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O direito de férias é relativamente recente, já que, até o final do século 19, sua concessão não estava positivada. Em 1872, a Inglaterra promulgou a primeira lei de férias garantindo o direito a operários de algumas indústrias. Depois disso, por mais de 40 anos, muitas empresas de diversos países adotaram o direito de férias, por mera liberalidade, ou por previsão em convenções coletivas de trabalho.

No Brasil, em 1889, foram concedidas férias anuais remuneradas, de 15 dias, a todos os trabalhadores do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, direito que se estendeu aos operários diaristas e aos ferroviários da Estrada de Ferro Central do Brasil, em 1890.

Assim, além de ser o segundo país a conceder férias anuais remuneradas, o Brasil foi o sexto a estender esse direito a todos os empregados e operários de empresas privadas, com a Lei n° 4.582, de 24 de dezembro de 1925. No ano seguinte, a lei foi regulamentada pelo Decreto n° 17.496, que também tornou obrigatório o registro do empregado em carteira de trabalho e em livro próprio do empregador.

Apesar de muito louvada, por ser a primeira lei com essa extensão nas Américas e uma das primeiras no mundo, sua aplicação não foi eficiente e a obrigação patronal de concessão de férias raramente era observada.

Deste modo, em 1931, a lei foi revogada pelo Decreto n° 19.808 que manteve o descanso de quinze dias remunerados, mas estabeleceu o prazo de doze meses para que as empresas passassem a conceder férias aos seus empregados.

Em 1o de maio de 1943, finalmente, a Consolidação das Leis do Trabalho organizou a legislação trabalhista esparsa e unificou o regime de férias, estendendo-o a quase todos os empregados com exceção, porém, dos domésticos.

A ampliação do direito de férias prosseguiu, de modo que, em 1977, o Decreto-lei n° 1.535 alterou o regime consolidado, e, em 1988, a Constituição Federal garantiu o gozo das férias a todos os trabalhadores, além de acrescer o pagamento de um terço ao valor do salário normal (artigo 7o, inciso XVII).

O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, promulgado, no Brasil, pelo Decreto n° 591 de 1992, reconheceu em seu artigo 7º, o direito de toda pessoa de gozar de condições de trabalho justas e favoráveis, assegurando especialmente: "d) o descanso, o lazer, a limitação razoável das horas de trabalho e férias periódicas remuneradas, assim como a remuneração dos feriados".

Com a generalização do direito de férias, tomou força a ideia de que estas são uma garantia acessível ao trabalhador por sua simples qualidade de empregado, destinada a consagrar as indispensáveis oportunidades de disponibilidade pessoal, de lazer e de liberdade inerentes à suspensão das coerções laborais. Devem ser entendidas como garantia de saúde pública e bem-estar social, agindo como instrumento fundamental de inserção do cidadão no contexto social.

Portanto, as férias são direitos de ordem pública e de interesse geral que se dirigem a um fim de utilidade pública, à saúde do empregado com a restauração do equilíbrio físico e psíquico, e à satisfação de exigências de ordem social, permitindo o descanso do trabalhador e a sua efetiva integração na sociedade da qual participa.

Com base neste entendimento, o TST decidiu que as férias não possuem apenas status constitucional (artigo 7º, XVII), mas de um direito humano que visa à recomposição físico-psíquica do trabalhador, além de oportunizar o convívio social e familiar em momentos de lazer.

Em recente decisão (de fevereiro de 2022), a ministra Kátia Magalhães, relatora do processo TST-RR-25699-03.2017.5.24.0002, condenou o banco reclamado ao pagamento de indenização de R$ 50 mil, por dano existencial à ex-empregada.

No caso dos autos, a 6ª Turma, por unanimidade decidiu, de acordo com a "hermenêutica constitucional, que confere sentido à ordem jurídica e investe os órgãos jurisdicionais de amplos poderes para garantir a efetividade dos direitos fundamentais, inclusive daqueles que concernem à dignidade humana, liberdade, saúde, honra”, que “o excesso comprovadamente havido ao se exigir um regime de trabalho contínuo com a supressão integral do direito às férias durante 17 (dezessete) anos de labor, dispensa demonstração dos prejuízos advindos ao descanso, lazer, convívio familiar e recomposição física e mental da reclamante".

Afinal, a não concessão de férias, por tanto tempo, demonstra a clara violação aos direitos fundamentais do trabalhador e permite ao Direito do Trabalho, enquanto instrumento de justiça social, sistematizado para buscar a efetivação do direito à igualdade entre o capital e o trabalho, humanizar esta relação e reconhecer o dever de respeito às condições dignas de trabalho.

FABÍOLA MARQUES é advogada, professora da PUC na graduação e pós-graduação e sócia do escritório Abud e Marques Sociedade de Advogadas.

FONTE: REVISTA CONSULTOR JURÍDICO/CONJUR