IMAGEM: RIO MADEIRA/ANTAQ
A ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) vai revisitar e atualizar os estudos de concessão da hidrovia do Rio Madeira a partir do próximo ano. Alvo de forte resistência da bancada do Norte no Congresso, o projeto deverá incorporar nessa revisão, por exemplo, um subsídio maior para o transporte de granéis líquidos combustíveis, conforme pedido do MPor (Ministério de Portos e Aeroportos). A Casa Civil também solicitou que seja feita uma avaliação mais profunda sobre a segurança das embarcações que trafegam na hidrovia.
O tema conversa com a chamada PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da Segurança Pública, proposta do Executivo que atribui à atual PRF (Polícia Rodoviária Federal) o policiamento ostensivo em rodovias, ferrovias e hidrovias federais e que virou um dos temas da disputa eleitoral que acontece no próximo ano.
A concessão no Rio Madeira, relevante para o escoamento de grãos e para o transporte de combustível que abastece o estado de Rondônia, iria estrear a nova política hidroviária do governo. Mas a oposição de representantes políticos da região, apoiados por determinados segmentos empresariais, esfriou o projeto. Assim, a concessão no Rio Paraguai passou na frente e hoje aguarda aval do TCU (Tribunal de Contas da União) para o edital ser publicado.
A resistência da bancada do Norte até o momento, contudo, não arrefeceu. Na terça-feira (2), durante audiência pública realizada na Comissão de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional da Câmara dos Deputados, parlamentares do Amazonas e Rondônia que se pronunciaram foram unânimes em rejeitar o andamento do projeto. Já associações do setor privado presentes apoiaram a ideia por vislumbrar mais investimento e perenidade na navegabilidade da hidrovia a partir da concessão.
Dentro da ANTAQ, o projeto ganhou um primeiro EVTEA (Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental) em 2024 e passou por uma tomada de subsídios, encerrada neste ano. Foi lá, por exemplo, que a sugestão de descontos maiores para determinados tipos de carga surgiu.
40 centavos para combustíveis
O estudo feito até o momento já indicava uma tarifa considerada baixa, de 80 centavos de real por tonelada. Chegar a esse patamar foi possível no Madeira porque há previsão do uso de recursos aportados pela Eletrobras, agora Axia Energia, na CDN (Conta de Desenvolvimento da Navegabilidade), compromisso assumido na privatização.
Mesmo antes de produzir o “EVTEA 2.0”, como o superintendente de Estudos e Projetos Hidroviários da ANTAQ, Eduardo Queiroz, classificou os novos estudos que serão feitos, a ANTAQ já simulou que a tarifa para os granéis líquidos de combustíveis pode cair para 40 centavos por tonelada com um subsídio de 50%, conforme sugerido pelo MPor, indo a 86 centavos a cobrança para as demais cargas (com subsídio de 7,5%).
Secretário Nacional de Hidrovias do MPor, Otto Luiz Burllier, lembrou também na audiência que, mesmo com a cobrança de tarifa – restrita ao transporte de grandes comboios –, haverá uma redução total de 24% do frete ao longo do ano, proporcionada pelos investimentos e o consequente funcionamento integral da hidrovia.
Apesar dos benefícios apontados, os parlamentares mantiveram críticas ao projeto. Um deles foi o senador Jaime Bagattoli (PL-RO). “Na hidrovia do Madeira, se tiver que ser feito algo nela, tem que ser uma responsabilidade do governo federal. Agora, mais uma privatização? Nós políticos vamos fazer o que no Brasil?”, questionou ao citar o uso amplo de concessões para gestão e manutenção de ativos federais. O deputado Sidney Leite (PSD-AM) disse também que não haveria garantias de que as comunidades ribeirinhas não seriam prejudicadas com o projeto.
A ANTAQ e o MPor reforçaram, por sua vez, que a modelagem isenta os ribeirinhos, o uso para turismo, pesca, para o transporte de passageiros e para cargas de pequena lavoura, sendo a cobrança voltada para grandes comboios. Ainda que com as explicações, a contrariedade ao projeto se manteve entre os parlamentares que se manifestaram.
Respaldo
O projeto, por outro lado, foi endossado por entidades empresariais presentes na audiência, entre elas a Fiero (Federação das Indústrias do Estado de Rondônia), a ATP (Associação de Terminais Privados) e a Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais Segurança).
Já o representante da Aprosoja (Associação Brasileira dos Produtores de Soja) de Rondônia, Marcelo da Silva, pediu a atenção do governo a alguns aspectos da modelagem, como o tipo de dragagem, e que a cobrança da tarifa só seja implementada após a comprovação efetiva do investimento na hidrovia, algo que já está contemplado, de acordo com o governo.
Ele também sugeriu a criação de uma comissão fiscalizadora tripartite. “Pelo setor, o anseio é que tenhamos uma hidrovia operável. Se vai ser concessionária ou não, não sei (…) Precisamos que se invista para ter uma hidrovia navegável em doze meses do ano”, disse Silva.
Segundo ele, a Aprosoja RO integra um grupo de trabalho formado por nove entidades para discutir o projeto. Entre elas, a APRON (Associação dos Pecuaristas de Rondônia), a FAPERON (Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Rondônia), a Fecomércio e o Sindipetro.
Pela modelagem inicialmente construída, o prazo da concessão será de 12 anos, com Capex de R$ 109 milhões até o quarto ano, e Opex de R$ 38,6 milhões anuais, totalizando R$ 477,7 milhões.
Segurança
Um dos ofícios que chegaram à ANTAQ pedindo uma nova avaliação nos estudos partiu da Secretaria Especial do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos) da Casa Civil. Nele, a pasta diz que recebeu informações de partes interessadas no projeto sobre a necessidade de endereçar nos estudos questões relacionadas à segurança das embarcações que circularão na hidrovia.
Segundo o modelo construído até o momento, a melhoria da segurança na navegação seria atribuída a um efeito indireto da concessão – em especial pela implantação de um serviço de monitoramento. A cada 50 quilômetros dos mais de mil quilômetros da concessão, o futuro operador terá de instalar antenas para acompanhar e gerenciar todo o tráfego de embarcações que passam pela hidrovia, gerando informações que podem ser repassadas aos órgãos de segurança pública.
Mas a avaliação na Casa Civil é de que pode haver espaço para outras iniciativas serem analisadas. O projeto também precisaria endereçar mais claramente quais forças de segurança serão demandadas ali, tema que hoje acaba perpassado pela PEC da Segurança Pública.
Em outro ofício, este enviado pelo MPor em novembro, a pasta pediu que a agência reguladora promova uma análise técnica e aprofundada das contribuições obtidas na tomada de subsídios e nas reuniões técnicas realizadas com os stakeholders.
“Recolhemos várias informações do setor produtivo, da Polícia Federal, da Marinha do Brasil, MPor pediu também que revisitasse questão do subsídio, incluíssemos de fato na modelagem. Então o estudo está paralisado para nova rodada, será revisitado a partir do ano que vem depois de todos esses subsídios”, reforçou o superintendente da ANTAQ.
FONTE: INFRA
