O presidente da Conttmaf e do Sindmar, Carlos Müller, defendeu, em sua participação no seminário comemorativo pelos 20 anos de atuação da Coordenadoria Nacional de Trabalho Portuário e Aquaviário (Conatpa) do MPT – realizado nesta quarta-feira (29), em Brasília –, a atuação firme e coordenada das autoridades brasileiras do setor marítimo no combate às baixas condições de trabalho das bandeiras de conveniência.
Com palestra intitulada Efeitos da Ratificação da Convenção do Trabalho Marítimo (MLC) no Brasil, ele abordou temas como o histórico da ratificação da convenção, a necessidade de efetivo diálogo social e o papel dos ACT, e condenou a extinção da comissão tripartite de discussão do trabalho marítimo ocorrida no governo Bolsonaro – fato que impediu a implementação da MLC na legislação nacional, já que a própria convenção exige que as representações de marítimos e armadores sejam consultadas nesse processo.
O presidente da Confederação criticou, ainda, a postura de armadores do setor de cruzeiros que não chegam a operar 10 navios no Brasil, por ano, em uma temporada que dura apenas seis meses, e tentaram impor a convenção que prevê condições mínimas em vez de cumprirem a legislação nacional, que é mais benéfica aos trabalhadores.
Müller também ressaltou que a campanha contra as bandeiras de conveniência promovida pela Federação Internacional dos Trabalhadores em Transportes (ITF), organização à qual as entidades sindicais marítimas brasileiras são filiadas, está ativa e será fortalecida.
Entre os exemplos de navios substandard no Brasil, estão os afretados pela Petrobras. Um deles é o petroleiro Anfa, embarcação de bandeira das Ilhas Marshall que em novembro de 2022 foi denunciada por manter os trabalhadores sob rígido esquema de racionamento de água, tanto para a manutenção da higiene a bordo quanto para o consumo da tripulação.
O Anfa também não tinha provisionamento de rancho e hortifrutigranjeiros. Além disso, o pouco que havia a bordo estava vencido. Faltavam itens básicos como pão, queijo, leite, frutas e água mineral.
Outro petroleiro de bandeira das Ilhas Marshal afretado pela Petrobras, o Bachata, registrou um acidente pessoal gravíssimo ocorrido com um oficial de máquinas em julho passado. Em decorrência disso, o marítimo teve uma de suas mãos amputada após a porta do incinerador ter fechado, numa falha nos dispositivos de segurança do equipamento.
Mais recentemente, no dia 17 de novembro, três tripulantes foram resgatados do navio de contêineres Ipek Oba, de bandeira panamenha, que está fundeado há mais de seis meses em São Luiz, no Maranhão.
Eles estavam com salários atrasados, se encontravam há mais de 12 meses a bordo e convivendo com a falta de rancho. A situação ainda não foi resolvida e tem-se conhecimento de que o navio está racionando combustível dos geradores, ficando sem energia elétrica em alguns momentos. A representação sindical esclarece que este caso não envolve a Petrobras. De qualquer forma, faz o alerta:
“A principal empresa brasileira beneficiada com bandeira de conveniência é a Petrobras. Ela afreta 150 navios de bandeira estrangeira e tem somente 26 em pavilhão nacional. Essas embarcações afretadas concentram a maior parte das reclamações por baixas condições laborais e assédios moral e sexual, além de não receber as mesmas cobranças para seguir regras de segurança exigidas da frota da própria empresa e não ter os acidentes contabilizados internamente”, denunciou o presidente da Conttmaf ao salientar que os sindicatos brasileiros têm o apoio da ITF no combate a bandeiras de conveniência.
Em sua apresentação, Müller também trouxe um histórico das condições do trabalho marítimo no Brasil e destacou os avanços conquistados pela representação sindical nas negociações de acordo coletivo de trabalho (ACT) ao longo dos anos.
Entre eles, as boas condições remuneratórias e os salários justos garantidos nos acordos assinados pelos sindicatos marítimos e por cerca de 120 armadores que operam em águas brasileiras. O regime de trabalho e repouso 1×1 foi, também, lembrado como um exemplo de conquista alcançada por meio da negociação coletiva.
“Os nossos representados passavam quase dois anos embarcados para tirar um mês de férias. Hoje, os nossos acordos garantem 180 dias por ano para o marítimo ficar desembarcado e poder usufruir de férias ou folgas. Ao retornar do período legal de descanso exigido pela Constituição, ele recebe uma remuneração extra”, afirmou Müller.
Sobre os desafios do setor marítimo para os próximos anos, o dirigente sindical destacou um parecer da Organização Internacional do Trabalho (OIT), emitido durante a Conferência “Shaping the Future of Shipping – Seafarer 2050 Summit, em junho de 2023, em Manilla, nas Filipinas, além dos objetivos a serem buscados por governos, empresas e trabalhadores.
“A visão do diretor-geral da OIT, Gilbert Houngbo, é de que precisamos de um novo contrato social (…) baseado no diálogo, centrado nos direitos dos marítimos, alcançado por meio de uma transição justa [substituição de combustíveis fósseis por energias limpas] e com garantia de que as novas tecnologias melhorem a vida e as condições laborais em vez de piorá-las”, disse, ao acrescentar que é preciso ser desenvolvido um trabalho para, efetivamente, melhorar a vida dos trabalhadores de outros países.
“Não é possível que quem passa 11 meses a bordo de um navio para poder gozar de 30 dias de férias remuneradas vai ter condições justas, dignas, de trabalho e de vida. (…) é preciso que os armadores concedam um tempo maior de folgas remuneradas para os trabalhadores em qualquer lugar do mundo”, concluiu.
O seminário da Conatpa contou com a participação de especialistas como o auditor fiscal Trabalho, Mauro Cavalcante Filho, o ex-coordenador nacional da Conatpa e gerente nacional do Programa Mar a Mar, Augusto Grieco Sant’Anna Meirinho, o presidente da Fenccovib, Mário Teixeira, o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Alexandre Ramos, o diretor de Portos e Costas, vice-almirante Sérgio Renato Berna Salgueirinho, entre outros convidados.