O fim do imposto sindical é um crime contra a democracia e contra os trabalhadores. Fragiliza o mundo do trabalho e libera o mercado para ter ainda mais lucros, abrindo caminho para ampliar a nossa dramática desigualdade social, uma das maiores do mundo. Os mais pobres vão pagar a conta, como sempre acontece no país.
O imposto sindical no Brasil não caiu do céu. Faz parte de um processo institucional. As estruturas brasileiras se caracterizam, boa parte delas pelo menos, por financiamentos obrigatórios.
O sistema político está incluído nesse esquema. Há toda uma estrutura, como o voto obrigatório, o fundo partidário, a propaganda eleitoral obrigatória gratuita e o financiamento público das campanhas. E há muito dinheiro da sociedade para tudo isso. Ou não?
No mesmo plano, está o nosso mundo do trabalho, com uma legislação específica e, dentro dela, estão os sindicatos com a contribuição sindical. Mas há uma diferença -não existe dinheiro público aqui. O trabalhador paga para ter uma representatividade democrática.
Franklin Roosevelt, presidente americano, dizia, quase um século atrás, que os sindicatos criam uma solidariedade entre os trabalhadores para atacar os "malfeitos da grande riqueza". Não há outra forma de representação.
Sabemos que, historicamente, as elites brasileiras possuem tradição autoritária. E essa perversidade se manifesta agora, de novo, quando a recessão jogou a classe trabalhadora de joelhos, com quase 14 milhões de desempregados.
Aproveitando-se dessa hecatombe, parte da elite empresarial e alguns políticos querem acabar com o imposto sindical. Roubam das mãos dos trabalhadores os sindicatos, único instrumento que eles podem usar na defesa de seus direitos.
Para o bem ou para o mal, temos hoje esse sistema regulatório. Isso faz parte da formação histórica, política, trabalhista. Podia ser diferente se tivéssemos, no meu entender, maior justiça social, e a nossa sociedade fosse protagonista de uma cidadania plena. Não é o que acontece, contudo. A retirada da contribuição sindical fragiliza ainda mais a compactação dessa cidadania.
O relator da reforma trabalhista submeteu-se ao discurso de parte da elite empresarial ao defender a "mão invisível do mercado" como reguladora da ação sindical. Diante das transformações do mundo trabalho, o fortalecimento dos sindicatos torna-se crucial.
As entidades sindicais são um dos pilares da democracia. Por óbvio, para ser reconhecido como componente da sociedade, o sindicalismo precisa ser transparente, prestar contas do que faz e submeter-se a modernas auditorias.
Afirmar que muitos sindicatos não são representativos, que são um entulho da Era Vargas, ou que já se paga muito imposto no Brasil não são justificativas aceitáveis para abolir o imposto.
Aqui preciso esclarecer que a Justiça do Trabalho e também a Justiça comum são as maiores "fábricas de sindicatos" que existem no Brasil. O papel dessas associações, isso sim, precisa ser reconfigurado para que sua ação melhore as condições de vida dos trabalhadores.
Transformar os sindicatos em ONGs ou clubes assistenciais é um crime e um assédio. Ambos inaceitáveis. Um aviso: "Mexeu com um trabalhador, mexeu com todos".
RICARDO PATAH, formado em direito e administração, é presidente nacional da UGT (União Geral dos Trabalhadores)