IMAGEM: ANDRÉ PENNER (AP)

Liderada pelo Brasil, a América do Sul apoia uma proposta de imposto de carbono menos ambiciosa. Enquanto isso, América Central, Caribe e México querem promover uma transição mais rápida e justa.

As expectativas de ação climática deste ano estão focadas no Brasil. Em novembro, o país sediará a Conferência sobre Mudanças Climáticas (COP30) na cidade amazônica de Belém do Pará com uma mensagem de urgência. Mas esta semana, em Londres, delegados de 176 países ao redor do mundo também se reunirão para negociar uma questão igualmente importante, mas menos visível: concordar com um caminho para o comércio marítimo internacional atingir emissões líquidas zero até 2050. Nessas negociações, que geralmente ocorrem sem figuras presidenciais, o Brasil desempenhou um papel mais próximo de um obstrucionista do que de um embaixador do clima.

Liderado pela Organização Marítima Internacional (OMI) , entidade das Nações Unidas responsável pela regulamentação do transporte marítimo, o que for acordado será vital. Juntos, navios e barcos são responsáveis ​​por aproximadamente 2,8% das emissões globais, número maior que os gerados pelo México e Brasil (1,4% e 1,2%).

Embora vários pontos sejam discutidos entre 7 e 11 de abril, dois serão cruciais: impor um imposto sobre o carbono e criar um padrão global para combustíveis fósseis. Tanto na América Latina quanto no Caribe, a situação está dividida, explica Santiago Piñeros, advogado do Programa de Ecossistemas da Associação Interamericana para a Defesa do Meio Ambiente (AIDA). As propostas sobre a mesa em relação ao imposto poderiam ser resumidas em duas. Países que desejam uma taxa universal onde uma taxa fixa é cobrada por cada tonelada equivalente emitida por um navio; e aqueles que buscam permitir uma porcentagem de emissões para cada embarcação e, como acontece no mercado de carbono da União Europeia, se um país consegue reduzi-la abaixo desse limite, ele pode "vender" o que sobrar para um país que tenha ultrapassado esse limite.

"Do lado do imposto universal estão as ilhas do Caribe, que apoiaram essa ideia, lideradas por pequenas ilhas e estados insulares", diz o especialista. