Vacina da Pfizer - 31/10/2020 REUTERS/Dado Ruvic

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Dificuldades impõem desafios. Mesmo com eficácia de uma vacina contra covid-19, governos e populações ainda terão de manter cuidados

A produção da vacina contra a covid-19 é um marco da ciência no mundo. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), havia em dezembro mais de 200 vacinas candidatas em desenvolvimento. Mais de 50 delas já estão sendo testadas em humanos. Mais de 40 países já iniciaram campanhas de vacinação em massa ainda em 2020. No Brasil, o governo federal não assegura – nem desenvolveu estrutura para isso – que haverá condições de iniciar a imunização antes de fevereiro. O atraso brasileiro na expectativa da vacinação é um reflexo de toda a falta de comando, de responsabilidade e de competência que marcou a gestão da pandemia do novo coronavírus pelo governo de Jair Bolsonaro.

O mundo porém, acelera para obter os imunizantes elaborados em menor tempo na história, graças aos avanços tecnológicos envolvidos em suas composições. A corrida, agora, é para agilizar os processos de aprovação dos fármacos em agências reguladoras. Entretanto, mesmo a eficácia da vacina contra a covid-19 – primeiro grande passo da humanidade para virar a página da pandemia – significa que tudo poderá voltar ao normal tão rapidamente como desejam as pessoas.

Isso porque, até as nações alcançarem a imunidade de rebanho através dos imunizantes (e não do contágio), existe um longo caminho. Especialistas argumentam que mesmo os que tomarem a vacina nas primeiras levas devem manter os cuidados e um distanciamento social adequado, para proteger os que deverão esperar a produção de mais doses.

O ministro da Saúde da Alemanha, Jens Spahn, fez um alerta na última semana, um dia após o início da vacinação no país. “Ninguém deve reivindicar direitos especiais até que todos tenham a chance de se vacinar. Muitos aguardam solidariamente para que alguns possam ser vacinados primeiro. E aqueles que ainda não foram vacinados esperam que os vacinados sejam pacientes, em um gesto de solidariedade”, disse. Segundo o ministro, não se sabe ao certo se os vacinados não transmitem para os ainda não imunizados: “Pois não sabemos se a vacina protege apenas a pessoa vacinada ou também contra a transmissão para outras pessoas”.

Logo, é necessário cautela. A Alemanha, embora tenha iniciado o processo de forma ágil, vive um período difícil da pandemia. O país registrou mais de 1.600 mortes por coronavírus nos últimos dois dias do ano – a maior ocorrência desde o início da pandemia – e encerrou 2020 covid-19 com quase 1,8 milhão de casos de covid-19 e 34 mil mortes.

Cuidados redobrados

A pandemia de covid-19 é a maior crise sanitária do mundo em mais de 100 anos, depois da gripe espanhola (1918-1920). O vírus possui grande poder de disseminação e está presente nos sete continentes. No Brasil, todos os municípios já reportaram casos. A grande presença do vírus, aliado às dificuldades logísticas de uma vacinação em massa – e até mesmo problemas civilizatórios (como a existência de pessoas contrárias às vacinas) –, exigirá cuidados de populações e governos mesmo após o início da vacinação em massa.

É o que defende a pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Margareth Dalcomo. “No Brasil, não há um município que não tenha caso registrado. O vírus vai ficar endêmico. Portanto, o fato de ser vacinado não nos isenta de andar de máscara pelos próximos dois anos, por exemplo. De termos cuidado com ambientes fechados, de solicitarmos testes negativos para embarcar em voos internacionais”, disse Margareth, em recente entrevista à Folha de S. Paulo.

O caso brasileiro

No Brasil o cenário é ainda mais grave, porque o governo do presidente Jair Bolsonaro sempre negou a gravidade da crise, ridicularizou mortes e obstruiu medidas recomendadas pela ciência. Agora, pouco fez para que o Brasil pudesse agilizar pesquisas da vacina contra a covid-19 e já pudesse contar com um processo de imunização. Bolsonaro chegou a afirmar que vacinas aprovadas em países como Alemanha e Estados Unidos “transformam gente em jacaré”. E mentiu que a vacina em estudo pelo Instituto Butantã, em São Paulo – a CoronaVac, desenvolvida em parceria com a indústria chinesa Sinovac –, provocaria “má formação”. Ele chegou a comemorar a interrupção breve dos estudos. “Mais uma que Bolsonaro ganha“, disse.

Em uma desastrosa ação mais recente, o governo perdeu um edital de compra de seringas, o que pode provocar desabastecimento mesmo deste insumo básico. Enquanto isso, não existe previsão concreta ou um calendário adequado de vacinação. A Fiocruz informou que vai exigir aprovação da vacina da AstraZeneca, em estudo pela entidade brasileira, já que o medicamento foi aprovado na quarta-feira (30) pela agência reguladora de vigilância sanitária da Inglaterra.

Vigilância

Contudo, a condução de Bolsonaro é tão adversa que o partido Rede Sustentabilidade pediu no Supremo Tribunal Federal que obrigue o governo federal a relatar semanalmente como está lidando com a questão das vacinas.

“O presidente da República vem responsabilizando as empresas pelo atraso que, na verdade, é decorrente de sua omissão em planejar a aquisição de vacinas e a imunização da população. Por outro lado, as empresas enfrentam dificuldades em obter o registro definitivo ou a autorização emergencial diante do provável maior conservadorismo da Anvisa”, afirma o partido, em nota à imprensa.

A Rede ainda argumenta que “a atuação errática do governo federal na condução do enfrentamento da pandemia não pode continuar, merecendo a intervenção imediata do Supremo Tribunal Federal na defesa do povo brasileiro para que receba a mesma proteção que a população dos demais países já está recebendo”.

A expectativa de um tratamento mais sério pelo Estado brasileiro à busca da vacina contra a covid-19 chegou à Câmara dos Deputados. A Casa viverá nas próximas semanas o debate da sucessão de Rodrigo Maia (DEM-RJ) na presidência da Câmara. E o PT, que tem a maior bancada, condiciona sua adesão a um bloco que lançou a candidatura de Baleia Rossi (MDB-São Paulo) ao compromisso com a luta pela vacina.

 FONTE: REDE BRASIL ATUAL