IMAGEM: LEANDRO GOMES/CUT/DF
O Senado aprovou, nesta terça-feira (30), o PLC (Projeto de Lei da Câmara) 130/11, que institui multa para empresa que submeter mulheres à desigualdade salarial. Texto segue para sanção presidencial.
O projeto insere na legislação trabalhista (CLT) a previsão de multa por discriminação salarial entre os sexos. Assim, a empresa multada deverá compensar a funcionária alvo da discrepância com o pagamento de valor correspondente a cinco vezes a diferença verificada em todo o período de contratação. A proposta foi relatada pelo senador Paulo Paim (PT-RS).
O texto altera a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) para estabelecer multa, em favor da trabalhadora alvo da discriminação, equivalente a cinco vezes o valor das diferenças salariais constatadas durante o período de contratação.
Contradição a ser examinada
Há no contexto desse debate e até mesmo no projeto em si, embora a ideia do autor, corroborada com o relator, e aprovada pelo Congresso, seja meritória e de longo alcance social.
A contradição é que para a lei ter efetividade real é preciso fiscalização rigorosa e permanente do Estado brasileiro, por meio da Auditoria Fiscal do Trabalho, que a bem da verdade não é prestigiada pelo governo e faz tempo.
O mesmo Congresso que acaba se aprovar e enviar à sanção presidencial este projeto de lei é o que debate a Reforma Administrativa (PEC 32/20), que pretender diminuir o tamanho e o papel do Estado nacional.
Isto é, caso a contrarreforma que está em discussão na Câmara dos Deputados seja aprovada, segundo os interesses do governo e do mercado, o projeto ora aprovado não terá efetividade. Será “letra morta” ou para “inglês ver”, já que o Estado não terá meios efetivos de fiscalizar o cumprimento da norma legal. Claro, se o presidente da República não vetá-lo.
Multa pesada para o infrator
“Não se trata apenas de desabonar simbolicamente tal prática reprovável, mas de fazer sentir o infrator todo o peso da reprobabilidade social de sua conduta. Nesse sentido, é lícita a adoção de multa consideravelmente pesada”, destaca Paulo Paim no seu relatório.
Em relação à limitação do cálculo da multa, o senador lembra que o prazo prescricional das obrigações trabalhistas é dado pela Constituição, cujos dispositivos não podem ser alterados por lei ordinária.
O texto a ser votado pelos senadores acrescenta o parágrafo 3º ao artigo 401 da CLT, a fim de estabelecer multa para combater a diferença de remuneração verificada entre homens e mulheres no Brasil.
Em seu relatório, Paim ressalta que a discrepância salarial entre homens e mulheres é amplamente reconhecida e cabalmente demonstrada pelas estatísticas do trabalho.
“Em 2019, na média, as mulheres receberam 77,7% da remuneração dos homens. Essa é uma média agregada nacional e desconsidera significativas variações decorrentes de diversos fatores, como os geográficos (a discrepância é menor no Sudeste e mais elevada no Norte), a raça (a diferença é maior, como podemos imaginar, para as mulheres negras), e — curiosa, mas significativamente — a natureza das funções exercidas, sendo que a diferença para funções de chefia é ainda mais elevada que a média”, observa Paim.
Diferença tem aumentado
O senador destaca que essa diferença não tem sido reduzida. Pelo contrário: há uma lenta elevação desde 2016, que deve ter se acelerado durante o conturbado período da pandemia da Covid 19.
“Efetivamente, já temos dados que indicam que o desemprego decorrente da pandemia é mais elevado entre mulheres que homens, bem como sabemos que a participação feminina é mais elevada no setor de serviços, mais ampla e duramente afetado pela pandemia, comparativamente com os setores primário e secundário, mais resilientes e com participação masculina maior”, ressalta Paim.
O senador considera importante estabelecer mecanismos que ajudem a modificar essa situação, e esclarece que o objetivo do projeto é justamente estabelecer um desincentivo monetário significativamente elevado, de modo a beneficiar a condição remuneratória feminina por meio de pena pecuniária que torne a discriminação antieconômica.
“Por essa razão, a multa é fixada em valores tão elevados, não se trata apenas de dar uma indicação, mas de se demonstrar todo o peso da reprovação social ao empregador infrator. Entendemos que a proposição deve ser aprovada. Naturalmente, temos consciência de que a discrepância salarial de gênero tem profundas raízes sociais e culturais e que a mudança legislativa é incapaz, individualmente considerada, de eliminá-la. No entanto, nessa luta da mais elevada Justiça, qualquer contribuição positiva é válida”, conclui Paulo Paim em seu relatório.
Problema crônico
Segundo pesquisador da área de Economia Aplicada do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia) da FGV (Fundação Getulio Vargas), Daniel Duque, em entrevista, há um ano, à Agência Brasil, existe desvalorização de profissões que são majoritariamente ocupadas por mulheres. “Mais mulheres são formadas em profissões como licenciatura, pedagogia, enfermagem, odontologia, em relação a homens. E, mais homens são formados em cursos como engenharia, por exemplo.
Parte desse diferencial de homens e mulheres é atribuído a essas diferentes escolhas de cursos”, disse, e acrescentou, “provavelmente, o maior fator foi uma maior desigualdade de retorno entre essas profissões”.
Dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) de 2019 mostram que, entre as 10 carreiras de ensino superior com maior geração de postos de trabalho, as mulheres recebem, em média, salários menores em sete delas. A maior desvantagem foi encontrada no cargo de analista de negócios, com homens ganhando R$ 5.334 e mulheres, R$ 4.303, o equivalente a 80,67% do salário deles.
Segundo Duque, ao pagar menos às mulheres, o Brasil perde economicamente. “Quando se nega às mulheres oportunidades equivalentes às dos homens no mercado, a gente abre mão de cérebros. Estamos deixando de incorporar no mercado de trabalho no Brasil mulheres que seriam extremamente talentosas”, disse. “Estamos perdendo força produtiva por desigualdade entre gêneros e isso vai impactar a produtividade agregada brasileira e nosso desenvolvimento”.
FONTE: DIAP