Com vistas às eleições de 2018, os congressistas estão debruçados sobre o debate e aprovação de uma reforma política no Legislativo federal. Isto em função também do “princípio da anualidade ou anterioridade eleitoral”.
Esse princípio está expresso no artigo 16 da Constituição de 1988, para o qual “A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.” Em conformidade com a Constituição, os conceitos de segurança jurídica, de eficácia normativa e de processo eleitoral estão intimamente ligados ao princípio da anterioridade. Isto no plano legal, constitucional.
No plano político, as reformas em discussão no Legislativo têm o objetivo de diminuir ou minorar o alto grau de rejeição ao Congresso, aos seus representantes — deputados e senadores — e à política. Esse fenômeno não é novo e tampouco acontece apenas no Brasil.
É verdade que vários membros do Legislativo têm dado péssimos exemplos no tratamento da coisa pública e assim contribuem para o aumento, legislatura após legislatura, dos altos índices de rejeição aos chamados “políticos”. Trata-se, pois, de um Congresso majoritariamente liberal-conservador, o eleito em 2014, e o pior, em termos qualitativos, dos últimos 20 anos.
E, em especial, pós-impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, quando a maioria parlamentar migrou do centro político para a direita e assumiu viés neoliberal no campo econômico, com a aprovação da Emenda à Constituição 95/16, que congela os gastos públicos, em termos reais, por 20 anos. Além, é claro, de uma “reforma” trabalhista, nos termos da Lei 13.467/17, que retira direitos dos trabalhadores e enfraquece as organizações sindicais, entre outras decisões que enfraquecem o Estado, como privatizações do patrimônio público.
No “fundo do poço”, em termos éticos e morais, importantes quadros da política no Executivo e no Legislativo agora investem numa reforma política que lhes permita renovar o mandato e seguir ditando as regras do jogo político-institucional.
Para isso criaram três frentes de debates ou três comissões especiais que tratam de mudanças nas regras político-eleitorais como: sistema e financiamento público eleitoral, cláusula de barreira, fim das coligações nas eleições proporcionais, criação de federação partidária e regulamentação dessas novas regras.
Primeira frente: PEC 77/03
A proposta já está sob análise do plenário, em primeiro turno. Na sessão de quarta-feira (23), os deputados rejeitaram, por 441 votos a 1, a vinculação de 0,5% da receita corrente líquida (RCL) da União ao fundo público para campanhas eleitorais. Em valores atuais, isso equivaleria a cerca de R$ 3,6 bilhões para 2018. A matéria continuará a ser votada na próxima semana.
Nesta proposta, o centro do debate passa pela definição de um sistema para eleição de deputados e vereadores, em lugar do atual, que é proporcional.
O sistema proporcional funciona assim: para se chegar ao resultado final, aplicam-se os chamados quocientes eleitoral (QE) e partidário (QP). O quociente eleitoral é definido pela soma do número de votos válidos (= votos de legenda e votos nominais, excluindo-se os brancos e os nulos), dividida pelo número de cadeiras em disputa. Apenas partidos isolados e coligações que atingem o quociente eleitoral têm direito a alguma vaga no Parlamento.
“Distritão”
Em lugar do proporcional, a comissão especial aprovou o sistema “distritão”, para o pleito de 2018, que nada mais é que um sistema majoritário para eleições parlamentares. Ou seja, terá assento no Legislativo, por esse sistema, o candidato que receber mais votos. Da eleição de 2020 (municipal) em diante passa a vigorar o voto distrital misto. Por esse sistema o eleitor terá dois votos: 1) um no candidato do distrito; e 2) um no candidato de lista pré-ordenada pelo partido político.
O “distritão” vigora atualmente apenas no Afeganistão, na Jordânia e em alguns pequenos países insulares e é criticado por especialistas e por parte dos detentores de mandatos eletivos.
Havia também no Japão, mas o país acabou com “distritão” porque era caro e “estimulou corrupção”, com aumento de gastos de campanha, além de ter inviabilizado o debate político, disse à BBC Brasil Tokuou Konishi, professor e pesquisador do Departamento de Ciência Política e Econômicas da Universidade Meiji em Tóquio, especializado em história e atualidade política do Japão.
Segunda frente: PEC 282/16
Fim das coligações partidárias para 2018 é o que trata, entre outras alterações, a proposta aprovada na comissão especial nesta quarta-feira (23). A matéria é relatada pela deputada Shéridan (PSDB-RR). A PEC trata ainda da definição de uma cláusula de desempenho para que os partidos tenham representação no Congresso. Vai agora à discussão e votação em dois turnos no plenário. É originária do Senado — PEC 36/16. Caso o plenário chancele o texto aprovado pela comissão especial, a matéria retornará ao Senado. O presidente da Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE) disse que caso ocorram as alterações na Câmara, no retorno da proposta ao Senado vai pautar imediatamente.
É importante destacar que o sistema eleitoral aprovado na PEC 282, ainda que com cláusula de barreira, é incompatível com o “distritão”, que nada mais é que majoritário.
Pela redação aprovada no colegiado, a partir das eleições de 2030, os partidos só terão acesso ao Fundo Partidário se atingirem 3% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos nove estados, com no mínimo 2% dos votos válidos em cada um deles. Shéridan reduziu de 18 para 15 a exigência mínima de deputados eleitos distribuídos em nove estados.
Também houve diminuição no número obrigatório de deputados eleitos na transição gradual prevista para as eleições de 2018 a 2026. A nova regra é a seguinte:
- na legislatura seguinte às eleições de 2018: 1,5% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos 9 estados, com no mínimo 1% de votos válidos em cada um deles; ou pelo menos 9 deputados eleitos distribuídos em 9 estados;
- na legislatura seguinte às eleições de 2022: 2% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos 9 estados, com no mínimo 1% de votos válidos em cada um deles; ou pelo menos 11 deputados eleitos distribuídos em 9 estados; e
- na legislatura seguinte às eleições de 2026: 2,5% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos 9 estados, com no mínimo 1,5% dos votos válidos em cada um deles; ou pelo menos 13 deputados eleitos distribuídos em 9 estados.
Regulamentação
A comissão especial que analisou e aprovou a PEC 77/03 analisa agora a regulamentação da reforma política. Ou seja, trata da análise e votação das regras que serão definidas por projeto de lei. O relator é o deputado Vicente Cândido (PT-SP).
Antes mesmo de concluída a votação das alterações constitucionais, a comissão encerrou a discussão do relatório do deputado Vicente Cândido (PT-SP) que, entre outros pontos, regulamenta a distribuição dos recursos do Fundo Especial de Financiamento da Democracia e o “distritão”, sistema de voto majoritário para deputados federais e estaduais, em 2018, e vereadores, em 2020.
FONTE:DIAP