Passos lentos. Cuidado nas negociações é essencial na hora de adotar as novas medidas, caso contrário, aplicação pode ser complicada e resultar em mais complexidade nas ações judiciais
 
Às vésperas de entrar em vigor a nova lei trabalhista, as empresas de saúde estão otimistas com medidas como a regulamentação da jornada de trabalho 12 x 36, das vagas intermitentes e a possibilidade de novas formas de contratação. As medidas, contudo, exigem cuidado das empresas para evitar um maior estresse na relação de trabalho e um confronto judicial complexo.
"O mesmo congresso que aprovou pode desmontar [as reformas]", resume o professor de relações do trabalho da Universidade de São Paulo (USP), José Pastore. Segundo ele, o melhor caminho para adotar a Lei 13.467 de 2017 - que entra em vigor em 11 de novembro -, é de forma gradativa. Para o professor, a reforma é 'imensa' - altera cerca de 114 artigos da CLT - e seria um risco aplicar todos os pontos de uma vez.
Mesmo em caso de benefícios por força de convenção coletiva, ele destaca é necessário respeitar o acordado e só realizar alterações após novas negociações. A mesma lógica foi citada no caso de decisões acordadas com órgãos públicos. "Se assinei com o Ministério Público que não vou terceirizar [previsto na Lei 13.429 de 2017] a atividade fim, devo respeitar o prazo ou renegociar", diz.
Uma dica dele é que as empresas preparem todas as áreas da companhia que terão um envolvimento com a aplicação da lei, como Recursos Humanos, advogados e contadores. Além disso, ele cita a importância de informar as mudanças para todos os trabalhadores.
De forma geral, o especialista aponta que a nova lei terá grande impacto na área, já que entre 70% e 80% do custo do serviço esteja ligado a mão de obra.
No curto prazo, Pastore acredita que o impacto das novas normas seja queda no número de conflitos 'banais'. Na contrapartida, podem surgir casos mais complexos, devido à posição contrária que muitos juízes já anunciaram. Por isso a necessidade de tomar decisões com cautela. "Casos mais complexos vão surgir e as empresas devem estar preparadas. Pode estar em lei, mas se o juiz tiver outra interpretação, a área jurídica deve estar preparada", disse, durante o Conecta Saúde, realizado pela federação e o sindicato dos hospitais, clínicas e laboratórios do estado de São Paulo, Fehoesp e Sindhosp, respectivamente.
Cuidados
O diretor da Policlin, Cyro alves de Britto, cita que possibilidade de jornada 12x36, e o trabalho intermitente, trará grande redução de custos. "Hospitais têm picos e sazonalidade em algumas áreas e a intermitência ajuda a contratar de acordo com a necessidade."
Para o presidente da Fehoesp, Yussif Ali Mere Jr, o maior ganho para as empresas com as novas modalidades de contratação é a segurança jurídica. "Agora poderemos contratar de acordo às especificidades de cada área da saúde". Para ele, o fato das empresas estarem limitadas nas formas de contratação gerava desperdício de mão de obra. "Por exemplo: agora, em vez de três turnos em uma clínica é possível dividir em dois e aumentar o salário", comenta, ressaltando que uma clínica de terapia renal substitutiva pode reduzir a mão de obra em 25%.
Já para o diretor do Pathos Diagnósticos Médicos, Paulo Grimaldi, um ganho é a possibilidade de melhorar as relações com funcionários, tanto por ajudar na cultura da meritocracia, como pela chance de diminuir a hora de intervalo, no caso de quem quer sair mais cedo.
Apesar dos aspectos considerados positivos, um ponto que o Yussif Ali Mere Jr cita como incerto é a terceirização da categoria médica. "Mesmo que ele trabalhe em outros locais, se for todos os dias pode acarretar em vínculo trabalhista. Só a reforma e a terceirização não dão segurança", antecipa.
A chefe do departamento jurídico das entidades, Eriete Teixeira, também citou pontos que não foram conteplados como o adicional de insalubridade, que não dá incentivos para empresas que têm gestão correta da segurança do trabalhador. Além disso, ela menciona o dispositivo que trata da classificação do que é 'verba salarial' e 'outras verbas'. "A impressão é dará discussão, pois há um confronto com a constituição. Isso pode trazer um prejuízo se for considerado inconstitucional. "
Contraponto
Na contrapartida, sindicatos de trabalhadores da área da saúde se mostram descontentes. O Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), por exemplo, se posiciona contra a reforma, sobretudo pelo modo como foi feita. "Deveria ter sido mais discutida para chegar a uma reforma que representasse a modernidade e desse segurança aos trabalhadores", diz o conselheiro do Cofen, Luciano Silva.
De acordo com ele, três pontos ainda geram insegurança à categoria. São eles: a exposição de gestantes e lactantes em locais insalubres, a negociação individual e a redução do intervalo intrajornada. Mesmo que nos dois primeiros haja dispositivos de segurança para o trabalhador, ele ressalta a chance do funcionário se sentir pressionado a acatar a decisão do patrão por medo de perder o emprego.
O único fator que ele observa como avanço é a jornada 12 x 36, contudo, ele destaca que faltou a recomendação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que sugere 30 horas semanais de trabalho. "Outras categorias da saúde adotaram, e a enfermagem - que está em contato constante com o paciente - ainda não."
Fonte: DCI