IMAGEM: UNESCO
Nunca se debateu tanto os possíveis limites da "liberdade de expressão", ou seja, o direito de um indivíduo manifestar-se sem que seja censurado ou reprimido quanto a convicções pessoais, pensamentos, atividades intelectuais, entre outros, até porque trata-se de um dos princípios inerentes à dignidade da pessoa humana, garantido pelo artigo 5º da Constituição Federal.
É fato que as restrições quanto ao direito de livre manifestação acontecem quando constatadas violações a outras garantias constitucionais, não menos importantes, expressas no texto constitucional.
Assim, em nome da "liberdade de expressão", não é aceitável que haja violação da intimidade, da vida privada, da honra ou da imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente dessa violação, sendo certo que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais, conforme incisos X e XLI do artigo 5º da Constituição Federal.
Como vimos, o direito à liberdade de expressão não é absoluto e o trabalhador está incluído nesse contexto.
Com o advento da internet e a proliferação do uso das chamadas redes sociais, como Instagram, Facebook, Twitter e outras, foi estabelecido um novo padrão de sociabilidade entre as pessoas.
Inegável que o Direito do Trabalho vem sendo afetado por esse fenômeno, diante de uma "sociedade digital", e busca adequar-se a esse processo de mutação para que possa continuar atendendo às necessidades prementes das transformações digitais e os impactos em nossas vidas, diante da realidade virtual e de um mundo globalizado, sem fronteiras.
Dessa forma, diante da nova realidade de convívio e vigilância a que todos estamos sujeitos, a internet está longe de ser caracterizada como um refúgio, sendo falsa a sensação de que nesse espaço as pessoas conseguem expressar o que são ou pensam, longe das preocupações com as repercussões no mundo externo.
Quanto ao tema "liberdade de expressão dos trabalhadores nas redes sociais e as repercussões no contrato de trabalho", surgem vários pontos que considero que sejam importantes, diante da controvérsia que acende os debates.
Questiona-se a possibilidade de o indivíduo manifestar-se livremente em relação ao empregador, utilizando-se para tanto das redes sociais, tecendo comentários considerados difamatórios sobre o ambiente de trabalho ou até mesmo contrários aos valores da organização empresária com a qual mantém vínculo empregatício, sob o argumento de que é livre o direito de expressar-se.
Outro ponto: o poder diretivo do empregador possui limitações em relação à adoção de medidas disciplinares quando as condutas do empregado, tidas como inadequadas ou inaceitáveis, são praticadas no ambiente digital?
É de fato permitido ao empregador o exercício desse autocontrole, extramuros da empresa, em ambiente virtual e privado?
Os atos da vida privada não devem repercutir nas relações de trabalho, porém, não tem sido aceitável que o empregado se exponha nas redes sociais de forma a denegrir sua imagem, a do empregador ou até mesmo de colegas e superiores hierárquicos, até porque a conduta externa do empregado reflete na imagem da empresa à qual ele se vincula.
Espera-se do empregado a chamada postura online, condizente com os valores éticos e missões do empregador, que preocupa-se legitimamente em manter a excelência das boas práticas corporativas, que tenham reflexos na organização como um todo, preservando sua idoneidade por estar em compliance.
Na verdade, há possibilidade de o empregador punir o empregado em razão das condutas praticadas na vida privada, notadamente manifestadas nas redes sociais, que podem macular a imagem da empresa perante a coletividade de trabalhadores e até mesmo clientela.
Têm sido recorrentes perante o Judiciário Trabalhista decisões confirmando demissões por justa causa fundamentadas em "postagens" feitas pelo trabalhador em redes sociais, em que teria difamado a empresa e até mesmo superiores hierárquicos, tratando-se de conduta reprovável e desrespeitosa a ponto de inviabilizar a manutenção do vínculo de emprego.
Porém, para aplicação de penalidades em razão de condutas praticadas em redes sociais dos trabalhadores, necessários cuidados e procedimentos por parte dos empregadores, sob pena de reversão de caracterização de abuso do poder diretivo do empregador, mostrando-se por demais intrusivo.
A conduta, externada por postagens em redes sociais ou até mesmo as chamadas "curtidas", devem ter conteúdo com efeitos reflexos ao empregador ou ao contrato de trabalho. Podemos citar como exemplo os discursos de ódio, além dos limites permitidos para a liberdade de expressão que remeta à imagem da empresa ou de sua marca.
Essas questões devem ser enfrentadas pelos empregadores, junto aos trabalhadores. Para tanto, as empresas devem apostar em políticas internas no sentido de que os trabalhadores tenham conhecimento inequívoco em relação ao comportamento esperado também nas mídias sociais, que deverá ser pautado pela ética, pelo respeito e pela idoneidade em todas as atividades e que a alta administração apoie e contribua para a disseminação dessa cultura.
ELIZABETH GRECO: é advogada especialista em relações do trabalho da Lopes & Castelo Sociedade de Advogados
FONTE: REVISTA CONSULTOR JURÍDICO/CONJUR