Mudança na reforma trabalhista ainda traz incertezas
Passados um pouco mais de quatro meses da entrada em vigor da reforma trabalhista, que alterou uma série de regras na relação entre empregados e empresas, ainda surge uma série de dúvidas sobre as principais mudanças. Criado como uma substituição e possibilidade da formalização do famoso “bico”, o contrato de trabalho intermitente é um dos temas que geram mais incertezas.
Umas das principais bandeiras da reforma das leis trabalhistas para a retomada dos empregos no País, o trabalho intermitente ainda não apresentou resultados significativos.
De acordo com números de janeiro do Ministério do Trabalho, das novas 77.822 vagas de trabalho formal abertas no primeiro mês do ano, 2.860 admissões foram na modalidade de trabalho intermitente.
Os especialistas e acadêmicos em Direito do Trabalho apontam que a insegurança jurídica de empresas e trabalhadores é uma das barreiras para que esse tipo de contratação não seja mais utilizado.
O contrato de trabalho intermitente tem de ser celebrado por escrito, registrado em carteira de trabalho e informar valor da hora de trabalho, afirma o professor da Fundação Santo André, doutor em Direito do Trabalho e diretor do Instituto Mundo do Trabalho, Antonio Carlos Aguiar. “O valor da remuneração deve ser equivalente, no mínimo, ao montante proporcional do valor-hora referente ao salário mínimo”.
“Não continuidade”
Outra característica deste novo contrato, segundo o professor, é a “não continuidade” da prestação de serviços. “Deve ocorrer, portanto, a alternância de períodos de trabalho. Se o trabalho for contínuo, não será possível a contratação como intermitente. O trabalhador deverá ser previamente convocado por meio de comunicação eficaz”, explica.
A advogada Cíntia Fernandes, do escritório Roberto Caldas, Mauro Menezes & Advogados, observa que o trabalho intermitente possui regras especificas de convocação do funcionário.
“O empregador deverá convocar o empregado com antecedência mínima de três dias corridos. Recebida a convocação, o empregado terá o prazo de 24 horas para responder, presumindo o silêncio como recusa. Na hipótese de ausência de convocação do empregado intermitente pelo período de um ano, contado do último dia de trabalho, ou, caso não tenha sido aceita a última convocação, o contrato rompe-se de pleno direito”, orienta.
Restrição
Todos os setores econômicos podem se valer da contratação dos trabalhadores intermitentes. “A única restrição se dá para os aeronautas, regidos por legislação própria. Os demais segmentos podem se valer do trabalhador intermitente”, revela a advogada de Direito do Trabalho, Marcella Mello Mazza, do Baraldi Mélega Advogados.
A especialistas informa também que o trabalhador intermitente pode ter mais de um contrato de trabalho. “E todos os contratos devem ser por escrito e registrados na CTPS. Se o trabalhador tiver, por exemplo, três contratantes diferentes, terá direito aos benefícios trabalhistas de todos os contratos. Isto porque durante o período de inatividade de um empregador, o empregado poderá prestar serviços de qualquer natureza a outros tomadores de serviço”, afirma Marcella Mazza.
Minimizar riscos
O professor Antonio Carlos Aguiar alerta que, por se tratar de uma mudança legislativa recente, existem entendimentos doutrinários no sentido de que esse instrumento tem como objetivo a precarização. “Portanto, há riscos jurídicos ainda. Todavia, obedecidas as regras legais e não aplicando a contratação a prestação de serviços subordinada contínua o risco diminui sensivelmente”, opina.
No entendimento da advogada Marcella Mazza, apesar do novo contrato assegurar a formalização de milhares trabalhadores, ainda é necessária cautela. “É importante que sejam observadas todas as determinações que a legislação traz para que eventuais riscos sejam minimizados, mas até que as cortes trabalhistas se manifestem sobre os parâmetros previstos em lei, ainda se recomenda cautela nessa modalidade de contratação”, diz.
Já na visão da advogada Cíntia Fernandes, o trabalho intermitente é uma relação de emprego com prestação de serviços esporádica e com limitação do salário.
“Por isso, há elementos importantes que ensejam discussões no poder judiciário, inclusive, sobre a própria legalidade e constitucionalidade dessa modalidade de emprego atípica e que, por essa razão, gera a postura de cautela adotada pelo empresariado no que diz respeito à utilização plena dessa espécie contratual no presente momento. Em suma, não se trata de uma espécie contratual segura, pois o novo artigo legal é incompatível com o próprio conceito da relação de emprego”, aponta.
Verbas rescisórias
O advogado Bruno Souza Dias, sócio do escritório Stuchi, Dias e Andorfato, destaca que o empregado intermitente tem direito à remuneração, férias proporcionais com acréscimo do terço constitucional, décimo terceiro salário proporcional, repouso semanal remunerado e demais adicionais legais.
“No entanto, existem algumas diferenças no tocante às verbas rescisórias, sendo devido ao empregado apenas metade dos valores referentes ao aviso prévio (que necessariamente será indenizado), bem como da multa indenizatória do FGTS. As demais verbas trabalhistas serão pagas em sua integralidade”.
Outra diferença, segundo Bruno Dias, reside no fato de que o empregado só poderá movimentar 80% dos valores depositados em sua conta vinculada no FGTS e que a extinção do contrato de trabalho intermitente não autoriza o empregado ingressar no seguro-desemprego.
A contribuição previdenciária e o FGTS do trabalhador intermitente serão pagos de acordo com o quanto ele recebeu no mês – caso o valor seja inferior a um salário mínimo, ele deverá complementar sua contribuição, orienta a advogada previdenciária Lariane Del Vecchio, do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.
O intermitente tem direito a todos os benefícios previdenciários: aposentadorias por idade, invalidez, tempo de contribuição, auxílio-doença, salário maternidade, reabilitação profissional e auxílio acidente. “Porém, ele deverá cumprir os requisitos de carência exigidos por lei para o gozo dos benefícios”, explica a especialista.
Para efeitos de aposentadoria, a contagem do tempo de contribuição do intermitente será realizada mensalmente, computando todas suas contribuições superiores a um salário mínimo.
“O valor da contribuição é proporcional ao valor pago a título salarial. Contudo, poderá o trabalhador intermitente completar suas contribuições para a Previdência, caso receba menos do que um salário mínimo em determinado mês. Se o trabalhador quiser que o mês de trabalho conte para fins de aposentadoria deverá completar a contribuição previdenciária pagando uma alíquota de 8% sobre a diferença entre a remuneração total recebida e o salário mínimo”, esclarece o professor Antonio Carlos Aguiar.
Fonte: Portal Previdência Total / Caio Prates