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Quase 90% dos trabalhadores eram de cidades da região, como Salinas das Margaridas, Nazaré, Santo Antônio de Jesus e Maragojipe. Esta foi a mais atingida, com 3.588 vagas fechadas em 2015 —75% dos empregos formais da cidade.

O frenesi com a obra levou à abertura de cerca de 7.000 empresas na região. Desde o começo da recessão, porém, entre 2014 e o início de 2016, R$ 96 milhões só em salários deixaram de circular.

Comerciantes que lucraram no auge do estaleiro, de 2012 a 2015, foram à bancarrota. Hoje, ruas esvaziadas, estabelecimentos fechados e imóveis à venda ou para alugar retratam o desalento local.

O empresário Manoel dos Santos, o Bira, investiu R$ 3 milhões para ampliar o hotel Ponto Dez, o qual mantém em São Roque do Paraguaçu desde 2005, mas paralisou a obra com 80% de conclusão após os primeiros rumores da Lava Jato.

A ideia era aumentar de 29 para 103 o número de quartos. Bira não só não concluiu as obras como teve de fechar outra pousada, com 21 quartos.

"Estamos pela misericórdia para não fechar as portas. Que Deus ilumine a cabeça do próximo governante, pois, apesar de privado, o estaleiro depende de investimento público."

Em uma tarde de segunda, quando a reportagem visitou o distrito, o restaurante Point do Churrasco, de Pedro Dias, 39, estava fechado.

Mesas vazias tomavam o lugar dos clientes que consumiam até 300 refeições por dia.

À medida que a construção do estaleiro avançava, Pedro aplicou R$ 2 milhões para aumentar o espaço, além de subir quatro andares para uma pousada com 42 quartos e empregar 12 pessoas.

"A gente se empolgou com o estaleiro. Teve gente que caiu em depressão por causa de dívidas."
Sócio da Jereré Tur, do ramo de transporte, Antônio Adelson do Rosário, 54, chegou a ter 40 veículos —28 deles próprios, entre micro-ônibus, vans e carros de passeio— e contratou 60 funcionários.

Atualmente, a frota é de 14 veículos, o quadro é de cinco funcionários, e o contrato com o estaleiro chega a apenas 10% do que representava. "Tive de vender veículos que já havia quitado para pagar dívidas e demitir funcionários."

Com a falta de perspectiva, voltar a tirar o sustento do rio tem sido uma das alternativas —caso de Joilson Borges, 49, pai de duas filhas, que trabalhou no estaleiro de 2012 a 2015.

Antes pescador, Borges foi capacitado para trabalhar como operador de guindaste, período em que ganhava R$ 2.800. Nesse intervalo, reformou a casa, comprou um terreno e se habituou a uma vida mais confortável.

Ele voltou a depender da pesca. "Aqui, em São Roque, toda a comunidade melhorou de vida. Só criança que não trabalhava", recorda, enquanto observa o pôr do sol.

"Agora, saio para pescar. Faço qualquer biscate. A pesca é incerta. Quando é boa, a gente vende. Do contrário, garante ao menos o que comer."

A reportagem percorreu as instalações da Enseada —marca adotada desde agosto passado, como parte do reposicionamento dos negócios da —Odebrecht, uma área de 1,6 milhão de metros quadrados e R$ 3 bilhões investidos.

No lugar do barulho de máquinas e de trabalhadores, um silêncio quase sepulcral se espalha pela instalação de quinta geração (das mais modernas no mundo). Há 50 funcionários, a maioria na manutenção de máquinas.

O maior símbolo do local, o superguindaste Goliath, de 160 metros de altura (um prédio de 50 andares), vão de 130 metros e capaz de içar 1.800 toneladas, nem chegou a operar. O estaleiro não produziu uma embarcação sequer.

Isso porque a principal cliente, a Sete Brasil --que havia encomendado seis das 28 sondas para a Petrobras explorar o pré-sal—, entrou em declínio na fase inicial da Lava Jato

Isso atingiu vários estaleiros pelo Brasil, até mesmo a Enseada, com quem tem uma dívida de mais de R$ 2 bilhões.

