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Mecanismos de fomento à inovação são essenciais para o desenvolvimento do Brasil, mas nos últimos anos o cenário mudou drasticamente
A inovação é um processo cada vez mais relevante para o desenvolvimento econômico e social de um país. Para impulsioná-la e tornar o país mais competitivo no cenário internacional, é necessário contar com mecanismos de fomento que estimulem o desenvolvimento de soluções disruptivas e colaborativas, capazes de gerar valor para a sociedade e para as empresas. Nesse sentido, é fundamental que esses mecanismos estejam sempre atentos à iniciativa privada, já que o locus principal da inovação é o mercado. Tratei deste tema em nota técnica da 25ª Carta de Conjuntura do Observatório Conjuscs, disponível em Notícias USCS Cartas do Observatório Conjuscs – Notícias USCS.
No Brasil, os mecanismos públicos de fomento à inovação em empresas têm tradicionalmente priorizado estimular dispêndios em atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Alguns dos principais mecanismos são a Lei do Bem, editais de subvenção econômica, programas de crédito subsidiado, contratação de mestres e doutores e parceria empresa-universidade. Além disso, alguns setores, como o de energia elétrica, petróleo e gás e informática, possuem mecanismos próprios de investimento em P&D de forma compulsória.
Uma outra vertente de mecanismos públicos de fomento à inovação no país tem colocado foco na criação e financiamento de empresas de base tecnológica ou as chamadas startups. Esse financiamento se dá especialmente por meio de mecanismos de estímulo à atividade de venture capital, crédito subsidiado para empresas nascentes e, inclusive, programas de estímulo à atividade de P&D em pequenas empresas.
Adaptando-se à nova realidade da inovação no país
Os mecanismos de fomento à inovação são essenciais para o desenvolvimento do país, mas nos últimos anos o cenário mudou drasticamente. A inovação é cada vez mais colaborativa e resultado de ecossistemas, exigindo uma atualização dos sistemas para atender novas demandas.
A parceria entre empresas e startups tem se mostrado tendência crescente no Brasil, com mais de 70 mil contratos de open innovation estabelecidos desde 2016, segundo dados do Ranking 100 Open Startups. O potencial de crescimento da inovação aberta no ecossistema brasileiro é imenso, mapeando cerca de 25 mil startups abertas ao relacionamento com o mercado corporativo e 7 mil corporações que as buscam ou buscaram como parceiras.
O Ranking 100 Open Startups, que mede e premia a prática de inovação aberta no país e na América Latina, evidencia o sucesso brasileiro. Entre 2016 e 2021, foram premiadas 728 startups, das quais 82 atingiram o status de scaleup, quatro captaram mais de R$ 500 milhões em investimento e uma tornou-se unicórnio, com as premiadas nesse período captando mais de R$ 9 bilhões em investimentos. O grupo das TOP 100 Open Startups premiadas na edição de 2016 atingiu valorização de mercado de R$ 10 bilhões, tendo formado até o momento 13 scaleups e uma unicórnio, em apenas seis anos.
O ecossistema no país atingiu a massa crítica e o efeito de rede, elementos que sustentam as métricas de inovação em ambientes maduros. A métrica da proporção 100-10-1, muito conhecida do venture capital, onde, a cada 100 startups que recebem apoio e investimento, dez se tornam empresas relevantes e uma se torna líder de categoria de mercado, pode ser aplicada por aqui. Tomando como base o desempenho da rede, com o volume de negócios gerados em 2022, é possível projetar que o batch atual irá produzir algo em torno de 300 scaleups e 30 startups capazes de atingir status de unicórnio em menos de uma década.
Os resultados demonstram que a prática de open innovation é muito benéfica. No início do movimento 100 Open Startups, havia muito ceticismo sobre a aproximação em etapas iniciais com corporações maduras. Na época, o principal argumento contra a prática era de que as corporações, por não possuírem uma cultura aberta à inovação, poderiam mais prejudicar do que acelerar o desenvolvimento. O que aconteceu, no entanto, é que o volume de empresas se abrindo ao mesmo tempo criou uma comunidade de prática que possibilitou o aprendizado em rede, e então formou-se uma corrida pelo aprimoramento de programas e processos de open innovation.
