Criança em lixão usando camiseta da seleção brasileira, trabalho infantil no Brasil, dia 11/jun/2014

(Omar Havana/Getty Images)

 

Campanha terá início nesta segunda-feira e prevê eventos até 12 de junho do próximo ano. 2021 será ano dedicado ao tema da erradicação do trabalho infantil

“Pela Visibilidade, Conscientização e pelo Fim do Trabalho Infantil” é o nome da campanha que a CUT inicia nesta segunda-feira (12), dia das crianças. Em parceria com o Sindicato Nacional de Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE), a campanha irá até 12 de junho do próximo ano, porque se integra à mobilização internacional que fará de 2021 o Ano Internacional pela Erradicação do Trabalho Infantil.

Nesta segunda, uma live “Trabalho Infantil, um problema de todos nós” será transmitida pela página do Facebook da CUT a partir das 16 horas e um tuitaço com a hashtag #TrabalhoInfantilEuCombato será realizado a partir das 10 horas.

Motivos para a mobilização não faltam: o trabalho infantil ainda é uma triste realidade, no Brasil e em outros países, e com a pandemia do novo coronavírus, segundo o entidades internacionais, a exploração do trabalho infantil pode ser ainda maior. 

 Nos últimos 12 anos no Brasil, o trabalho infantil provocou 46.507 acidentes de trabalho, segundo dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação do Ministério da Saúde (Sinan).

Entre 2007 e 2019, dos 27.924 acidentes graves ocorridos com crianças e adolescentes, 10.338 atingiram a mão, causando 705 amputações traumáticas notificadas. Foram 15.147 acidentes com animais peçonhentos e pelo menos 3.176 casos registrados de intoxicação por agrotóxicos, produtos químicos e outros.

Um estudo recente da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe ou Comissão Económica para a América Latina e Caraíbas (Cepal) alerta que os impactos da pandemia podem obrigar mais de 300.000 meninos, meninas e adolescentes a trabalhar na região da América Latina e do Caribe, somando-se aos 10,5 milhões atualmente em situação de trabalho infantil.

A Nota Técnica da Cepal e da OIT diz que “o aumento do desemprego e da pobreza afetará severamente o bem-estar das famílias, particularmente aquelas em condições de extrema pobreza que costumam viver em moradias inadequadas”.

Segundo a secretária Nacional de Políticas Sociais e Direitos Humanos na CUT, Jandyra Uehara, em 1906, no primeiro Congresso operário do Brasil, entre as reivindicações estavam a proibição do trabalho infantil nas fábricas e 124 anos depois “nós temos um governo, que além de destruir empregos, direitos e a soberania nacional, faz uma vergonhosa e perversa defesa do trabalho infantil”.

Jandyra ressalta que o governo Bolsonaro oculta informações, não divulga dados sobre o tema e enfraquece a fiscalização, quando é visível que a crise econômica na pandemia agravou a situação.

“O trabalho infantil é um caminho para a perpetuação das desigualdades sociais e atinge principalmente as crianças e adolescentes negras e negros. Essa campanha, além de dar visibilidade e combate a essa perversidade naturalizada pelo capitalismo, quer também colocar os sindicatos CUTistas na defesa dos direitos dos filhos e filhas da classe trabalhadora, tornando- os um polo de combate e articulação pelo fim do trabalho infantil”, afirmou a dirigente.

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2016, no Brasil, de um total de 40,1 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos, 1,8 milhão estava no mercado de trabalho.

Desse número, 47,6% das pessoas de 5 a 13 anos de idade exerciam atividade agrícola, enquanto 21,4% das pertencentes ao grupo de 14 a 17 anos de idade encontravam-se ocupadas nesse tipo de serviço.

Para a secretária Nacional da Juventude da CUT, Cristiana Paiva, que é agricultora familiar em Roraima, este é um tema importante de se discutir no campo, porque a agricultura patronal ainda usa criança para manter seus lucros, diferentemente da agricultura familiar que é uma filosofia de vida.

Segundo ela, o movimento sindical precisa fazer sua parte no sentido de fortalecer a luta contra o trabalho infantil e contra qualquer tipo de retrocesso no país na questão de proteção à crianças e adolescentes.

