(Foto: REUTERS/Amanda Perobelli)
Desocupados e trabalhadores de baixa renda somam mais de 30 milhões de pessoas no Brasil. Em 2021, país terá de criar, ao menos, 18 milhões de vagas para evitar explosão da pobreza após o fim do auxílio. Boa parte vai se abrigar no setor informal, apostam especialistas
O maior desafio do Brasil, em 2021, será lidar com o desemprego. Mais de 30 milhões de brasileiros ganham menos do que precisam para viver com dignidade ou estão desempregados. Para evitar a explosão da pobreza, sobretudo após o fim do auxílio emergencial, o país terá de criar, pelo menos, 18 milhões de vagas. Isso porque cerca de 15 milhões de pessoas, que vinham sobrevivendo com o benefício, voltarão a buscar trabalho. Além disso, há a entrada natural de três milhões de novos profissionais por ano no mercado de trabalho.
A pandemia de covid-19 levou mais de 11 milhões de pessoas a perderem seus empregos, tanto formais quanto informais, segundo dados da Pnad Contínua do terceiro trimestre de 2020, na comparação com igual período de 2019. No entanto, a taxa de desemprego não disparou na mesma proporção porque 10 milhões de pessoas deixaram de procurar trabalho. No trabalho formal, houve recuperação de empregos com carteira assinada após o auge da pandemia. Em novembro, foram 414.556 postos, segundo a série histórica do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
No entanto, os especialistas explicam que isso é uma recomposição das perdas acumuladas dos empregos com carteira assinada, não só durante a pandemia, mas, também, nos anos de recessão da economia, entre 2015 e 2016. O desemprego segue em alta e atinge 14 milhões de brasileiros, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que avalia todo o mercado de trabalho, inclusive o informal e por conta própria. E as perspectivas para 2021 não são boas, como reconhece o peixeiro Paulo Júnior Ferreira, desempregado.
Paulo pensa em voltar para o Rio de Janeiro, terra natal, porque sua situação no Distrito Federal piorou com a pandemia. “Perdi o emprego e estou em situação de morador de rua. O dinheiro que eu recebi da empresa foi para suprir as necessidades, mas acabou e o dono do imóvel onde morava me despejou”, lamenta. Atualmente vendendo balas nas proximidades da Rodoviária do Plano Piloto e, também, procurando emprego, Paulo acredita que 2021 não vai ser fácil. “Acho que vai ficar mais difícil achar emprego, com mais gente procurando”.
Informalidade
O professor do Insper Sergio Firpo confirma o temor de Paulo. “O que vai ocorrer, em 2021, é que a taxa de desemprego vai aumentar muito, porque pessoas fora da força de trabalho vão ingressar na busca por uma ocupação. E, apesar de haver uma retomada, vai ser insuficiente para garantir emprego para todo mundo”, avalia. Uma boa parte dessas pessoas vai se abrigar no setor informal.
“Também veremos um número grande de pessoas trabalhando por conta própria. As empresas encaram a contratação formal como um custo e só vão contratar quando as incertezas acabarem. Enquanto isso, todo mundo precisa sobreviver de alguma forma”, diz. Ele destaca, ainda, que, na hora de incorporar pessoas desempregadas, o mercado de trabalho deve reduzir a renda. “Elas vão aceitar empregos por salários menores ou vão se sujeitar a receber menos em ocupações informais. Então, a renda terá uma pequena queda no ano que vem”, estima.
O economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) Rodolpho Tobler ressalta que é preciso avaliar o histórico do emprego para fazer uma projeção. “Quando a pandemia chegou, o impacto foi mais forte justamente para os informais pela necessidade de não circulação”, assinala.
O isolamento também reduziu a taxa de desemprego, porque as pessoas não tinham como procurar trabalho, lembra Tobler. “O auxílio emergencial foi importante para atenuar os efeitos e tivemos até redução da extrema pobreza neste período. Mas, a taxa deve aumentar em 2021, porque, sem o benefício, uma nova renda será urgente”, afirma. Para o especialista, a expectativa é negativa porque 2021 colocará um grupo considerável de pessoas na pobreza e extrema pobreza. “A recuperação econômica não será forte o suficiente para abarcar todo mundo.”
No entender de Renan Pieri, professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (Eaesp/FGV), 2020 foi o pior ano da história e atingiu em cheio o comércio e serviços, setores que mais geram emprego. “Algumas medidas diminuíram o impacto. O auxílio emergencial, que gerou fluxo de demanda e garantiu melhoria de indicadores de desigualdade, e o programa que permitiu redução de jornada e salário”, sustenta. “Só não disparou mais o desemprego por conta desse programa”, diz.
A reboque da vacinação
Na opinião do professor de Finanças do Ibmec Gilberto Braga, a recuperação do mercado de trabalho vai estar a reboque do avanço do novo coronavírus. “Quanto mais rápido houver solução mundial e brasileira para a pandemia, maiores as chances de reversão e geração de empregos no mercado interno”, analisa. A incerteza atual, segundo o especialista, retarda as decisões de investimento, a recuperação da economia e a geração de empregos. “Vai depender de um plano de vacinação”, sentencia. Em um cenário otimista, Braga acredita que pode haver uma reação do emprego a partir do segundo trimestre de 2021.
As relações de trabalho foram testadas na pandemia, na avaliação de Camilo Onoda Caldas, advogado trabalhista e diretor do Instituto Luiz Gama. “Não fossem os programas emergenciais e o sistema público de saúde, o Brasil teria sido devastado. Mas o gerenciamento de crise também serviu para desenvolver outros caminhos para nossa sociedade”, ressalta.
Mas, nem tudo são espinhos. Algumas áreas tornaram-se promissoras durante a pandemia, lembra Caldas. “O comércio digital desenvolveu-se muito nesse período e as atividades ligadas ao e-commerce, informática, telecomunicações e logística”.
Professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (Eaesp/FGV), Renan Pieri concorda e destaca alguns setores que evoluíram com a pandemia e passaram a empregar mais. “A saúde, porque já estava com uma demanda represada e foi ainda mais pressionada. A parte de tecnologia, que já vinha tendo crescimento, as compras on-line, os aplicativos que intermediam as relações entre comprador e vendedor, tudo isso mudou de patamar e esses setores passaram a contratar”, pontua. (SK e JRS)
FONTE: CORREIO BRAZILIENSE