Para Marcio Pochmann, o índice de desemprego vem sendo disfarçado pelos trabalhos intermitentes de baixa remuneração
Às vésperas dos atos políticos do 1º de Maio, Dia do Trabalhador, o Brasil conta com mais de 13 milhões de desempregados, 12,6% da População Economicamente Ativa (PEA), número superior à gestão de Dilma Rousseff (PT) antes de ser deposta por um golpe parlamentar, em 2016. Em janeiro de 2003, quando Lula assume a presidência, a taxa de desemprego era de 11,2%, desde então foi se reduzindo progressivamente até atingir 4,8% em 2014, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
No intervalo de praticamente dois anos e com a aprovação da reforma trabalhista em novembro do ano passado, o país perdeu aproximadamente 1,4 milhão de postos de trabalho formais na gestão de Michel Temer (MDB). Os dados compreendem o período de dezembro de 2017 a fevereiro de 2018, e pertencem à Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Para Marcio Pochmann, ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade de Campinas (Unicamp), as iniciativas do governo golpista de Michel Temer fazem parte de um modelo econômico que não valoriza o mercado interno e estimula a venda do patrimônio nacional ao capital estrangeiro.
O professor destaca que a redução do custo-trabalho, proposta pela reforma trabalhista, é uma estratégia para que as empresas paguem menos pela mão de obra e ainda representa um declínio da expansão do capital interno, já que não estimula o crescimento das ocupações de qualidade.
"O custo-trabalho na indústria brasileira, em 2014, era quatro vezes maior do que no mesmo setor na China. Hoje, o custo-trabalho da indústria chinesa é 16% maior do que no Brasil. Se não há dinamismo pelo mercado interno, em grande medida deve-se ao fato de que os salários não crescem e o custo-trabalho cai", afirma.
Pochmann destaca as consequências para a classe trabalhadora. "O emprego formal, para o IBGE, teve uma variação pouco significativa, porque o que mais expandiu nesse sentido foram os postos de trabalho informais à margem da legislação. Portanto, as possibilidades dos trabalhadores nesse modelo econômico ocorrem apenas e tão somente na forma de ocupações precárias, informais, autônomas".
Em contrapartida, um estudo sobre mercado de trabalho lançado no início deste mês pela equipe da Carta de Conjuntura do Ipea aposta em uma recuperação do setor ao longo dos últimos meses, como informa Maria Andréia Lameiras, pesquisadora do Instituto e uma das autoras do estudo. Segundo ela, a flexibilização e a redução do custo-trabalho são medidas positivas e representam uma melhora do trabalho formal.
"O que estamos trabalhando no estudo, quando a gente fala de perspectivas para o mercado de trabalho em 2018, é realmente uma estimativa. A gente [do IPEA] espera que, com essa nova reforma trabalhista, parte dos trabalhadores — que voltaram para o mercado em 2017 como informais — migre para o setor formal, porque essa lei possibilita novas modalidades de emprego com carteira", diz.
O ex-presidente do Instituto defende que a "hipótese de formalização da mão de obra informal" deve ser vista com cuidado. "O emprego regular com carteira assinada era de qualidade. Hoje, em função da flexibilização da legislação, nós teremos uma formalização de postos de trabalho precários de baixa remuneração".
Desemprego e informalidade
Pochmann argumenta que existe um enorme excedente de mão de obra, verificado tanto pelo desemprego aberto quanto pelo "desemprego disfarçado por ocupações precárias", que equivale a aproximadamente um quarto de toda a PEA.
O principal elemento, segundo o economista, são os trabalhos fracionados ou intermitentes, quando o trabalhador fica à disposição da convocação da empresa e recebe apenas pelo período definido pelo empregador. Pochmann argumenta que a reforma trabalhista cria uma categoria de "trabalhadores pobres" (na literatura internacional 'working poor').
"A pessoa que lava um carro, por exemplo, com jornadas muito pequenas [trabalho intermitente] passa a ser considerada como ocupada, mas na verdade ela exerce esses "bicos", essa estratégia de sobrevivência e, simultaneamente, está procurando outro tipo de trabalho. Assim, embora esteja empregada, ela não recebe uma remuneração que a permita sair da pobreza", explica.
Lameiras, por sua vez, não acredita na precarização como consequência e argumenta que os direitos fundamentais foram preservados com a nova lei trabalhista. "O trabalhador continua tendo direito ao descanso semanal, às férias remuneradas, ao fundo de garantia. Então, a reforma flexibilizou, não aniquilou, ela não acaba com os direitos do trabalhador".
De acordo com a PNAD contínua, em 12 meses, até fevereiro deste ano, o país conta com 1,745 milhão de ocupados a mais no mercado de trabalho, 511 mil deles sem carteira, com mais 977 mil trabalhando por conta própria e 611 mil que perderam o vínculo pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Segundo o estudo do Ipea, o recuo do desemprego é maior entre jovens, com ensino fundamental ou ensino médio, muitos deles ocupantes de postos de emprego informais.
Fonte: Brasil de Fato