Com as denúncias do envolvimento de executivos da Sete —que também era 10% da Petrobras— no pagamento de estaleiros brasileiros que construiriam as sondas, o BNDES vetou empréstimo à empresa.
A recuperação judicial foi pedida em 2016.

A situação instável abala trabalhadores como o operador de máquina de corte Jailson Pedreira, 37, há cinco na Enseada. Ele foi um dos cem enviados para um programa de transferência de tecnologia na Kawasaki, no Japão.

"A gente fica triste porque isto aqui é um sonho para a vida toda. Que os projetos voltem logo para a empresa dar uma guinada."

Na tentativa de salvar o negócio, a Enseada apresentou à Justiça do Rio, em 2017, um pedido de homologação de plano de recuperação extrajudicial, que foi aceito pela 6ª Vara Empresarial do estado.

A companhia ampliou a área de atuação ao entrar na disputa internacional com mais oito países para tocar um projeto da Marinha, que prevê investir, em oito anos, US$ 1,6 bilhão (R$ 6 bilhões), na aquisição de quatro corvetas.

Porém, no ramo de petróleo o principal obstáculo foi a medida do governo Michel Temer de reduzir para 25%, nos setores de óleo e gás, a exigência de conteúdo local.

"O governo federal não pode abrir tanto o mercado para que as empresas que venham explorar petróleo no Brasil tragam navios da China. Até a Petrobras tem feito isso", diz o presidente da Enseada, Maurício Almeida. 

"Será a falência da indústria naval, única a competir com o mercado asiático nesses moldes."

Em nota, a Petrobras rebateu Almeida, ao dizer que "prioriza, na contratação de sondas e plataformas, as ofertas mais competitivas economicamente e que atendam aos requisitos de integridade exigidos pela companhia".

O Ministério de Minas e Energia não se manifestou.

Paralisação da Enseada na esteira da Lava Jato extingue vagas e empreendimentos

"Hoje, São Roque do Paraguaçu é uma cidade fantasma, mas, há pouco, era bonito ver aquele mar de gente chegar do trabalho", relembra o desempregado Alexandre Chaves, 34.

Nessa época, o estaleiro Enseada Paraguaçu levava prosperidade ao distrito no município de Maragojipe, recôncavo da Bahia.

Erguido pelo consórcio Odebrecht, Kawasaki, OAS e UTC, o empreendimento caiu em desgraça em 2014 após três das empresas —exceto a japonesa— serem denunciadas na Operação Lava Jato, ao lado da Sete Brasil, em uma crise que paralisou o estaleiro e extinguiu 7.462 empregos diretos.

Quase 90% dos trabalhadores eram de cidades da região, como Salinas das Margaridas, Nazaré, Santo Antônio de Jesus e Maragojipe. Esta foi a mais atingida, com 3.588 vagas fechadas em 2015 —75% dos empregos formais da cidade.

O frenesi com a obra levou à abertura de cerca de 7.000 empresas na região. Desde o começo da recessão, porém, entre 2014 e o início de 2016, R$ 96 milhões só em salários deixaram de circular.

Comerciantes que lucraram no auge do estaleiro, de 2012 a 2015, foram à bancarrota. Hoje, ruas esvaziadas, estabelecimentos fechados e imóveis à venda ou para alugar retratam o desalento local.

O empresário Manoel dos Santos, o Bira, investiu R$ 3 milhões para ampliar o hotel Ponto Dez, o qual mantém em São Roque do Paraguaçu desde 2005, mas paralisou a obra com 80% de conclusão após os primeiros rumores da Lava Jato.

A ideia era aumentar de 29 para 103 o número de quartos. Bira não só não concluiu as obras como teve de fechar outra pousada, com 21 quartos.

"Estamos pela misericórdia para não fechar as portas. Que Deus ilumine a cabeça do próximo governante, pois, apesar de privado, o estaleiro depende de investimento público."

Em uma tarde de segunda, quando a reportagem visitou o distrito, o restaurante Point do Churrasco, de Pedro Dias, 39, estava fechado.

Mesas vazias tomavam o lugar dos clientes que consumiam até 300 refeições por dia.

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À medida que a construção do estaleiro avançava, Pedro aplicou R$ 2 milhões para aumentar o espaço, além de subir quatro andares para uma pousada com 42 quartos e empregar 12 pessoas.

