IMAGEM: MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL
Desindexação do salário mínimo afeta trabalhadores assalariados, aposentados e pensionistas, enquanto fim da dedução no IR dos gastos com saúde e educação atingem em cheio a classe média
Muito antes de o ex-deputado Roberto Jefferson disparar arma de fogo e lançar granadas contra policiais federais, o ministro da Economia, Paulo Guedes, já havia lançado mão do seu aparato explosivo. Em reunião ministerial, no dia 22 de abril de 2020, no início da pandemia, o “Posto Ipiranga” de Bolsonaro avisou: “Nessa confusão toda, todo mundo tão distraído, abraçaram a gente, enrolaram com a gente. Nós já botamos a granada no bolso do inimigo. Dois anos sem aumento de salário”. O então “superministro” se referia ao congelamento dos salários do funcionalismo público, conforme acabou se confirmando. Além disso, sob com a economia sob o comando de Guedes, o salário mínimo chega ao fim do atual governo Bolsonaro sem ter um único reajuste real, acima da inflação
Agora, às vésperas da votação do segundo turno das eleições, vazam outros planos “explosivos” do ministro da Economia. Uma dessas bombas afeta diretamente os mais pobres. Isso porque Paulo Guedes pretende simplesmente acabar com a correção do salário mínimo e das aposentadorias pela inflação. Em vez disso, reajuste do mínimo seria calculado “pela meta de inflação”, que é estabelecida pelo próprio governo.
Caso a inflação supere a meta, como vêm ocorrendo nos últimos anos, o mínimo acumularia perdas em termos reais. Assim, a medida comprometeria principalmente o poder de compra daqueles que tem a remuneração atrelada ao mínimo. Com essa mudança, o governo também pretende “economizar” R$ 100 bilhões por ano, com a redução dos valores pagos a aposentados, pensionistas e aqueles que recebem o Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Outra granada que a equipe econômica prepara tem como alvo a classe média. Conforme divulgado nesta terça-feira (25) pelo jornal O Estado de S. Paulo, os auxiliares de Paulo Guedes estudam pôr fim aos descontos com despesas médicas e de educação no Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). Do mesmo modo, a argumentação da pasta é de que a medida representaria uma “economia” de R$ 30 bilhões.
Mais desemprego e sofrimento
O professor de Economia da Universidade Federal do ABC (UFABC) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Márcio Pochmann, o governo Bolsonaro ampliou gastos públicos, com objetivos meramente eleitoreiros, sem sustentação fiscal. Diante desse quadro, ele acredita que, a partir do próximo mês, o governo deve adotar “medidas draconianas” para tentar buscar o equilíbrio nas contas públicas.
Dentre outras medidas previstas, o economista citou a desindexação do salário mínimo. “O governo possivelmente vai liberar os preços de combustíveis novamente. Então nós teremos um impacto inflacionário muito intenso. Para poder evitar que a inflação não suba ainda, possivelmente teremos uma elevação na taxa de juros – o dinheiro vai ser mais caro ainda. E mesmo medidas de contenção do gasto público que já são inclusive sinalizadas, como a desvinculação do reajuste do salário mínimo, a desvinculação portanto da correção das aposentadorias de acordo com a inflação”, afirmou Pochmann, em entrevista a Glauco Faria, para o Jornal Brasil Atual.
Para ele, a implementação desse “drástico” programa deve resultar em ainda mais desemprego e maior sofrimento para a população brasileira. As economias dos pequenos municípios, onde muitas vezes os montantes pagos a aposentados e pensionistas superam inclusive as receitas advindas do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) serão as principais prejudicadas.
Além disso, desindexação do salário mínimo, de acordo com o economista, vai fragilizar ainda mais o mercado interno, como um todo. Ao contrário, a valorização do salário mínimo, como defende o candidato da coligação Brasil da Esperança à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ensejaria uma espécie de “círculo virtuoso”. Com mais dinheiro nas mãos da população, o consumo interno aumenta. Assim, as empresas contratam mais, com o objetivo de atender o crescimento da demanda, impulsionando o crescimento do país.
Orçamento secreto e crise fiscal
Para a economista brasileira Monica de Bolle, pesquisadora-sênior do Instituto Peterson de Economia Internacional (PIIE) e professora da Universidade Johns Hopkins, as medidas de arroxo que Guedes e Bolsonaro preparam têm relação com os desequilíbrios fiscais decorrentes do chamado orçamento secreto. Ela cita levantamento do repórter Breno Pires, da revista Piauí, que identificou cerca de R$ 80 bilhões gastos nas chamadas “emendas de relator”.
Aposentadoria na mira
Já o economista Eduardo Moreira sinaliza que a tentativa de mexer na correção do salário mínimo tem a ver com os objetivos de Paulo Guedes de acabar com o atual sistema de aposentadoria, substituindo-o pela capitalização. O modelo constava na proposta de Reforma da Previdência que o governo Bolsonaro enviou ao Congresso no início do seu mandato. No entanto, o relator da proposta na Comissão Especial da Câmara, Samuel Moreira (PSDB-SP), retirou a capitalização da proposta. Um ano depois, Guedes tentou retomar a proposta. Para Moreira, ele deve preparar uma nova investida nesse sentido, caso Bolsonaro seja reeleito.
De inspiração chilena, implementado durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-90), a capitalização prevê que o trabalhador deposite individualmente a sua contribuição numa espécie de poupança, que vai acumular rendimentos, que serão resgatados quando o indivíduo se aposentar. Assim, na proposta aventada por Guedes, em meados de 2020, o governo complementaria os benefícios que ficassem abaixo de um salário mínimo. Daí a vem a necessidade do governo de enfraquecer, o quanto possível, o piso salarial, de acordo com o economista.
FONTE: REDE BRASIL ATUAL