Agentes do setor naval estudam alternativas para reestruturação do atual modelo de garantias exigido em financiamentos do Fundo da Marinha Mercante (FMM). A diretora do conselho diretor do FMM, Karênina Dian, afirmou que muitos projetos não são contratados porque os postulantes ao crédito têm dificuldades de cumprir as atuais exigências junto aos bancos repassadores. Na cabotagem, por exemplo, hoje existem oito embarcações aprovadas e não contratadas que totalizam em torno de R$ 5 bilhões em potenciais investimentos. “É um problema real, que estamos tentando atacar”, comentou a diretora do FMM, Karênina Dian, durante o seminário “O Futuro da Indústria Naval”, promovido pelo jornal Valor Econômico na última segunda-feira (27), no Rio de Janeiro.
O fundo articula com a Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias (ABGF) a criação de condições para facilitar a obtenção de garantia. A parceria da ABGF com o FMM tem como objetivo satisfazer projetos hoje no pipeline da indústria naval, o que demandaria adicionar capacidade ao fundo. A ABGF é uma empresa pública, sob a forma de sociedade anônima, criada em 2013, e com a finalidade de administrar fundos garantidores e prestar garantias às operações de riscos diluídos em áreas de interesse econômico e social. Desde setembro de 2016, a ABGF está vinculada ao Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão.
O diretor-presidente da agência, Guilherme Estrada, disse que o mercado privado de financiamentos pode ser desenvolvido a partir do fornecimento de garantias que tornem as operações financeiras factíveis e com custo razoável. Estrada contou que existe um modelo de garantia já desenhado e que a ABGF já foi procurada por alguns estaleiros interessados. Já foram estruturadas duas garantias, sendo uma contra o risco de performance de estaleiros e outra contra risco de crédito dirigida aos agentes financiadoras. O produto, segundo ele, está em fase final de aprovação junto do Ministério da Fazenda e a ABGF já olha para sete projetos que envolvem um total de sete embarcações. “Estamos prontos a conversar com armadores, estaleiros e bancos públicos e privados sobre a estrutura de garantias no Brasil”, adiantou.
Nos últimos 10 anos, o FMM financiou cerca de R$ 10 bilhões em embarcações para cabotagem, com mais de 20 embarcações entregues, segundo dados do Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil (MTPA). De acordo com a Associação Brasileira dos Armadores de Cabotagem (Abac), 22 novas embarcações foram incorporadas à frota que opera no Brasil nesse período. No entanto, apenas quatro foram construídas no país e outras três que estavam previstas não foram entregues pelo estaleiro construtor. O presidente da Abac, Cleber Lucas, citou que houve sobrepreço de 100% na construção de porta-contêineres, com navios que custam US$ 50 milhões no mercado internacional e foram construídas por US$ 100 milhões no Brasil.
A Abac confirma que os armadores possuem demanda de pelo menos oito novos navios de cabotagem, mas ressalta que as empresas precisam de segurança jurídica e garantias mais efetivas de que receberão as embarcações, caso sejam construídas em estaleiros nacionais. Os armadores alegam que ao negociar com os agentes financeiros correm riscos desde quando o contrato é firmado com os estaleiros. “Se viabilizarmos a divisão de riscos com o estaleiro, encontraremos uma forma para destravar o potencial para cabotagem encomendar embarcações no Brasil”, defendeu Lucas. As empresas de navegação afirmam que o modelo atual praticamente retira o armador do jogo. A Abac ressalta que o histórico recente da cabotagem, com poucas exceções, não tem sido favorável à construção de boas embarcações em estaleiros nacionais. “Precisamos que prazo e custo sejam compartilhados com quem nos oferece a embarcação. Queremos a equação para equilibrar melhor os riscos e para colocar mais pedidos”, completou.
O vice-presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima (Syndarma) e da Abac, Mark Juzwiak, acrescentou que na renovação da frota que ocorreu entre 2003 e 2015 os estaleiros nacionais estavam com muitas encomendas, principalmente da Petrobras. “Os armadores compraram da China porque precisavam renovar a frota. Não podiam esperar até 2019 ou 2020 para ter os navios”, afirmou. Ele disse ainda que, para demanda atual, as empresas voltaram a conversar com estaleiros para ver as possibilidades e riscos de construir no Brasil.
O conselho do FMM também tenta a modernização da lei existente, abrindo esse mercado para empresas estrangeiras no sentido de conseguir financiamento na marinha mercante para construir no Brasil e poder levar embarcações para fora, com geração de empregos em estaleiros brasileiros. Outra frente busca permitir que empresas com navios afretados possam fazer docagens e reparos no Brasil usando recursos do FMM. A proposta de medida provisória está no MTPA.
AFRMM — Outro problema admitido pelo FMM nos últimos anos é a falta de regularidade nos repasses de recursos do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM). A diretora do FMM revelou que esse instrumento está perto de se tornar um procedimento automático. Segundo Karênina, a Receita Federal já desenvolveu o sistema e falta apenas um acerto para que esse processo rode automaticamente, o que o tornaria a injeção de recursos seja mais rápida. “O sistema está em fase de testes, já rodamos a primeira vez e falta um acerto para conseguirmos fazer com que ele rode automaticamente”, contou. Nos últimos oito anos foram injetados cerca de R$ 600 milhões nas contas vinculadas, que são destinadas à cabotagem para renovação de frota e reparo.
FONTE:PORTOS&NAVIOS