A cúpula  maior, voltada para cima, abriga o Plenário da Câmara dos Deputados.

IMAGEM: MARCELLO CASAL JR/AGÊNCIA BRASIL

 

A comissão especial da Câmara dos Deputados sobre regras eleitorais (PEC 125/11) aprovou, na noite desta segunda-feira (10/8), a mudança do sistema eleitoral brasileiro para o "distritão" já na eleição de 2022.

Segundo a proposta, são eleitos os candidatos mais votados, sem levar me conta os votos dados aos partidos, como acontece hoje. Esse sistema seria uma transição para o "distritão misto", a ser adotado nas eleições seguintes para Câmara dos Deputados, assembleias legislativas e câmaras municipais. Porém, os deputados aprovaram um destaque do PCdoB para retirar esse item do texto.

A proposta ainda vai passar por dois turnos de votação no Plenário da Câmara antes de seguir para a análise do Senado.

O texto original da PEC tratava apenas do adiamento das eleições em datas próximas a feriados, mas, no quarto substitutivo ao texto, a relatora incluiu vários temas a fim de "aumentar o leque de propostas" levadas para a apreciação do Plenário. O texto-base da relatora, Renata Abreu, foi aprovado por 22 votos a 11 na comissão.

Voto preferencial
Outra novidade no texto de Renata Abreu é o chamado “voto preferencial” nas eleições para presidente da República, governadores e prefeitos, a partir de 2024. A ideia de Renata Abreu, já adotada na Irlanda e no estado de Nova Iorque (EUA), é dar ao eleitor a possibilidade de indicar até cinco candidatos em ordem de preferência.

Na apuração, serão contadas as opções dos eleitores até que algum candidato reúna a maioria absoluta dos votos para chefe do Executivo.

“Você não é obrigado a listar a sua ordem de preferência. Você pode colocar a sua ordem de preferência. A eleição se torna muito mais barata. Trouxemos o que tem de maior inovação na política no mundo, mas tomamos o cuidado de não aplicar nas próximas eleições exatamente para não acharem que é um casuísmo”, disse Renata Abreu.

Coligações
Em relação às coligações, que foram proibidas nas últimas eleições municipais, a relatora disse prestigiar a autonomia partidária e autorizar os partidos a decidirem a forma de se coligar tanto nas eleições majoritárias quanto nas proporcionais.

Renata Abreu ainda fez um ajuste de última hora para revogar o artigo da Constituição que trata do caráter nacional dos partidos políticos. “Atendendo o princípio geral de liberdade de criação de partidos, entendemos que os partidos regionais têm um papel importante a desempenhar na democracia brasileira”.

Cláusula de desempenho
O texto de Renata Abreu também tem novidade na cláusula de desempenho, que trata dos limites mínimos de votos e parlamentares eleitos para que um partido político tenha acesso ao Fundo Partidário e à propaganda gratuita.

Além do percentual mínimo de votos válidos (1,5% a 3%, conforme regra de transição prevista na Emenda Constitucional 97, de 2017) e do número mínimo de deputados federais eleitos (11 a 15) em pelo menos um terço das unidades da Federação, também passa a ser considerado o mínimo de cinco senadores eleitos, incluindo aqueles que já estiverem em exercício na primeira metade do mandato no dia da eleição.

Para a eleição de 2022, a relatora prevê a criação de uma cláusula de "habilitação", exigindo um quociente mínimo de votos para que o partido possa ter acesso às cadeiras no Legislativo. O limite previsto é de 25% do quociente eleitoral da eleição na respectiva circunscrição.

Também haverá exigência de quociente individual mínimo para os suplentes, “de forma a evitar que candidatos sem votos possam ocupar as cadeiras, o que contraria o princípio do sistema”.

O texto mantém a estratégia de reforço da fidelidade partidária, mas, além das justas causas para a troca de legenda já previstas em lei, acrescenta a possibilidade de migração desde que haja a concordância do partido.

Participação popular
Há ainda incentivos à maior participação da população na política. Um dos artigos prevê que os votos dados em mulheres e negros para a Câmara dos Deputados vão contar em dobro para a distribuição do Fundo Partidário e do Fundo Eleitoral.

Também será reduzido, de 1 milhão para 100 mil, o número mínimo de assinaturas para a apresentação de um projeto de lei de iniciativa popular na Câmara dos Deputados.

Outra novidade é a possibilidade de consultas populares sobre questões locais durante as eleições municipais ou gerais. Para essa espécie de “plebiscito municipal”, o tema da consulta deve ser aprovado pela Câmara de Vereadores e encaminhado à Justiça Eleitoral até 90 dias antes da data da eleição.

Fundações partidárias de estudo e pesquisa, doutrinação e educação política poderão ampliar o leque de atividades de ensino e formação política, oferecendo cursos de capacitação e formação profissional, juntamente com os de educação política.

Data de posse
Também está prevista mudança na data de posse dos chefes do Executivo, que atualmente ocorre em 1º de janeiro. A relatora propõe posse em 5 de janeiro para presidente da República e em 6 de janeiro para governadores e prefeitos. Essa regra passaria a valer nas posses de 2027 em diante.

A proposta ainda determina que decisões do Judiciário sobre regras eleitorais obedeçam ao mesmo “princípio da anterioridade” já imposto às decisões legislativas sobre eleições, ou seja: só poderão ser efetivamente aplicadas um ano após sua publicação.

Debate na comissão
Distritão, voto preferencial e coligações dominaram os debates na comissão nesta segunda-feira. Vários deputados afirmaram que essas medidas fragilizam os partidos políticos, enfraquecem a representatividade da sociedade no Parlamento e favorecem a eleição de celebridades.

O deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS) alertou que haverá futuros recursos ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a proposta.

O deputado Ivan Valente (Psol-SP) criticou fortemente o texto aprovado, em especial a adoção do voto preferencial, que ele considera que vai confundir o eleitor diante da profusão de candidatos ao Executivo. “Isso é uma vergonha e um escárnio. O que está acontecendo aqui são parlamentares e partidos que estão pensando na sua reeleição e não na ideia de uma democracia e de uma disputa de ideias e projetos de Nação”, afirmou.

O deputado Henrique Fontana (PT-RS) se queixou do acordo que viabilizou a votação na comissão especial. “O Brasil fez um plebiscito para descartar o parlamentarismo e, agora, com meia hora de relatório pronto, querem alterar o sistema de voto para a eleição presidencial e para deputados federais. Participei dos acordos para não obstrução, mas querem colocar tudo que o grupo do 'distritão' queria – ou seja, 'distritão' e volta das coligações – e o lado que eu represento não coloca nada nesse acordo. Que acordo é esse?”, questionou.

Já a deputada Bia Kicis (PSL-DF) saiu em defesa do texto, e do “distritão” em particular. “Realmente há, na Casa, essa grande predominância do 'distritão', porque entendemos que devemos alterar o sistema para que o próprio eleitor possa entender melhor o sistema eleitoral e para que prepondere a vontade do eleitor”, declarou.

Para o deputado Marcel van Hattem (Novo-RS), a aprovação do texto na comissão será seguida por uma discussão mais ampla no Plenário. “Nós estamos ficando sem tempo, neste momento, e precisamos ir para o Plenário para que uma eventual mudança no nosso sistema político possa acontecer. E quero frisar aqui a sugestão do voto preferencial, corajosamente incluído pela relatora.”

A aprovação definitiva da reforma político-eleitoral depende de, no mínimo, de 257 votos de deputados e 41 de senadores nos dois turnos de votação nos Plenários da Câmara e do Senado. As medidas previstas para as eleições de 2022 precisam ser aprovadas até outubro, um ano antes do pleito. 

 

FONTES: Agência Câmara de Notícias/CONJUR