Mas quais têm sido os resultados para as corporações?
Hoje, podemos afirmar que, se uma corporação fizer uma boa gestão de open innovation e formar um ecossistema, ela terá excelentes resultados, pois isso já ocorre. A boa gestão implica em compreender que ele não deve ser encarado como uma “mina de ouro” a ser extraída, e sim terreno fértil a ser cultivado. No novo jogo da inovação, captura valor aquele que é capaz de contribuir e compartilhar valor.
Dentro desse novo cenário, extremamente vibrante e dinâmico, com milhares de corporações e startups conectadas entre si, os modelos lineares de open innovation, baseados na ideia de identificar desafios e buscar resolvê-los, não fazem mais o mesmo sentido que faziam há pouco tempo. Para avançar e produzir resultados, as corporações precisam adotar novos modelos que incorporem a visão de gestão.
Diante desse contexto, é fundamental que os mecanismos de fomento à inovação no Brasil olhem cada vez mais para a inovação que se dá por meio da colaboração não só entre academia e empresas maduras, mas também entre corporações e startups.
Os resultados dos últimos anos demostraram que esse modelo contribuiu efetivamente para o desenvolvimento de soluções inovadoras e disruptivas em diversos setores do mercado e da sociedade, além de fomentar a competitividade das empresas no mercado global.
Para que essas parcerias sejam cada vez mais efetivas, é necessário investir em novos mecanismos de fomento e à prática de open innovation, promovendo a colaboração e o compartilhamento de recursos entre empresas, startups, universidades, institutos de pesquisa, investidores privados e outros atores relevantes. Por isso, é fundamental que os mecanismos de fomento à inovação também promovam a criação e o fortalecimento desse ecossistema, por meio de políticas públicas e infraestrutura adequada.
Cenário promissor para a inovação
O cenário para o investimento em inovação não poderia ser melhor. Historicamente, os anos em que ocorre a troca de governo nos níveis federal e estadual, como é o caso de 2023, são sempre momentos adequados e propícios para a revisão de políticas públicas de incentivo à ciência, tecnologia e inovação.
Outro indicador positivo foi destacado na reportagem “Bases para reconstruir a capacidade científica do Brasil”, publicada pela edição 324 da revista FAPESP, de fevereiro de 2023. O texto destaca a expectativa que há em torno da recuperação dos investimentos em ciência, tecnologia e inovação nos próximos anos, considerando, por exemplo, que o montante de recursos não reembolsáveis do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), destinados a projetos científicos e inovação, teve o pior patamar histórico entre 2019 e 2021.
Na mesma toada, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) já indicou que deve dobrar o crédito destinado a escolas, universidades e startups. A ideia da entidade é apoiar a inovação no país e contribuir para o desenvolvimento econômico e social.
O presidente do BNDES afirmou que a nova meta do banco é conceder apoio à modernização tecnológica e aos novos negócios, e a entidade pretende investir cerca de R$ 9 bilhões em projetos de inovação e empreendedorismo nos próximos anos.
Em resumo, o momento de olhar para as novas necessidades e modelos de inovação é agora.
Os mecanismos de fomento à inovação no Brasil devem levar em consideração a tendência crescente de parcerias entre corporações e startups, incentivando a colaboração e o desenvolvimento de soluções inovadoras e disruptivas.
Além disso, é necessário investir em mecanismos de fomento ao próprio ecossistema e à prática de open innovation, para que o potencial se concretize, gerando ganhos inestimáveis à sociedade, por meio do surgimento e crescimento de novas empresas, geração de empregos, além do desenvolvimento de inovações disruptivas, que podem impactar positivamente a sociedade e o mercado no médio e longo prazo.
Bruno Rondani é fundador e CEO da 100 Open Startups. Engenheiro e mestre pela Unicamp e doutor pela FGV
FONTE: REDE BRASIL ATUAL