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Restringir nomeações para a direção de estatais não viola a Constituição, além de garantir a boa governança e diminuir a possibilidade de casos de corrupção e de conflitos de interesse.
O entendimento é do Plenário do Supremo Tribunal Federal, que decidiu nesta quinta-feira (9/5) manter dispositivos da Lei das Estatais (Lei 13.303/2016).
A decisão derruba o que ficou definido em liminar dada pelo ministro Ricardo Lewandowski (aposentado), relator do caso. Ele suspendeu trechos da norma em março de 2023. O STF entendeu, no entanto, que as nomeações feitas entre a liminar de Lewandowski e a decisão desta quinta devem ser mantidas.
Venceu a divergência aberta pelo ministro André Mendonça, que considerou a lei constitucional. Ele foi acompanhado por Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Luiz Fux e Cármen Lúcia. Entenderam pela inconstitucionalidade o relator, ministro Ricardo Lewandowski (aposentado), Flávio Dino e Gilmar Mendes.
A ação julgada foi ajuizada pelo PCdoB e questiona o artigo 17, parágrafo 2, incisos I e II da, da Lei das Estatais. O trecho impede a nomeação de ministros de Estado, secretários estaduais, secretários municipais, dirigentes estatutários de partidos políticos, parlamentares, representantes do órgão regulador ao qual a empresa esteja sujeita e ocupantes de funções especiais ou de direção e assessoramento superior na administração pública.
Também segundo a norma, quem atuou, nos últimos 36 meses, como participante de “estrutura decisória de partido político ou em trabalho de organização, estruturação e realização de campanha eleitoral” não pode ser indicado para conselho de administração e para a diretoria de estatal.
Segundo a legenda, essas restrições impedem a atuação de profissionais com habilidades e experiências necessárias para as finalidades públicas das empresas, além de barrar a livre concorrência de candidatos preparados. O Supremo discordou.
O tribunal definiu seguinte tese:
“São constitucionais as normas dos incisos I e II, do parágrafo 2º, do artigo 17, da Lei 13.303/2016 que impõem vedações a indicação de membros para o conselho de administração e para a diretoria de empresas estatais”.
Voto vencedor
Mendonça afirmou que os dispositivos previstos na Lei das Estatais garantem uma boa governança, diminuem a possibilidade de casos de corrupção e impedem eventuais conflitos de interesse.
“Os dispositivos em questão não só foram editados em atenção a reclamos da sociedade brasileira, mas também em função de padrões de governança pública e, de modo especial, da própria governança das estatais no mundo todo.”
O ministro também disse que a lei está em consonância com os “standards internacionais” de governança pública. Ainda segundo ele, a norma privilegia os princípios da moralidade, da impessoalidade, da eficiência e da transparência.
“Após a Lei das Estatais, houve uma mudança de comportamento em termos de eficiência. Temos uma redução significativa da situação de risco de corrupção”, prosseguiu o ministro.
“O melhor remédio contra a corrupção é a prevenção. Temos uma dificuldade natural de, no âmbito de um processo judicial ou administrativo, levar a cabo condenações, sob o risco de se fazer não justiça, mas justiçamento”, concluiu.
Ao acompanhar Mendonça, o ministro Nunes Marques disse que a lei tem como finalidade evitar interferências e conflitos de interesse de natureza política na administração de empresas públicas e sociedades de economia mista.
O ministro, no entanto, ficou vencido em uma proposta de reduzir de 36 para 21 meses o prazo de quarentena previsto na lei.
“As empresas estatais saem necessariamente em desvantagem tanto na seara da eficiência como da ética. E eficiência é afetada por diversos fatores: ela sofre importantes limitações nos processos de contratação e dispensa de serviços e pessoas, a direção é constantemente modificada ao sabor das mudanças dos governos; os gestores nem sempre são recrutados por critério de competência e os conselhos de administração, quando existem, são frequentemente preenchidos segundo critérios políticos”, disse.
Relator
Em seu voto, Lewandowski, relator da matéria, argumentou que a lei extrapolou nas vedações à indicação de executivos de estatais. O ministro suspendeu, em decisão monocrática, os trechos da norma que restringem as nomeações.
Segundo o ministro, as restrições violam o princípio da isonomia e o preceito, essencial em uma democracia, segundo o qual ninguém pode ser privado de direitos por motivo de convicção política (artigo 5º, caput e VIII, da Constituição). Uma restrição do tipo só poderia ser estabelecida pelo texto constitucional, e não por lei, entendeu ele.
O ministro conferiu interpretação conforme à Constituição ao inciso II do parágrafo 2° do artigo 17 para estabelecer que a proibição de militantes de partidos políticos serem indicados para a direção de estatais limita-se àquelas pessoas que ainda participam da estrutura decisória de alguma legenda ou de trabalho vinculado a organização, estruturação ou realização de campanha eleitoral.
Ao acompanhar Lewandowski, o ministro Flávio Dino entendeu que se as restrições à atuação de integrantes do Legislativo e do Judiciário nas estatais constam na Constituição, vedações envolvendo o Executivo também deveriam estar no texto constitucional, e não em lei infraconstitucional.
“Não podemos ter um sistema de vedações para o Legislativo e Judiciário, mas para o Executivo ter outro”, afirmou o ministro.
Ainda segundo ele, a norma, na prática, demoniza a participação política nas empresas.
“Não existe canonização por concurso público e não existe demonização pela participação na política. Portanto, é falsa a ideia de que qualquer indicação ‘técnica’ resultará em um padrão mais alto de probidade do que uma indicação política.”
Quanto ao inciso I do parágrafo 2º do artigo 17, Dino deu interpretação conforme à Constituição para vedar apenas que ministros de Estado assumam estatal supervisionada pela pasta que chefiavam ou que representante de órgão regulador assuma empresa pública que estava sujeita a esse mesmo órgão.
Gilmar considerou que a restrição dificulta o acesso a cargos públicos e a execução do programa político dos partidos que vencem nas urnas.
“Partidos não funcionam como forças de oposição ou tensão com o interesse público. Pelo contrário, constituem elementos de convergência e consolidação dos ideais políticos da sociedade em projetos que disputam as eleições”, afirmou.
FONTE: CONJUR