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Nos últimos quatro anos, pelo menos 60 mil empregos, boa parte de mão de obra qualificada, foram eliminados das estatísticas da indústria naval brasileira. Foi a consequência do novo declínio do setor, que havia sido revitalizado no início dos anos 2000 com a política de priorizar equipamentos nacionais na exploração e produção de petróleo. De acordo com o Sinaval, que reúne as empresas do setor, os estaleiros brasileiros empregam atualmente 25 mil trabalhadores no país. Eram 84 mil em 2014. A expectativa da entidade é que esse número seja reduzido ainda mais, para cerca de seis mil pessoas em 2020.

Para cortar custos, a Petrobras passou a buscar na Ásia, sobretudo na China, plataformas mais baratas como forma de cortar custos. Desde 2016, foram pelo menos nove unidades contratadas de estaleiros chineses. Segundo consultores, esse número tende a aumentar a curto prazo, com novas encomendas para atender à demanda da produção no pré-sal, que está crescendo. Outras empresas do setor que atuam no Brasil fazem movimentos semelhantes.

A crise no setor tende a se agravar com as novas regras que reduzem a exigência de conteúdo local na indústria do petróleo. Até meados de agosto, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) já tinha recebido 300 pedidos de alteração de regras para que as petroleiras possam fazer seus projetos contratando mais empresas no exterior.

A Petrobras informou que contratará, nos próximos anos, plataformas para os futuros sistemas de produção de petróleo “considerando propostas que sejam competitivas para a execução dos mesmos e que atendam aos requisitos de integridade exigidos pela companhia”.

O presidente do Estaleiro Atlântico Sul (EAS), em Pernambuco, Harro Ricardo Burmann, está pessimista em relação ao futuro do setor naval. O estaleiro atualmente emprega cerca de 3.500 trabalhadores na conclusão dos cinco últimos navios petroleiros encomendados pela Transpetro, dos quais três serão entregues neste ano e mais dois até meados de 2019. Sem novas encomendas, a previsão é que o estaleiro praticamente feche suas portas em meados do ano que vem.

— O que vai acontecer quando entregarmos os últimos navios? A base industrial desenvolvida em Pernambuco vai sumir. Aqui já tivemos mais de 18 mil empregos diretos — diz Burmann.

No Enseada, na Bahia, as perspectivas também não são positivas. Maurício Almeida, presidente do estaleiro, também acha difícil que o setor volte a criar oportunidades com o deslocamento das encomendas para a Ásia:

— O Brasil vai precisar de 39 plataformas nos próximos 20 anos. Será muito difícil para o Brasil competir sem uma política industrial.

De acordo com Sérgio Bacci, vice-presidente do Sinaval, a perspectiva, com a falta de novas encomendas no Brasil, é de fechamento de mais vagas no setor nos próximos anos. Como a maior parte dos empresários, ele pede nova política de incentivos:

— Se nada for feito, vamos chegar ao fim do próximo ano com 17 mil trabalhadores. Em 2020, serão apenas seis mil. É preciso ter uma política industrial de Estado de longo prazo, ou vamos perder toda a infraestrutura que foi feita e a mão de obra treinada nos últimos anos.

Maurício Canêdo, professor da Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getulio Vargas ( EPGE/FGV), avalia que repetir os incentivos que terminaram na atual crise não é o mais adequado. Para ele, o grande problema do setor naval no Brasil é que a política industrial foi baseada em reserva de mercado e subsídios. Por isso, explica, a fonte de recursos seca no primeiro momento de crise, e o setor perde as condições de continuar produzindo:

— A política precisa ser calcada na criação e aumento da competitividade. E não algo que permita a criação de novos estaleiros. Precisamos saber se o Brasil tem condições de desenvolver de fato uma indústria capaz de competir com as do exterior.

Para Magda Chambriard, ex-diretora-geral da ANP e consultora da FGV, alguns setores de infraestrutura do país não se sustentam sem uma política de Estado para crescer.

— A indústria naval brasileira, desde a década de 1970, experimentou vários momentos de apoio ao seu crescimento, mas logo foi abandonada em função de crises econômicas que ocorreram ao longo das últimas décadas. É preciso reconhecer os erros e os acertos.

Fonte: O Globo