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O FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) foi criado em 1966, com vistas a substituir, progressivamente, a garantia de estabilidade no emprego prevista na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). Embora esse não tivesse o papel de, efetivamente, substituir o seguro desemprego, de forma a assegurar renda ao trabalhador nessa situação, dado que o direito por meio desse seria proporcional ao tempo de serviço, com depósitos em conta vinculada correspondentes a 8% da remuneração, assegurada a correção monetária e capitalização com juros de 3% ao ano. Sua concepção revelava, na época, que a cada ano de serviço, o trabalhador faria jus ao valor correspondente a aproximadamente 1 mês da sua remuneração (8% por mês, durante 13 meses por ano).

Até 1989, a gestão dos recursos se dava de forma pulverizada: cada trabalhador tinha uma conta vinculada operada por instituição financeira distinta, e podia, em caso de mudança de emprego, transferir sua conta vinculada para estabelecimento bancário de escolha do novo empregador.

Essa situação alterou-se em 12 de outubro de 1989, com a vigência da Lei 7.839, que no artigo 3º previu que a gestão do FGTS seria efetuada pela Caixa, segundo normas gerais e planejamento elaborados por Conselho Curador, integrado por 3 representantes dos trabalhadores e 3 representantes dos empregadores, além de 1 representante de cada uma das seguintes entidades: ministério da Fazenda, do Interior, do Trabalho, Secretaria de Planejamento e Coordenação da Presidência da República, Caixa Econômica Federal e Banco Central do Brasil.

Agente operador


No entanto, em 1990, a Lei 8.036, de 11 de maio, deu novo tratamento ao assunto, transferindo a gestão do FGTS para o então Ministério da Ação Social, e estabeleceu a responsabilidade da Caixa como agente operador do FGTS.

A partir de então, deu-se a centralização de todas as contas do FGTS na Caixa, envolvendo mais de 50 milhões de contas que se achavam dispersas em 78 instituições financeiras. A lei previu, porém, que os demais estabelecimentos bancários, passariam à condição de agentes recebedores e pagadores do FGTS, mediante recebimento de tarifa, a ser fixada pelo Conselho Curador.

A centralização trouxe inúmeros benefícios tanto para os trabalhadores quanto para os empregadores e para a sociedade. Além de viabilizar medidas de controle sobre os saldos das contas vinculadas, evitando perdas para os trabalhadores decorrentes da dispersão de controles e de sua contabilização, e facilitando o próprio acompanhamento pelo trabalhador de seus saldos, assim como o seu resgate, aumentou a transparência da gestão do Fundo, e reduziu as dificuldades para que as empresas cumprissem suas obrigações tanto de recolher quanto de controlar os valores recolhidos, por meio da integração dos processos de cálculo e depósito numa única instituição dos valores devidos.

Para o governo, essa centralização resultou multiplamente benéfica, facilitando a aplicação de recursos do Fundo nas políticas legalmente definidas e saneamento, assim como o controle e fiscalização da regularidade dos recolhimentos.

Patrimônio acumulado
Em 20191, a arrecadação do FGTS totalizou R$ 150,9 bilhões, dos quais R$ 9,92 bilhões foram incorporados como arrecadação líquida (depósitos menos saques) totalizando patrimônio acumulado, em dezembro de 2019, da ordem de cerca de R$ 530 bilhões. No mesmo ano, o FGTS injetou na economia cerca de R$ 162 bilhões. Trata-se, portanto, de volume de recursos significativos, que tem grande impacto em políticas essenciais e investimentos em infraestrutura.

O patrimônio do FGTS é superavitário. Em fins de 2019, o ativo do Fundo era de R$ 530 bilhões, contra um passivo de R$ 414 bilhões, totalizando patrimônio líquido de R$ 116 bilhões.

