CAPITALISMO JABUTICABA
A devastação é total. Nem na ditadura militar houve uma ofensiva tão grande contra os direitos dos trabalhadores e suas representações sindicais.
O governo Michel Temer (PMDB) e o Congresso Nacional perpetraram tal golpe sem qualquer tipo de discussão com a sociedade, visando apenas a agradar à elite empresarial e financista.
Usou-se o pretexto de que a reforma trabalhista ajudaria na criação de empregos e na melhora da economia. No entanto, nenhum desses objetivos será atingido.
Logo após a aprovação das novas regras, começaram as demissões no Bradesco, na Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil, através de planos de demissões voluntárias. O governo fez ampla divulgação da criação de algumas vagas, especialmente na agricultura. Mas há um detalhe: elas foram criadas pela legislação antiga, agora demolida.
O governo, que poderia ser o indutor do crescimento econômico, não tem recursos nem mesmo para manter a máquina pública em funcionamento. Corta despesas em serviços essenciais, como saúde, educação e segurança.
Sobram verbas, porém, para as emendas dos parlamentares que votam em benefício do Palácio do Planalto -foi liberado R$ 1 bilhão nos dois últimos meses.
E o "toma lá, dá cá" não para por aí. O congressista que vota contra o governo pode perder ou não conseguir cargos para correligionários na esfera pública federal.
Todo mundo sabe que a geração de empregos não virá da destruição da legislação trabalhista. Não foi a CLT, agora esquartejada, que levou o Brasil, até recentemente, ao pleno emprego?
Nem é preciso ler teóricos do capitalismo para saber que apenas investimentos produtivos poderão reverter a recessão em que o país se encontra. A retirada de direitos, por óbvio, vai agravar um cenário já bastante tenebroso.
A proposta aprovada privilegia o mercado, destrói a classe média, torna os ricos mais ricos e os pobres mais pobres. Reduz o gasto com o já fragilizado bem-estar social e elimina o movimento sindical, numa drástica afronta à democracia.
Nas muitas reuniões de que participei no Congresso Nacional, nunca vi tanto ódio contra os trabalhadores e as instituições que as defendem quanto nas votações da reforma. "Não existe uma boa sociedade sem um bom movimento sindical", bem afirmou o papa Francisco.
A sociedade, o mercado e a expectativa de vida da população mudaram. É claro que as relações de trabalho e previdenciárias, neste novo contexto, precisam ser rediscutidas com a sociedade, mas não da forma precipitada empreendida pelo governo.
O relator dessa desastrada reforma revelou em abril, com rara sinceridade: "a reforma da Previdência nos deu uma espécie de cortina de fumaça. Só se fala dela. Está fora do radar a reforma trabalhista. É bom que seja assim". Vê-se que todo o processo foi encaminhado de maneira nada republicana.
Que fique bem claro: a UGT (União Geral dos Trabalhadores), segunda maior central sindical do país, é a favor de reformas. Somos uma central reformista.
Reformas justas, bem-entendido, nas quais a classe trabalhadora e as camadas mais pobres da população sejam valorizadas.
O comércio fechou 9.950 lojas nesse primeiro trimestre. Os bancos desativaram 928 agências bancárias. Até o setor automotivo, que está exportando, demitiu mais de 6.000 trabalhadores ao longo dos últimos 12 meses. Há no país cerca de 14 milhões de desempregados.
Todavia, flexibilizar a lei trabalhista, especialmente com a terceirização sem limite e o trabalho intermitente, não garante a mudança desse quadro.
Na verdade, outros problemas surgirão: os empregos serão mais precários, a renda dos trabalhadores e a capacidade de compra diminuirão.
A reforma, portanto, é mais um efeito nefasto de um capitalismo jabuticaba que só existe aqui.
RICARDO PATAH, formado em direito e administração, é presidente nacional da UGT (União Geral dos Trabalhadores)