Os resultados obtidos pelos sindicatos brasileiros na tentativa de preservar empregos e manter o poder de compra dos trabalhadores na atual recessão indicam que as entidades têm força para negociar acordos vantajosos para quem representam.
Se a reforma trabalhista em debate no Congresso for aprovada, o que for definido nesses acordos em relação a jornada, banco de horas e intervalo para almoço, entre outros questões, poderá divergir ou se sobrepor à legislação.
A mudança tem o apoio da Força Sindical e da UGT (União Geral dos Trabalhadores), segunda e terceira maiores centrais do país. A maior delas, a CUT (Central Única dos Trabalhadores), defende o fortalecimento das negociações, mas não nos termos previstos no projeto em debate.
Críticos da proposta dizem que esses acordos trarão mais perdas do que ganhos aos trabalhadores, diante da fraqueza dos sindicatos –agravada pelo fim do imposto sindical, também previsto na reforma.
Mas as negociações salariais feitas em 2016, em meio à recessão mais profunda da história, indicam que a maior parte dos sindicatos conseguiu reajustes que ao menos repusessem a inflação.
De acordo com o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), a proporção de acordos que resultaram em perdas reais no ano passado ficou pouco cima de um terço do total (36,7%).
Categorias mais organizadas, como os metalúrgicos, evitaram demissões em massa. Após protestos e ameaça de greve pelo sindicato, a Mercedes-Benz concordou em oferecer R$ 100 mil como indenização em um programa de demissão voluntária, em vez de cortar 2.000 funcionários.
"Nossa capacidade de resistir a essa onda é razoável", diz Rafael Marques, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, ligado à CUT. "A depender do resultado final da reforma, acho que os sindicatos precisam criar um método, uma estrutura que dê condição de dialogar com o mesmo discurso e a mesma pauta no Brasil inteiro."
Para Miguel Torres, vice-presidente da Força Sindical e presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, a reforma como está afeta principalmente os sindicatos menores, cujo poder de barganha seria menor. "Não somos contra negociação, mas precisa ter equilíbrio", afirma.
DESEQUILÍBRIO
O Brasil tem cerca de 18 mil trabalhadores filiados a 11 mil sindicatos. Na média, cada entidade tem 1.600 filiados, número que equivale a um sétimo do total de trabalhadores da categoria que representam, de acordo com estudo do sociólogo André Gambier Campos, do Ipea.
"Mesmo considerando que tal sindicato representa e age em nome de todos os trabalhadores de sua base e não apenas daqueles que são filiados, há preocupações óbvias sobre a representação e a ação que pode ser assegurada", escreve o pesquisador.
Um maneira de garantir maior simetria seria permitir que pontos mais sensíveis, como jornada, pudessem ser negociados apenas em um contrato a nível nacional por categoria, sugere Torres. Já questões mais simples
–transporte, por exemplo– poderiam ser definidas por entidades de menor porte.
ACORDOS COLETIVOS
Pode negociar
> Organização da jornada de trabalho
> Banco de horas individual
> Intervalo intrajornada
> Plano de cargos, salários e funções
> Regulamento empresarial
> Representante dos trabalhadores no local de trabalho
> Teletrabalho, regime de sobreaviso e trabalho intermitente
> Remuneração por produtividade, gorjetas e remuneração por desempenho individual
> Modalidade de registro de jornada de trabalho
> Troca do dia de feriado
> Enquadramento do grau de insalubridade
> Prorrogação de jornada em ambientes insalubres sem licença prévia do Ministério do Trabalho
> Prêmios de incentivo em bens ou serviços
> Participação nos lucros ou resultados da empresa
Não pode negociar
> Normas de identificação profissional e anotações na Carteira de Trabalho
> Direito a seguro-desemprego
> Salário-mínimo
> Remuneração adicional do trabalho noturno
> Valor nominal do décimo terceiro salário
> Repouso semanal remunerado
> Remuneração do serviço extraordinário superior à do normal em no mínimo 50%
> Número de dias de férias devido ao empregado
> Gozo de férias anuais remuneradas
> Licença-maternidade com a duração mínima de 120 dias e licença-paternidade
> Aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, com mínimo de 30 dias
> Normas de saúde, higiene e segurança do trabalho
> Adicional de remuneração para atividades insalubres, penosas ou perigosas
> Seguro contra acidentes de trabalho
> Restrições ao trabalho de crianças e adolescentes
> Igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso
> Liberdade de associação profissional ou sindical do trabalhador
> Direito de greve
Fonte: Folha de S. Paulo