"A gente se empolgou com o estaleiro. Teve gente que caiu em depressão por causa de dívidas."
Sócio da Jereré Tur, do ramo de transporte, Antônio Adelson do Rosário, 54, chegou a ter 40 veículos —28 deles próprios, entre micro-ônibus, vans e carros de passeio— e contratou 60 funcionários.

Atualmente, a frota é de 14 veículos, o quadro é de cinco funcionários, e o contrato com o estaleiro chega a apenas 10% do que representava. "Tive de vender veículos que já havia quitado para pagar dívidas e demitir funcionários."

Com a falta de perspectiva, voltar a tirar o sustento do rio tem sido uma das alternativas —caso de Joilson Borges, 49, pai de duas filhas, que trabalhou no estaleiro de 2012 a 2015.

Antes pescador, Borges foi capacitado para trabalhar como operador de guindaste, período em que ganhava R$ 2.800. Nesse intervalo, reformou a casa, comprou um terreno e se habituou a uma vida mais confortável.

Ele voltou a depender da pesca. "Aqui, em São Roque, toda a comunidade melhorou de vida. Só criança que não trabalhava", recorda, enquanto observa o pôr do sol.

"Agora, saio para pescar. Faço qualquer biscate. A pesca é incerta. Quando é boa, a gente vende. Do contrário, garante ao menos o que comer."

A reportagem percorreu as instalações da Enseada —marca adotada desde agosto passado, como parte do reposicionamento dos negócios da —Odebrecht, uma área de 1,6 milhão de metros quadrados e R$ 3 bilhões investidos.

No lugar do barulho de máquinas e de trabalhadores, um silêncio quase sepulcral se espalha pela instalação de quinta geração (das mais modernas no mundo). Há 50 funcionários, a maioria na manutenção de máquinas.

O maior símbolo do local, o superguindaste Goliath, de 160 metros de altura (um prédio de 50 andares), vão de 130 metros e capaz de içar 1.800 toneladas, nem chegou a operar. O estaleiro não produziu uma embarcação sequer.

Isso porque a principal cliente, a Sete Brasil --que havia encomendado seis das 28 sondas para a Petrobras explorar o pré-sal—, entrou em declínio na fase inicial da Lava Jato

Isso atingiu vários estaleiros pelo Brasil, até mesmo a Enseada, com quem tem uma dívida de mais de R$ 2 bilhões.

Com as denúncias do envolvimento de executivos da Sete —que também era 10% da Petrobras— no pagamento de estaleiros brasileiros que construiriam as sondas, o BNDES vetou empréstimo à empresa.
A recuperação judicial foi pedida em 2016.

A situação instável abala trabalhadores como o operador de máquina de corte Jailson Pedreira, 37, há cinco na Enseada. Ele foi um dos cem enviados para um programa de transferência de tecnologia na Kawasaki, no Japão.

"A gente fica triste porque isto aqui é um sonho para a vida toda. Que os projetos voltem logo para a empresa dar uma guinada."

Na tentativa de salvar o negócio, a Enseada apresentou à Justiça do Rio, em 2017, um pedido de homologação de plano de recuperação extrajudicial, que foi aceito pela 6ª Vara Empresarial do estado.

A companhia ampliou a área de atuação ao entrar na disputa internacional com mais oito países para tocar um projeto da Marinha, que prevê investir, em oito anos, US$ 1,6 bilhão (R$ 6 bilhões), na aquisição de quatro corvetas.

Porém, no ramo de petróleo o principal obstáculo foi a medida do governo Michel Temer de reduzir para 25%, nos setores de óleo e gás, a exigência de conteúdo local.

"O governo federal não pode abrir tanto o mercado para que as empresas que venham explorar petróleo no Brasil tragam navios da China. Até a Petrobras tem feito isso", diz o presidente da Enseada, Maurício Almeida. 

"Será a falência da indústria naval, única a competir com o mercado asiático nesses moldes."

Em nota, a Petrobras rebateu Almeida, ao dizer que "prioriza, na contratação de sondas e plataformas, as ofertas mais competitivas economicamente e que atendam aos requisitos de integridade exigidos pela companhia".

O Ministério de Minas e Energia não se manifestou.