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O anúncio de que o governo Jair Bolsonaro (sem partido) quer usar verbas de precatórios e do Fundeb (fundo para financiar a educação básica) foi mal recebido por investidores. Para os operadores em bolsa, a percepção é de que o governo vai criar gastos sem indicar cortes, além de não ter apresentado uma proposta de reforma tributária. Durante a tarde, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), se reuniu virtualmente com dezenas de investidores e economistas das principais empresas de investimentos e bancos, entre eles Itaú, XP Investimentos, Garde Investimentos, Legacy Capital.

Ele tentou justificar as medidas e sinalizou que há apoio no Congresso para aprovar o Renda Cidadã. A Bolsa de Valores operou em queda e o dólar registrou alta. O UOL apurou a reunião com fontes em três empresas diferentes. Um economista que participou da conversa com Barros disse que a sensação que ficou foi de que o governo não entendeu os motivos da reação do mercado.

"A reação foi porque criaram um gasto e simplesmente não cortaram nada. Só empurraram gastos para frente e os articuladores não têm a mínima noção do que causou a reação adversa do mercado", disse na condição de anonimato. Questionado sobre a conversa com investidores nesta tarde, ao UOL, Barros respondeu que "foi sincero" e que explicou "o que de fato acontece". Além do mercado, o Congresso reagiu mal e políticos de bancada à direita, como o Novo, e toda a oposição criticaram o modelo.

Dia de caos e bizarro

Analistas políticos do mercado financeiro ouvidos pelo UOL afirmaram que a reação imediata, após o anúncio do governo, foi de "caos". "Bizarro foi a palavra que mais ouvimos hoje", afirmou uma fonte.

A avaliação feita é que o governo está colocando "dívida sobre dívida", ou seja, é como se o governo penhorasse uma dívida (precatório) para fazer mais dívida. Para o analista político da Tendências Consultoria, Rafael Cortez, o anúncio de hoje "é decepcionante do ponto de vista da agenda de redução do risco fiscal". "Essa política de precatórios é na verdade uma postergação de gastos, não se trata de redução estrutural", afirmou.

Cortez salientou ainda que há a percepção dos agentes econômicos de que as restrições políticas tendem a limitar a criação do novo programa de distribuição de renda sem aumentar o risco fiscal. Para o analista político e estrategista macro da XP Investimentos, Victor Scalet, o mercado reagiu negativamente à proposta de se utilizar o não pagamento de precatórios para custear um novo projeto social por dois motivos.

"O primeiro é o efeito que tem nas contas públicas. Como a despesa não será cancelada e continuará no passivo do governo, vai ser converter em déficit fiscal em algum momento", disse ao UOL. "O segundo é a sinalização negativa de que pela primeira vez a equipe econômica —representada pela presença de Guedes na coletiva - parece apoiar uma proposta que foge ao espírito original do teto de gastos, ainda que se encontre caminho formal para executá-la", completou.

Teto e ponto positivo

Para o economista-chefe do Modalmais, Alvaro Bandeira, ex-conselheiro das bolsas de São Paulo e do Rio, o mercado está sentindo cheiro de maquiagem do orçamento e tem muitas dúvidas de onde virão os recursos para bancar os programas sociais. "O líder Fernando Bezerra [MDB-PE] disse que tiveram dois comandos do presidente: não elevar a carga tributária e não furar o teto de gastos. Ocorre que vão usar recursos do Fundeb e dos precatórios. Como se sabe, o Fundeb está fora do teto de gastos e os precatórios é só adiamento de despesas. Portanto, se assemelha com maquiagens antigas", disse Bandeira.

Fontes relataram que, a partir do que o governo apresentou, identificam falta de segurança jurídica. Isso porque há entendimento de que a rolagem dos pagamentos de precatórios é uma questão controversa juridicamente. E há receio de haver resistência do Supremo Tribunal Federal. Outro gestor considerou que o "único ponto positivo" da reunião de Barros foi a indicação de que "os gatilhos do teto de gastos (restrições quanto a realização de concursos, reajustes etc) estão na PEC e serão aprovados".

FONTE: UOL