IMAGEM: ITF

A possibilidade de ingresso nos cursos de formação de oficiais nas carreiras profissionais marítimas para as mulheres só foi alcançada no Brasil no final do século passado, após longas discussões da organização sindical marítima com o governo e a Marinha do Brasil.

Até então, a atividade marítima privilegiava a participação dos homens, uma situação conflitante com a Constituição Federal de 1988 e a Convenção 122 da OIT, ratificada pelo Brasil, para a qual os sindicatos chamavam a atenção das autoridades e de parlamentares brasileiros.

Em pouco mais de duas décadas, um dos maiores objetivos que buscamos alcançar é o estabelecimento de legislação prevendo condições mínimas para que as marítimas possam conciliar o direito à maternidade e a continuidade da carreira no mar, que por suas peculiaridades já impõe restrições a homens e mulheres.

Algumas empresas do setor demonstravam grande resistência em empregar mulheres, situação que levou os sindicatos marítimos a fazerem fortes campanhas com o objetivo de garantir cláusulas em acordos coletivos de trabalho (ACT) prevendo condições mais justas e a permanência das mulheres na atividade.

O Sindmar atuou, também, nessas duas décadas de participação das mulheres, oferecendo apoio às marítimas que buscavam medidas judiciais emergenciais para garantir a segurança e os direitos das gestantes. ( Veja mais em
http://www.sindmar.org.br/wp-content/uploads/2016/05/revista-unificar-30.pdf )

Entre 2010 e 2021, especialmente, a luta foi intensa para conscientizar os empregadores marítimos no Brasil sobre a necessidade de assegurar às mulheres do mar a possibilidade de conciliar a atividade profissional e a maternidade, ainda na ausência de legislação especial para a marítima gestante.

Apesar de não ser o ideal, a cláusula da gestante representa uma conquista muito relevante e foi ajustada com a maioria das empresas nos acordos coletivos de trabalho que cobrem mais de 90% dos postos de trabalho da categoria.

Algumas empresas só assinaram a cláusula específica para a gestante em 2021, após grande mobilização no offshore para que firmassem ACT, o que demonstra a resistência que ainda existe em oferecer condições justas às mulheres.

A “cláusula da gestante” abaixo, assinada com a maior empresa do offshore atuante no Brasil, segue padrão semelhante nos acordos da maior parte das empresas de navegação brasileiras.

“DA GESTANTE

CLÁUSULA QUADRAGÉSIMA SEXTA – A empregada marítima gestante tem a obrigação de, a partir da ciência do fato de sua gravidez, comunicar imediatamente por escrito à Empresa e, após tal comunicação, quando desembarcada, fará jus ao recebimento da remuneração integral durante todo período de gestação. Os benefícios Vale Alimentação, Assistência Médica e Odontológica serão mantidos, bem como todos os demais benefícios e condições praticados pelas Empresas acordantes.

Parágrafo Primeiro – As regras definidas no caput aplicar-se-ão durante o período de gestação compreendido entre a notificação às Empresas e o início da licença- maternidade, mantida a remuneração integral, segundo os preceitos Legais. O retorno às atividades em regime de embarque, nas condições praticadas antes da gestação, ocorrerá ao término da licença maternidade ou do período de aleitamento, caso aplicável.

Parágrafo Segundo – A empregada marítima lactante se obriga a comprovar mensalmente a manutenção de tal condição, através de laudo médico, como condição para manutenção do seu afastamento, limitado a 6 (seis) meses contados a partir do final da licença maternidade…”

Enquanto isso, continua em longa tramitação na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 1145/11, que poderá ampliar na legislação trabalhista o período de licença-maternidade da mulher que trabalha em embarcações da marinha mercante, de navegação fluvial e lacustre, de tráfego nos portos ou de pesca.

A proposição de 2011 só foi aprovada recentemente na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara de Deputados e não é possível prever quanto tempo mais o parlamento levará para assegurar em lei condições mínimas para as mulheres que já fazem parte dos direitos conquistados com luta coletiva.

Ainda há muito a ser feito para garantir igualdade efetiva de condições para mulheres que atuam nas carreiras do mar. A questão do assédio sexual e moral volta e meia assombra o setor marítimo, não apenas no Brasil.

Para o Sindmar, este tema tem sido recorrente em nossa atuação, muitas vezes em colaboração com o Ministério Público do Trabalho, buscando garantir um ambiente laboral livre de assédio e efetiva punição para crimes de discriminação a bordo. ( Veja mais informações em: http://www.sindmar.org.br/mpt-lanca-cartilha-contra-assedio-em-portos-e-embarcacoes/ )

O Sindicato defende que o acesso aos cursos de formação de oficiais da Marinha Mercante continue ocorrendo mediante aprovação em processo seletivo público, sob responsabilidade da Autoridade Marítima, garantindo a igualdade no ingresso para homens e mulheres e observância aos requisitos de aptidão definidos nas Convenções Internacionais da OIT e da IMO ratificadas pelo Brasil.

A participação significativa de mulheres atualmente nos cursos de formação profissional e de especialização evidencia que os esforços dos sindicatos marítimos brasileiros têm contribuído para que elas encontrem possibilidades mais efetivas de participar de forma plena na atividade marítima.

Passados mais de 20 anos desde que a primeira turma de mulheres ingressou no mercado de trabalho marítimo nacional como Oficiais da Marinha Mercante, vemos com satisfação que diversas companheiras atualmente ocupam cargos de hierarquia elevada no setor, tanto no comando e na chefia de máquinas das embarcações, quanto em cargos de direção na estrutura baseada em terra das empresas de navegação.

A participação das marítimas em seus sindicatos trouxe importantes contribuições nesse período e será essencial para continuarmos avançando.

Juntos somos mais fortes!

Carlos Augusto Müller

SINDMAR

ARTIGO: OIT