“Nos governos Lula e Dilma a gente já vinha trabalhando esta questão e chegou a cair 81% o número de crianças trabalhando. Mas, neste cenário de crise, pandemia e de governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL), em que a fome e desemprego crescem, a gente pode viver muito mais disso, inclusive com crianças e adolescentes indo para prostituição e drogas. A gente precisa trabalhar em nossas bases a erradicação do trabalho infantil para salvar vidas, e esta campanha será muito importante para isso”, finaliza a dirigente.

Trabalhos domésticos e os mais atingidos

Segundo a Secretária Executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), Isa Oliveira, além do trabalho infantil no campo, há também muitas crianças e adolescentes vendendo produtos nos semáforos, nos serviços de coleta de lixo e devido ao fechamento das escolas durante a pandemia houve aumento do trabalho infantil doméstico.

Ela também disse que as crianças e adolescentes mais afetados são de famílias mais vulneráveis, negros e negras e de regiões mais pobres.

De acordo com pesquisa da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Trabalho Escravo Rural no Brasil, “a escravidão contemporânea no país é precedida pelo trabalho infantil e 92,6% de pessoas que estão em condições de escravidão trabalharam na infância”, sendo a maioria delas negras, consequências da história escravocrata do Brasil colonial.

Do total em trabalho infantil no país em 2016, 64,1% eram negros, 86,2% na região Norte, seguido da região Nordeste, com 79,5%, e do Centro-Oeste, com 71,5%. No Sudeste e no Sul eram 58,4% e 27,9%, respectivamente.

É preciso lembrar que o artigo 227 da Constituição Federal estabelece ser dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

“No dia da criança é importante alertar a sociedade que todas as crianças do campo e da cidades, pobres e ricas, brancas e negras, têm direito a proteção integral e a garantia dos seus direitos fundamentais”, ressalta Isa, lembrando que a campanha da entidade começou em 12 de junho.

Sobre a campanha da CUT

 #TrabalhoInfantilEuCombato é a hashtag que será usada durante a campanha da CUT pelo fim do trabalho infantil, que está estruturada por períodos e temas. Ao longo de outubro, uma série de animações mostrando crianças em situações inadequadas de trabalho infantil e também uma série de cards focando no esforço para evitar o aumento de crianças exploradas devido à crise da covid-19 e de mitos e verdades serão divulgados.

Estão previstos tuitaços, vídeos, seminários em formato de live com personalidades em destaque na luta e proteção dos direitos da infância, adolescência, criação de uma letra de música relacionada ao tema, um hotsite com dados, estudos e reflexões, e até um concurso de redação nas escolas. Vai ter ações no Facebook, Instagram e Twitter também durante todo o período da campanha.

Períodos e temas da campanha

“Covid-19: protegendo crianças e adolescentes do Trabalho Infantil” é o tema que abre a campanha neste dia 12. Em 20 de novembro, será a vez do tema “Violência, racismo e desigualdade ‘adultizam’ crianças negras no Brasil”.

Ainda este ano, em 10 de dezembro, Dia Internacional dos Direitos Humanos, vai ter um Festival pela Erradicação do Trabalho Infantil: “Porque a sociedade não consegue enxergar o trabalho infantil como uma violação de direitos humanos?”

Em Fevereiro, já no Ano Internacional pela Eliminação do Trabalho Infantil, o tema será “Pandemia vai intensificar o abandono escolar entre alunos mais pobres”. No mês das mulheres, no dia 8 de março, a campanha abordará “Subnotificação do Trabalho Infantil entre meninas, principalmente com relação ao Trabalho Infantil Doméstico”.

Já no Dia Internacional das Lutas Camponesas, em 17 de abril, a maior concentração do trabalho infantil na agricultura será o assunto da vez. No mesmo mês, em 28 de abril, no Dia Internacional das Vítimas de Acidente de Trabalho, a discussão será “As piores formas de Trabalho Infantil”.

Para o mês do Trabalhador e da Trabalhadora (maio) o tema será “O Trabalho Infantil é causa e efeito da pobreza”.

FONTE: REDE BRASIL ATUAL