Nos termos da legislação em vigor, os recursos do FGTS deverão ser aplicados em habitação, em saneamento básico, em infraestrutura urbana e em operações de crédito destinadas às entidades hospitalares filantrópicas, bem como a instituições que atuam no campo para pessoas com deficiência, e sem fins lucrativos, que participem de forma complementar ao SUS, desde que as disponibilidades financeiras sejam mantidas em volume que satisfaça as condições de liquidez e de remuneração mínima necessária à preservação do poder aquisitivo da moeda, observadas as seguintes proporções: 1) no mínimo, 60% para investimentos em habitação popular; e 2) 5% para operações de crédito destinadas às entidades hospitalares filantrópicas, bem como a instituições que atuam no campo para pessoas com deficiência, e sem fins lucrativos que participem de forma complementar ao SUS.

No entanto, há problemas ainda pendentes de solução. O rendimento dos trabalhadores pelos depósitos em suas contas vinculadas é inferior ao da caderneta de poupança e outras aplicações financeiras, o que gera, assim, perda de valor para o trabalhador. Há, ainda, anualmente, conforme o disposto no artigo 13, § 5º da Lei 8.036, com a redação dada pela Lei 13.446, de 2017, a distribuição de parte do resultado positivo auferido pelo FGTS, mediante crédito nas contas vinculadas de titularidade dos trabalhadores, de forma proporcional ao saldo existente em 31 de dezembro do ano anterior, da ordem de 50% do resultado do exercício.

Parte desse problema apontado poderia ter sido resolvido em 2019, quando o governo federal enviou a MP (Medida Provisória) 889, que ampliava a distribuição para 100% dos lucros ao trabalhador como rendimento, mas após sua tramitação no Congresso Nacional, o Planalto declinou e vetou a mudança na sanção presidencial. Se manteve, na proposta convertida em lei viés fiscalista para a gestão do FGTS, além da possiblidade de novas modalidades de saques excepcionais para contas inativas e de aniversário.

No Congresso Nacional, onde cabe aperfeiçoamento da legislação, tramitam várias outras propostas que vão além desses assuntos, no qual destacamos 5 dessas, que devem ser avaliadas pelos seus impactos para implementação de políticas públicas, principalmente, na dimensão pública e coletiva para uso desses recursos importantíssimos para economia como importante mecanismo para investimento, geração de emprego e distribuição de renda.

PL 6.223/16, do deputado Fausto Pinato (PP-SP), equipara a remuneração dos saldos das contas vinculadas do FGTS e dos depósitos nessas contas à remuneração dos depósitos de poupança e dá outras providências. Atualmente tramita de forma conclusiva nas comissões de Trabalho, de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça, depois segue para o Senado. No Trabalho, está sob a relatoria do deputado Sanderson (PSL-RS), com parecer pela aprovação na forma de substitutivo, que trata:

• busca de alternativa a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 5090, ajuizada no STF (Supremo Tribunal Federal) pelo Solidariedade, na qual se defende que o uso da TR para correção do saldo das contas individuais do FGTS;

• estabelece novas regras de remuneração do saldo disponível nas contas individuais do FGTS;

• promove mudanças na Lei 8.036, de 1990, atinentes às hipóteses de movimentação do saldo da conta vinculada para permitir o saque não apenas em caso de doença grave terminal, mas também por motivo de acidente. E acrescenta novo inciso ao artigo 20 da Lei 8.036, de 1990, permitindo ao trabalhador aplicar parte dos recursos do FGTS no Tesouro Direto; e

• extingue o FI-FGTS (Fundo de Investimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), criado pela Lei 11.491, de 20 de junho de 2017.

PL 4.597/16, do deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), dispõe sobre a possibilidade de o microempresário, o pequeno empresário, o MEI (microempreendedor individual) e o empregador pessoa física depositarem mensalmente no FGTS, o valor relativo à multa por dispensa sem justa causa do empregado. Atualmente tramita de forma conclusiva nas comissões de Trabalho, de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça, depois segue para o Senado. No Trabalho, está sob a relatoria do deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), onde aguarda parecer para votação.

A proposta permite que o microempresário, o pequeno empresário e o MEI depositem mensalmente no FGTS valor relativo à multa por dispensa sem justa causa do empregado. Pela proposta, o valor do depósito é de 3,2% sobre a remuneração devida.

