No fim da tarde de quinta-feira, o marítimo Diogo Grobério, de 33 anos, era uma das dezenas de pessoas em busca do auxílio-desemprego no edifício da superintendência regional do Ministério do Trabalho e Emprego, no Centro do Rio de Janeiro. Três meses atrás, ele e mais cerca de 200 funcionários de uma empresa de apoio offshore receberam a fatídica notícia: com a redução de contratos com a Petrobras, a empresa fecharia as portas e eles seriam demitidos. Formado em engenharia, segundo oficial de náutica, Diego engrossou as estatísticas de desemprego da capital fluminense. De acordo com dados do Cadastro Nacional do Empregados e Desempregados (Caged), uma pessoa perde o emprego com carteira assinada na cidade a cada seis minutos. No primeiro semestre, o município registrou perda líquida (abertura menos fechamento) de 42.343 postos. Foi, de longe, o pior desempenho no país.
Segundo especialistas, o mercado de trabalho carioca sofre mais porque, além dos efeitos gerais da recessão, sofre os efeitos da crise fiscal do governo estadual, os cortes nos investimentos do setor de petróleo e o fim do ciclo dos grandes eventos esportivos - além da Olimpíada, o Rio recebeu jogos da Copa do Mundo de 2014 e da Copa das Confederações (2013). Assim como os demais trabalhadores da capital fluminense, Diego deparou-se com um mercado de trabalho saturado de oferta de mão de obra e escasso de vagas. A saída deve ser pela informalidade e a mudança de cidade. Ele sustentava a si e sua família com o salário de R$ 17.300 pilotando barcos de apoio offshore. Sua esposa, geóloga, está desempregada há um ano, depois de ser demitida ao fim da licença maternidade. "O dinheiro que economizei vai nos sustentar até o início de 2018. Se não conseguir emprego até lá, vou me mudar para perto da minha sogra em Ubatuba [litoral norte de São Paulo] e viver de bicos pilotando traineiras para turistas", disse o engenheiro. "Acho que mantendo um custo de vida baixo, é possível." Desde 2015, o Rio de Janeiro perdeu 263.651 postos de trabalho, o equivalente a 9,9% do estoque de 2014.
Além de intensa, essa crise é disseminada. Levantamento da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), com base no Caged, mostra que 17 de 24 segmentos econômicos na capital fecharam vagas no semestre. O setor de comércio e serviços foi pior, com perda de 30.839 mil postos, seguido da construção civil (fechamento de 5.512 vagas) e da indústria de transformação (redução de 5.109 postos). Willian Figueiredo, coordenador de Estudos Econômicos da Firjan, diz que comércio e serviços são afetados pela queda da renda real da população. Além da recessão e da inflação que achataram salários pelo país, o rendimento no Estado do Rio foi prejudicado pelos atrasos nos pagamentos do governo estadual aos seus servidores. "Os servidores estaduais formam uma categoria com renda acima da média e são grandes consumidores. Se os salários deles atrasam, a capital sofre", disse o economista, acrescentando que o emprego na construção civil foi afetado pelo fim do ciclo de obras metrô e BRT, além das construções residenciais.
Evelyn Calcino, de 27 anos, foi uma das cariocas a perder emprego no ramo de serviços. Ela trabalhava numa agência de aluguel de carro no aeroporto Santos Dumont, no Centro. Passada a euforia dos grandes eventos e com a queda do número de turistas, a locadora reduziu o quadro de funcionários - dispensou Evelyn e mais alguns.
"A agência de locação era um plano B para mim, que sou comissária de voo e não estava conseguindo emprego na área", disse Evelyn, que deve partir para um "plano C" até nova oportunidade. "Devo ajudar a minha mãe a fazer e vender salgados, ajudar nesse sustento."
O trabalho informal também foi a válvula de escape do massoterapeuta Gabriel Tavares Coelho, 34 anos, morador da Tijuca, zona norte do Rio. Há dois anos ele circula por agências de emprego em busca de colocação com carteira assinada - o que lhe garantiria benefícios como FGTS, 13º salário, auxílio desemprego. Ele ainda não encontrou essa sonhada estabilidade. "Imaginei que a Olimpíada incentivaria o emprego e me traria essa oportunidade, mas não trouxe. E agora, na crise, as pessoas cortam gastos relacionados ao bem estar, como a massagem. Minha renda caiu assim de R$ 3.200 para R$ 1.200", disse Gabriel, que oferece seu trabalho em praças públicas.
Os primeiros sinais de estabilidade do mercado de trabalho seguem distantes da capital fluminense. Bruno Ottoni, pesquisador da área de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), diz que a crise fiscal enfrentada pelo governo estadual torna difícil inclusive a tarefa de projetar uma inversão do mercado de trabalho do Rio. Para o especialista, a tendência é que a capital - assim como o Estado do Rio - demore mais do que outras cidades para sair da crise. "Setores como construção civil e naval ainda passam por muitas dificuldades. E não existe solução em vista para a situação fiscal fluminense. Sem a retomada de contratação de obras e serviços, a recuperação tenderá a ser mais lenta", disse Ottoni. A crise fiscal limita, por exemplo, a capacidade de atrair investimentos. Em abril, a cervejaria Ambev desistiu de construir uma fábrica de latas de alumínio e garrafas de vidro em Santa Cruz, no Rio, por causa das incertezas sobre a possibilidade de concessão de benefícios pelo Estado.
Uma das preocupações agora é que a crise fiscal se intensifique na prefeitura e piore o quadro geral da cidade. A concessionária Porto Novo, responsável pelo Parceria Público-Privada (PPP) da zona portuária do Rio, o Porto Maravilha, dispensou cerca de mil funcionários próprios e terceirizados por causa da falta de repasses de recursos previstas em contrato. Todos foram demitidos em julho.
Fonte: VALOR