Em meio à pressão no orçamento das empresas, e alta do diesel, o deslocamento de carga pela costa brasileira ganha espaço, e navegadoras já se preparam para novos contratos
São Paulo - A desaceleração na cabotagem durou pouco, depois de dois anos 'andando de lado', o setor aponta ter voltado a crescer a patamares anteriores à crise econômica. Além da leve retomada das importações, a revisão de custo nas empresas e o aumento do preço do combustível já começam a ajudar o aumento da demanda.
Com a maré positiva, a líder do mercado Aliança Navegação e Logística - com mais de 50% da participação na cabotagem do País - revisou suas projeções de crescimento para o ano, passando de algo em torno de 3% e 5% para 'dois dígitos', ou seja, ao menos 10% de crescimento. "Em 2015 e 2016 o mercado andou de lado, mas em 2017 está diferente", afirma o gerente geral de cabotagem e mercosul da Aliança Navegação e Logística, Marcus Voloch.
De acordo com ele, para se adaptar à nova demanda, a empresa aumentou em 6% a sua capacidade no primeiro semestre e a projeção é de ter um novo acréscimo significativo em 2018, caso o desempenho positivo se mantenha. "Ainda estamos estudando os investimentos necessários. A conversa é embrionária, mas podemos ter um possível aumento de capacidade com a troca por navios maiores no segundo semestre de 2018", explica Voloch.
Mesmo com retração significativa na movimentação dos carros chefes na cabotagem - eletroeletrônicos e duas rodas -, o executivo aponta que tem conseguido diversificar o perfil de carga atendido. "Temos visto aumento de plástico, resina, papel e celulose e bens de consumo", coloca. Segundo o executivo, há uma grande oportunidade de crescimento na movimentação de carga refrigerada e alimentos perecíveis em geral que não têm o costume de utilizar o modal. "Temos obtido um grande sucesso com supermercados do norte do Paraná e Amazonas. Muitos começam com produtos básicos, como sabão em pó e quando percebem que o navio chega sem atraso e sem avaria acabam utilizando mais", analisa.
Questionado sobre o aumento do preço do combustível, o executivo aponta que apenas o transporte até o porto deve ter impacto, mas não deverá provocar um aumento de custo significativo. Pelo contrário, de acordo com o gerente de produto marítimo da DHL Global Forwarding, Ricardo Carui, o aumento do preço do combustível para o modal rodoviário pode beneficiar a cabotagem, por deixar ainda mais evidente o preço competitivo do modal em rotas com mais de 1,5 mil quilômetros. "Uma rota que entendemos ter muito potencial [com este aumento] é a Santos-Manaus, ainda mais agora quando observa-se uma leve tendência no aumento da demanda por bens de consumo". Para ele, a mudança de um modal ao outro já ocorre há alguns anos e o aumento de custos dos combustíveis é mais um fator que deverá acelerar a tendência.
"As importações também voltaram a crescer e demandam bastante transbordo", complementa o especialista em transporte marítimo e sócio da consultoria Solve, Leandro Barreto.
Análise setorial
Para Barreto, o potencial de crescimento da cabotagem ainda é grande. "O que acontece é que os navios praticamente dobraram de tamanho [no longo curso] nos últimos cinco anos, só que os nossos terminais não recebem esses navios e aí entra a cabotagem", explica citando a pesquisa do Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos), que mostrava que, em 2015, para cada contêiner transportado na cabotagem haviam 6,5 com potencial de migração da rodovia para o segmento. "As perspectivas são excelentes. Não à toa a venda da Mercosul Line [para a CMA CGM, ainda em aprovação] foi tão rápida."
Questionado sobre o interesse de outras companhias no mercado, ele destaca que a barreira de entrada ainda é grande. "Ou você constrói navio no Brasil ou você importa o navio novo. Para trazer os navios o investimento é muito alto, porque você precisaria de pelo menos quatro navios para ter um serviço decente. Somado a isso tem cerca de 40% de imposto e o valor de compra dos contêineres. É um investimento bilionário, não é para qualquer um. Às vezes é mais fácil entrar com a aquisição de uma empresa", diz. Mesmo assim, ele destaca que para não desequilibrar a relação de oferta e demanda hoje, a entrada de uma nova empresa deveria ser gradativa. "Se você chegar de uma vez destrói o mercado", explica Barreto.
O especialista conta ainda que um desafio grande na hora de atrair capital estrangeiro - seja para aportes em infraestrutura ou em transporte - é a falta de padronização nas estatísticas do setor de cabotagem.
Ele cita que os dados oficiais da Agência reguladora do setor não calcula alguns detalhes importantes, como a carga de transbordo em navios de longo curso quando não há espaço entre armadores nacionais, algo cada vez mais recorrente. "Como vamos convencer alguém a fazer um investimento alto e que precisa apresentar um projeto a um banco internacional sem informações confiáveis e detalhadas? A falta de detalhe distorce a informação."
Fonte: Diário Comércio, Indústria e Serviços