema com contas individuais de capitalização
Fernando Haddad (PT) - Combate a privilégios previdenciários incompatíveis com a realidade da classe trabalhadora brasileira e convergência entre os regimes próprios da União, dos estados, do DF e dos municípios com o regime geral. Rejeita a proposta de reforma apresentada pelo governo Michel Temer
Ciro Gomes (PDT) - Combina três regimes: mais pobres são financiados pelo Tesouro; faixas intermediárias de renda têm regime de repartição, com mudanças na idade mínima e unificação de regras entre setores público e privado; e a partir de determinada faixa, vale capitalização, com contas individuais
Geraldo Alckmin (PSDB) - Propõe eliminar o déficit público em dois anos e criar um sistema único de aposentadoria, igualando direitos e abolindo privilégios. Pérsio Arida diz que a reforma não será igual à proposta pelo governo Michel Temer, mas que irá propor, por exemplo, elevação da idade mínima de aposentadoria
Marina Silva (Rede) - Proposta incluirá definição de idade mínima para aposentadoria, com prazo de transição que não prejudique quem está prestes a se aposentar; eliminação dos privilégios de beneficiários do setor público que ingressaram antes de 2003; e um processo de transição para sistema misto
Marina Silva fala em primeiro estabelecer uma nova idade mínima para o INSS para, num segundo momento, iniciar um processo de transição para um sistema misto de contribuição e capitalização, embora não ofereça prazos.
Ciro Gomes apresenta uma proposta diferente, de convivência dos regime de capitalização e repartição.
Segundo Nelson Marconi, coordenador do programa do pedetista, a ideia é criar um sistema "multipilar", que acomode uma renda mínima para os mais pobres; o regime de repartição para faixas intermediárias de renda com mudança na idade mínima e unificação do sistema geral e dos servidores públicos. Além de um sistema de contas individuais para faixas mais altas.
Os limites entre os regimes, porém, seriam definidos pelo Congresso Nacional.
Do lado dos que rechaçam a ideia de um regime novo estão Fernando Haddad, do PT, e Geraldo Alckmin, do PSDB, ainda que apresentem propostas diversas e pouco detalhadas —em especial o PSDB.
O PT refuta a necessidade de uma reforma da Previdência, embora estabeleça como meta a convergência dos regimes geral e dos servidores.
Econômico em seu programa, Alckmin reafirma a urgência de uma reforma, sem detalhes. Responsável pelo programa econômico do PSDB, o economista Pérsio Arida disse apenas que o desenho da proposta dos tucanos é diferente da apresentada por Temer.
Em evento em São Paulo na sexta-feira (21), aproveitou para criticar o sistema de capitalização, mirando especialmente o projeto de Bolsonaro.
"Quem fala em capitalização da Previdência no Brasil de hoje está aumentando o problema [do déficit público]. Quero ver as contas."
ENTENDA
Repartição - Os jovens financiam os mais velhos havendo, portanto, solidariedade entre as gerações. O sistema funciona como uma conta conjunta em que o trabalhador contribui de acordo com o salário e o empregador, segundo a folha de pagamento. O governo entra para cobrir eventuais insuficiências
Capitalização - No regime puro, cada trabalhador faz a sua própria poupança para aposentadoria. No modelo híbrido, a contribuição de empresas, por exemplo, pode ser mantida
Estudo elaborado pelo Itaú Unibanco e obtido com exclusividade pela Folha mostra que uma mudança para um regime de contas individuais a partir de 2019 e que inclua apenas jovens de até 20 anos (que teriam contas individuais ao entrar no mercado de trabalho) custaria aos cofres públicos R$ 10 bilhões ao ano.
No total, em valores atuais, os gastos somariam cerca de de R$ 350 bilhões até 2035 -- ano em que as primeiras pessoas que começaram a acumular individualmente se aposentariam, dando início à desoneração do sistema.
Economista do Itáu, Pedro Schneider, explica que o gasto adicional ocorre porque o estado para de receber a contribuição de jovens, mas ainda tem que pagar os benefícios de quem não tem a conta.
Em outra simulação feita por Fábio Klein, da Tendências Consultoria, se todos os trabalhadores que ganham acima de R$ 4 mil fossem transferidos para uma conta individual, o custo giraria em torno de R$ 15 bilhões por ano.
Felipe Salto, diretor-executivo da IFI (Instituição Fiscal Independente), do Senado, diz que a Previdência vai precisar ser discutida para que o país possa equacionar o já elevado déficit e garantir um regime sustentável às próximas gerações. "Não é mais uma questão de longo prazo. O problema está no meio da sala de estar".
FONTE:FOLHA DE S.PAULO