O governo está fazendo das tripas coração para impulsionar a economia. Abriu o baú das contas inativas do FGTS permitindo o saque desse dinheiro aprisionado e tão mal remunerado. Cerca de R$ 40 bilhões serão injetados na economia até que a janela de oportunidade seja fechada, no próximo dia 31. Quem deixar de sacar por algum bom motivo só poderá fazê-lo de acordo com as pouco flexíveis regras vigentes.
Além de liberar o saldo das contas inativas, o governo aumentou para R$ 1,5 milhão o valor máximo dos imóveis que podem ser comprados com recursos do FGTS. Essa medida vale para a aquisição de imóveis residenciais novos, em todas as regiões do país, mas é temporária, com vigência prevista até dezembro de 2017. Mais perto do fim do ano o governo vai decidir se mantém ou descarta essa política.
De repente, no meio de tantas medidas positivas para a sociedade, eis que surge uma ideia tosca, já engavetada, na contramão de tudo o que tem sido feito. Um confisco duplo, dois direitos desrespeitados, que não apenas impediria o trabalhador demitido de sacar imediatamente o saldo do FGTS como deixaria de receber o seguro-desemprego nos primeiros meses após a demissão.
Difícil acreditar que essa ideia esdrúxula tenha saído das mesmas cabeças que pensaram e aprovaram medidas inteligentes que beneficiam tanto a economia quanto a sociedade. É tão ruim que não deveria ter sido engavetada. Deve ser destruída.
Se a caixinha de ideias se esgotou, quero apresentar uma que certamente beneficiaria a classe média, a indústria da construção civil e o mercado imobiliário em geral: permitir que o saldo das contas ativas ou inativas seja utilizado para a aquisição do segundo imóvel.
As condições atuais, impostas ao comprador, determinam que: 1) o imóvel seja residencial urbano, destinado à moradia do titular; 2) não possua outro financiamento ativo no Sistema Financeiro de Habitação; 3) não seja proprietário, usufrutuário ou cessionário de outro imóvel residencial urbano, no município onde reside ou trabalha.
Proponho revisitar algumas das atuais regras do que "não pode" ser feito para usar o FGTS: 1) reformar ou aumentar o imóvel; 2) comprar terrenos sem construção ao mesmo tempo; 3) comprar material de construção; 4) comprar imóvel residencial para familiares.
Essas restrições impedem, por exemplo, que pais ou avós, já proprietários de imóveis, comprem um segundo imóvel para destinar a filhos ou netos. Ou, ainda, que comprem um segundo imóvel com o objetivo de gerar renda para complementar o orçamento familiar mediante locação para terceiros.
A necessidade de recursos próprios para a aquisição do segundo imóvel limita ou impede essa aquisição. E o saldo do FGTS fica lá, mofando, recebendo remuneração pífia de 3% ao ano, perdendo poder de compra perante a elevação dos preços corroídos pela inflação.
Uma medida como essa, mesmo que temporária, traria frescor e liberdade ao mercado imobiliário. Para ampliar seu impacto positivo, a medida poderia permitir que o segundo imóvel fosse novo ou usado.
Bom para o cidadão, que faz investimento em ativo real, bom para a indústria da construção civil, bom para o sistema financeiro, que cumpre o seu papel de financiar aquisição de bens e serviços, e para a economia, que certamente será impulsionada por mais essa medida.
Breve retrospectiva do conceito do FGTS, criado há 50 anos:
» É uma espécie de poupança aberta pela empresa em nome do trabalhador com carteira de trabalho assinada para protegê-lo em caso de demissão sem justa causa.
 
» O custo é 100% do empregador, que recolhe, na maioria dos casos, 8% do salário. Nada é descontado do empregado.
 
» A ideia é que, ao fim de um ano, os depósitos remunerados sejam equivalentes a um salário bruto, ou seja, uma poupança de um salário por ano trabalhado.
 
» O saldo do FGTS pertence exclusivamente ao trabalhador e, em algumas situações especiais, pode ser sacado sem que o trabalhador tenha deixado o emprego: aquisição da casa própria, aposentadoria, doenças graves.
O FGTS é do trabalhador e ninguém tasca!

Fonte: Folha de S. Paulo