FOTO: ROBERTO MOREYRAoto: Roberto Moreyra
Foto: Roberto Moreyra
Para o ministro Edson Fachin, a modalidade do trabalho intermitente é inconstitucional. O entendimento foi proferido na tarde desta quarta-feira, 2, em julgamento que está no plenário do STF acerca desta modalidade de contrato de trabalho estabelecido pela reforma trabalhista.
Fachin, relator da ação, entende que os dispositivos da reforma trabalhista não observam as garantias fundamentais mínimas do trabalhador e promovem a instrumentalização da força de trabalho humano, além de ameaçar a saúde física e mental do trabalhador. O julgamento continua amanhã nesta quarta (3).
Ação
A ação foi ajuizada pela Fenepospetro - Federação Nacional dos Empregados em Postos de Serviços de Combustíveis e Derivados de Petróleo para questionar dispositivos da chamada reforma trabalhista que preveem o contrato de trabalho intermitente.
De acordo com a entidade, o trabalho intermitente é um contrato em que a prestação de serviço, com subordinação, não é contínua, ocorrendo alternadamente períodos de trabalho e de inatividade, podendo ser determinado por hora, dias e meses, sem jornada fixa.
Muito embora tenha sido introduzido no ordenamento jurídico sob o pretexto de ampliar a contratação de trabalhadores em um período de crise que assola o país, a Federação entende que, na realidade, o contrato intermitente propicia a precarização da relação de emprego.
Relator
O ministro Edson Fachin julgou a ação parcialmente procedente, no sentido da invalidade da norma. Segundo entende o relator, o modelo da intermitência impõe uma realidade na qual o trabalhador não pode planejar sua vida financeira e, assim, estará sempre em situação de precariedade e fragilidade social.
"Esta modalidade de contrato de trabalho não se coaduna com a dimensão da dignidade da pessoa humana como condição primária de ter direitos a gozar dos direitos sociais fundamentais trabalhistas decorrentes da sua condição de trabalhador."
Para o ministro Fachin, a criação de uma modalidade de um contrato de trabalho que não corresponde a uma real probabilidade de prestação de serviço e pagamento de salário ao final de um determinado e previsível período não passa por uma filtragem constitucional. "Mas representa uma ruptura com o sistema constitucional que não agasalha essa ordem de ideia vertida na legislação", disse.
"A pretexto de garantir maior segurança no emprego, é possível que essa modalidade de contratação redunde em gerar mais insegurança jurídica."
O ministro explicou que a proteção jurídica do trabalho é induvidosamente um direito fundamental social, de modo que sempre que são necessários ajustes, chama-se ao debate questões atinentes à flexibilização das relações jurídico-sociais. Fachin explicou um conceito que tem sido estudado, chamado de flexisegurança: estratégia integrada para melhorar a flexibilidade e segurança no mercado de trabalho, nos quais são reapresentados em momentos de crise. Nesse sentido, S. Exa. ressaltou que a relação jurídica existente no contrato intermitente deve ser interpretada a luz dos direitos sociais trabalhistas, com a fixação, por exemplo, de horas mínimas a serem trabalhadas.
Em suma, ante a ausência de fixação de horas e rendimentos mínimos, o ministro entendeu pela inconstitucionalidade dos dispositivos.
Sustentações orais
O advogado e membro do corpo técnico do DIAP, Dr. Hélio Stefani Gherardi, pela requerente Fenepospetro, entende que a reforma trabalhista, do jeito que está, coloca o trabalhador como mero objeto de ferramenta à disposição da atividade econômica a hora que ela bem pretender. Por fim, pediu a declaração da inconstitucionalidade da norma.
De acordo com a advogada que também faz parte do corpo técnico do DIAP, Dra. Zilmara Alencar, a CNTI - Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria, afirmou que a inovadora contratação da reforma trabalhista traduz a regulamentação da disponibilidade frequente e permanente de trabalhadores, sob uma subordinação sem garantia do recebimento do salário mínimo vital. Ao explicar que a lei não prevê um número mínimo de horas trabalhadas, a advogada pediu a inconstitucionalidade da medida.
Por outro lado, o AGU José Levi entende que é equivocado discutir a precarização do trabalho com o trabalhar intermitente. Segundo o advogado, a precarização é a informalidade. José Levi defendeu que a reforma trabalhista não trocou direitos dos trabalhadores por empregos e não buscou aumentar o nível de emprego a custa dos direitos dos trabalhadores. "Validar a legislação em definitivo é potencializar a nossa capacidade de recuperação em face o momento vivido", finalizou.
Na mesma linha, a CNI - Confederação Nacional da Indústria, pelo advogado Admar Gonzada Neto defende que não existe a alegada inconstitucionalidade. O advogado argumentou que o mundo passa pela 4ª revolução industrial e, em meio a esse cenário, é preciso conciliar interesses. "É preciso gerar emprego e renda para o trabalhador (...) temos 14 milhões de desempregados", assim para o advogado é preciso aumentar as opções para se adaptar ao mundo moderno, dentre elas, o trabalho intermitente.
Em sentido diverso, o Ricardo Quintas Carneiro, representante da CUT - Central Única dos Trabalhadores, afirmou que o contrato intermitente produz um novo modelo de trabalho que reduz o trabalhador a um fator de produção que deve ser utilizado nas exatas medidas da demanda do capital e, assim, não requer pré-definições contratuais. "Se impôs, pelo contrato de trabalho intermitente, a percepção de uma remuneração existencial mínima que deixa de ser uma garantia", afirmou.
O Instituto para Desenvolvimento do Varejo, pela advogada Vilma Toshie Kutomi, entende que o trabalho de intermitente é constitucional, pois foi a opção do legislador de tirar milhões de trabalhadores da informalidade. Para a advogada, o que a norma fez foi uma cobertura legal para aqueles que já fazem serviços descontínuos.
O advogado Jorge Gonzaga, representante da Anup - Associação Nacional das Universidades Particulares, entende que o contrato de trabalho intermitente é uma alternativa viável para a área da educação. Segundo explicou o advogado, os professores são PJs e o contrato de intermitência traz a formalidade para os docentes que, até então, não a tinham prevista em lei. Por fim, explicou que essa modalidade de contrato privilegia a extensão do vínculo empregatício.
O Grupo de Pesquisa de Trabalho da Constituição e Cidadania, pela Gabriela Neves Delgado, defende a inconstitucionalidade da norma. Segundo ressaltou a causídica, a própria Constituição estabeleceu a jornada de 6h, por conta do mal para o organismo humano quando se trabalha em jornadas que não são estáveis. Por fim, a advogada trouxe exemplos de países que adotam a contratação intermitente de forma restrita.
A Anamatra opinou pela procedência da ação ao invocar princípios da CF que garantem o salário mínimo em qualquer tipo de contrato de trabalho. Para a entidade, não é possível sustentar que um trabalhador não terá o direito de um salário mínimo para a garantia de sua sobrevivência.
FONTE: MIGALHAS