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Medida perde validade nesta 2ª feira. Era tentativa de corrigir falhas no texto.
 
Para ser convertida em lei, a Medida Provisória 808/2017, que corrige erros e imprecisões da Lei 13.467/2017, conhecida como “Reforma Trabalhista”, precisa ser aprovada até 23 de abril, conforme prazo estipulado na Constituição.
Assinalando que não haverá esforço para votar a MP 808, que está prestes a caducar, o presidente da Câmara dos Deputados empregou uma desdenhosa frase: “Se caducar, caducou”.
A exposição de Motivos da MP 808, que altera pontos fundamentais da “Reforma Trabalhista” –Lei 13.467/2017–, foi assinada pelo ministro do Trabalho em 9 de novembro de 2017, precisamente dois dias antes do início da eficácia da “Reforma”.
A MP, é de se supor, foi adotada pela Presidência da República observando os requisitos constitucionais da relevância e da urgência. No caso, pesou a relevância de corrigir os equívocos da lei e a impossibilidade de se esperar o tempo do processo legislativo ordinário, às vésperas do início da eficácia da “moderna” legislação trabalhista.
O Poder Executivo acautelou-se. Assim, dentre outras disposições essenciais alterou regras que dispunham sobre: a prorrogação da jornada em atividades insalubres; o trabalho de gestantes e lactantes nessas atividades; a remuneração; a jornada 12 x 36 horas; o trabalho intermitente; os parâmetros para o arbitramento de indenizações; a caracterização do autônomo; o espaço de atuação da representação dos empregados.
Também fez incluir a determinação de que as alterações das regras da “Reforma Trabalhista” seriam aplicáveis aos contratos de trabalho vigentes de sua entrada em vigor.
Esses registros são importantes, pois representam a percepção que o Poder Executivo tem da precariedade do conjunto da obra, na condição de autor, defensor e patrocinador da suposta modernização legislativa –inclusive por meio de propaganda paga e com amplo apoio de entidades empresariais.
Ou seja, percebendo que patrocinara algo irrefletido e tecnicamente precário, que tramitou de forma açodada no Legislativo, apressou-se para impedir ou amenizar o desarranjo e a insegurança jurídica nas relações de trabalho.
A propósito, a “segurança jurídica no mercado de trabalho” foi um dos motes da campanha midiática que embalou a “Reforma”. A Lei 13.467/2017, cujo projeto teve origem no Poder Executivo, foi propagandeada como sendo um marco legal claro, necessário para atualizar e modernizar as relações trabalhistas, eliminando a “insegurança jurídica” que atrapalharia o ambiente de negócios e a criação de empregos.
As incorreções e os anacronismos da “moderna” lei trabalhista, diga-se, foram apontadas pelo MPT (Ministério Público do Trabalho) e por aqueles que observavam a questão de forma responsável desde o nascedouro da iniciativa “modernizadora”.
Na tramitação legislativa, senadores já haviam identificado falhas. Apontaram a necessidade de: corrigir e regulamentar a abrangência do contrato intermitente; restringir a jornada de 12×36 ao disposto em negociação coletiva; exigir a participação sindical nas negociações coletivas, esclarecer o campo de atuação da comissão de representantes dos empregados; restringir o trabalho de gestantes e lactantes em locais insalubres; restabelecer restrições à prorrogação de jornada em ambientes insalubres; explicitar os bens tutelados e afastar a vinculação ao salário para a apuração do montante de condenações a título de danos morais; coibir abusos reiterados por parte dos empregadores; vedar as cláusulas de exclusividade nos contratos de trabalhador autônomo.
Entretanto, lamentavelmente, o Senado deixou de exercer a função constitucional de Casa Revisora. Ao invés disso, lideranças apressaram-se em construir um esdrúxulo e frágil acordo com o Poder Executivo. A responsabilidade pelas correções e ajustes necessários foi transferida para a fase posterior do processo, em que há ampla discricionariedade da Presidência da República.
Além disso, numa injustificável omissão na sua responsabilidade no processo legislativo, o Senado fez uso de uma extravagante e ingênua “recomendação” ao Poder Executivo. Sugeriu que fosse estudado um modelo gradual de extinção da contribuição sindical, de forma a garantir o planejamento financeiro e o funcionamento dos sindicatos.
Como sabemos, não foi cumprido o acordo anunciado pela liderança do Governo no Senado Federal. Não houve o prometido veto presidencial na fase de sanção da Lei. E assim foi aprovada uma lei de importância fundamental para os brasileiros que empregam ou vivem  do trabalho.
A lei sancionada, sabidamente, continha inconsistências e inconstitucionalidades identificadas no Senado, conforme apontado em Nota Técnica do MPT.
No mérito, a “Reforma” é mais uma demonstração de que o Brasil, que anseia libertar-se das marcas escravocratas e colonialistas, segue pautado por interesses que desprezam o objetivo constitucional de construção de uma sociedade dirigida para a erradicação da pobreza e da marginalização, orientado para a redução das desigualdades.
De modo inusitado, coube ao Executivo, autor da sofrível proposição convertida em lei, indicar as inadequações consideradas mais graves e propor correções a tempo de impedir desastrosas consequências. Na MP 808 essa distorção das disposições legislativas da “Reforma” é confessada expressamente, ao ser indicada a urgência e a relevância do conjunto das medidas apresentadas “a partir da necessidade de conferir segurança jurídica e dar clareza a dispositivos da modernização da legislação trabalhista”.
A Medida Provisória 808, agora condenada a “caducar”, não alteraria a essência da “Reforma” que é fruto de uma lógica perversa, desafiando abertamente princípios fundamentais previstos em nossa Constituição e reverenciados em sociedades civilizadas.
Todavia, ao “caducar” a MP 808 dá mais força a um emaranhado de dispositivos de sofrível redação que, além de anacrônicos, obscuros e contraditórios, são incompatíveis com a Constituição e com normas internacionais ratificadas pelo Brasil.
A inconsequência dos atores envolvidos no processo legislativo deve “endoidecer” as relações trabalhistas, lançadas numa dantesca arena de controvérsias, pouco moderna, que muito se afasta da alardeada e desejada segurança jurídica.

Ronaldo Curado Fleury, 52 anos, é procurador-geral do Trabalho. Entrou no Ministério Público do Trabalho em 1993.
Leomar Daroncho, 52 anos, é procurador do Trabalho e diretor-geral do MPT. Ingressou no Ministério Público do Trabalho em 2012.

Fonte: Poder 360 / Ronaldo Curado Fleury e Leomar Daroncho