Este valor é o previsto na Lei Complementar 150/15, que regulamentou o direito ao FGTS pelos empregados domésticos. A lei determina que o empregador doméstico deposite mensalmente o valor equivalente à multa por dispensa sem justa causa na conta vinculada do trabalhador no FGTS.

Há ainda o PL 2.751/20, dos deputados Lucas Gonzalez (Novo-MG), Alexis Fonteyne (Novo-SP), que altera a Lei 8.036, de 11 de maio de 1990, para dispor sobre o pagamento do FGTS durante o período pós-pandemia do coronavírus. Atualmente tramita de forma conclusiva nas comissões de Trabalho, de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça, depois segue para o Senado.

No Trabalho, está sob a relatoria do deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), tem parecer pela aprovação na forma de substitutivo:

• a proposta permite negociar coletivamente a redução da contribuição para o FGTS, convertendo parte dessa em salário. Esse projeto reduz a capacidade de financiamento do FGTS. Se aprovado, os empregadores terão toda a vantagem em barganhar o reajuste de data base usando a redução do FGTS como margem negocial;

• após o término da calamidade pública, instituída pelo decreto 6/20, empregado e empregador poderão, mediante acordo individual, e, prevendo também coletivo, estabelecer as regras de pagamento do FGTS, de que trata o artigo 15 da Lei 8.036/90;

• ficam autorizados os empregadores e empregados a acordarem, de acordo com os termos citados no artigo 1º, desde que observados os seguintes requisitos: 1) o empregado receba até 4 salários mínimos; 2) que seja preservado do salário base do empregado; e 3) acordo individual seja pactuado por escrito entre empregador e empregado, que será encaminhado ao empregado com antecedência de, no mínimo, 2 dias corridos.

• o acordo poderá ser formulado nos seguintes termos: 1) 4% serão pagos mensalmente ao empregado, juntamente com seu salário e 4% serão depositados na conta destinada para este fim; 2) além do acordo individual, o disposto no caput deste artigo poderá ocorrer mediante acordo coletivo; 3) os acordos terão vigência de até 180 dias contados a partir do término do estado de calamidade.

PL 2.995/20, do deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL-SP), altera a Lei 8.036, de 11 de maio de 1990, para permitir a atuação de instituições financeiras como agentes operadores do FGTS.

Atualmente tramita de forma conclusiva nas comissões de Trabalho, de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça, depois segue para o Senado. No Trabalho, está sob a relatoria do deputado Sanderson (PSL-RS), onde aguarda parecer.

Em linhas gerais, a proposta acaba com o monopólio e a centralidade na Caixa para gestão do FGTS ao permitir a atuação de instituições financeiras como agentes operadores do FGTS.

Por fim, o PLS 392/16, da senadora Rose de Freitas (MDB-ES), altera o inciso I do artigo 20 da Lei 8.036, de 11 de maio de 1990, para permitir a movimentação da conta vinculada do trabalhador no FGTS na hipótese de pedido de demissão.

A proposta teve parecer do relator, senador Paulo Paim (PT-RS), com voto favorável aprovado na Comissão de Assuntos Sociais. Por tramitar de forma terminativa, foi apresentado recurso e a matéria também deve ser apreciada no plenário do Senado. No plenário, aguarda designação de relator para votação. Ainda deve seguir para exame na Câmara dos Deputados.

Assim, a partir deste exame histórico, do presente, e com as propostas que trazem mudanças futuras para o FGTS, será necessário postura propositiva para acompanhar e aprimorar estas propostas em curso no Congresso Nacional como forma de garantir que esses recursos aportados pela iniciativa privada e administrados pelo Poder Público beneficiem de forma coletiva os trabalhadores e a sociedade.

Neuriberg Dias*

(*) Bacharel em Administração, analista político, assessor técnico licenciado do Diap e sócio-diretor da Contatos Assessoria Política.

FONTE: DIAP