A Solve Shipping observa que o aumento do transbordo de carga verificado nos últimos anos no Brasil segue tendência inversa ao que vem sendo percebido nas principais rotas marítimas de contêiner do mundo. Contudo, esse incremento poderia potencializar o crescimento da cabotagem no Brasil e, consequentemente, alavancar uma melhor distribuição da matriz de transportes brasileira, caso houvesse um verdadeiro hub port na costa brasileira, capaz de operar sem restrições navios Neo Panamax, cuja configuração é de 14.000 TEUs, 366 metros de comprimento e 15m de profundidade.
De acordo com a consultoria, o cenário internacional com a chegada de porta-contêineres gigantes (até 21.000 TEUs), a formação de megaconsórcios entre os armadores e a expansão do Canal do Panamá possibilitou às grandes empresas de navegação de longo curso reconfigurarem suas maiores rotas de maneira que os principais pares de portos de origem e destino fossem atendidos por serviços diretos, reduzindo assim os custos com transbordos sem perder cobertura comercial ou market share.
Em relação ao Brasil, a consultoria projeta que os volumes de transbordo continuarão crescendo de forma consistente nos próximos anos devido a três fatores principais. O primeiro deles é a baixa participação brasileira no comércio internacional. Mesmo sendo considerado um dos "celeiros do mundo" e figurando entre as 10 maiores economias do planeta, o Brasil sequer aparece no ranking dos 20 maiores exportadores/importadores mundiais, o que limita a quantidade de navios demandados para atender a costa brasileira.
O segundo fator seria a forte redução na quantidade de serviços semanais que conectam o Brasil ao restante do mundo. A diminuição no número de serviços é considerada por especialistas um fenômeno mundial deflagrado ao longo da última década diante das encomendas de navios cada vez maiores por parte dos armadores que visam obter ganhos de escala, redução de custo e níveis de fretes mais baixos. Ainda assim, a Solve Shipping observa que as principais rotas marítimas brasileiras atualmente (Ásia, Norte da Europa e Mediterrâneo) contam com apenas dois ou três serviços semanais, contra cerca de 30 serviços semanais na rota Ásia-costa oeste dos Estados Unidos. Isso inviabiliza essa reconfiguração de pares de portos de origem e destino sem a perda de cobertura comercial e market share.
O terceiro fator apontado pela consultoria para o crescimento dos transbordos no Brasil são as sérias, e por vezes intransponíveis, restrições operacionais já enfrentadas por navios de 10.000 TEUs, 336m de comprimento e 14m de profundidade para operar na maioria dos portos brasileiros, o que também inviabiliza a reconfiguração de pares de portos de origem e destino sem a perda de cobertura comercial e market share.
Para Leandro Carelli Barreto, sócio-consultor da Solve Shipping, os portos da costa leste dos EUA há poucos anos também não eram capazes de operar plenamente os navios de 10.000 TEUs e chegaram a perder relevância para os portos da costa oeste norte-americana nas importações oriundas da China. Contudo, esses portos conseguiram a autorização do congresso norte-americano para buscar financiamentos milionários a fim de adequar suas instalações para receber os navios Neo Panamax, sobretudo por meio do aprofundamento de calados.
Com a expansão do Canal do Panamá ocorrida em junho de 2016, o portos da costa leste norte-americana estão retomando sua participação nas rotas com a Ásia. Em Nova Iorque, por exemplo, a Bayonne Bridge precisou ser suspensa para permitir a passagem de navios de até 18.000 TEUs. "O comércio exterior dos EUA é 12 vezes maior que o brasileiro e a costa leste é onde se concentra o maior mercado consumidor, o que justifica tamanho investimento", ponderou.
Apesar disso, levantamentos preliminares realizados pela Solve Shipping com exclusividade para a Portos e Navios demonstram que os armadores poderiam reduzir em até 35% o tamanho da frota dedicada ao Brasil se operassem com navios Neo Panamax em um único hub port, em vez de passar três semanas descendo e subindo a costa brasileira.
Além da redução de custos portuários, tais como: como rebocadores e praticagem, em tempos de aumento no custo do afretamento e de escalada nos preços dos combustíveis, esse sistema hub port e feeder services ao longo da costa brasileira, conectados com grandes navios de longo curso, poderia proporcionar economia de algumas dezenas de milhões de dólares, mesmo depois de debitados os custos do transbordo, e ainda reduziria o transit time em algumas origens e destinos. “O navio grande viria em um porto concentrador e iria embora, gastando menos tempo e menos navios”, explicou.
O consultor avalia que, se Santos resolvesse o problema da largura e da profundidade do canal de acesso ou se surgisse um verdadeiro hub port no Sul ou no Sudeste do Brasil, os armadores poderiam voltar as suas pranchetas para simular novas configurações de serviços. "Isso certamente proporcionaria aos importadores e exportadores nacionais os níveis de fretes mais competitivos gerados pela utilização de navios maiores", comentou.
Atualmente, existem três serviços entre Ásia e Brasil operando com navios de 9.500 TEUs em média, mas essa rota está com as utilizações pressionadas devido ao crescimento de 16,5% na demanda em 2017. Para Barreto, essa rota poderia acomodar dois serviços semanais com navios de 14.000 TEUs e a rota para o Norte da Europa poderia acomodar um outro serviço com navios de 14.000 TEUs, No entanto, ele ressaltou que, com menos saídas por semana, há uma maior concentração do risco para os exportadores, importadores e seguradoras.
Barreto acrescentou que um outro limitador para esse modelo seria o fato de que atualmente os navios utilizados nos serviços brasileiros para Ásia e Europa dedicam, em média, 40% da sua capacidade para as cargas refrigeradas. Todavia, nos atuais navios de 14.000 TEUs essa capacidade não ultrapassaria os 20%. “Os armadores também precisariam construir novos navios de 14.000 TEUs com ao menos 2.800 tomadas para cargas refrigeradas e, com o atual esforço dos armadores para domar o excesso de capacidade desse setor, isso não deve acontecer nos próximos dois anos e, portanto, ainda não é possível prever quando os fretes por aqui poderão cair de forma estrutural e sustentável”, concluiu.
FONTE:PORTOS&NAVIOS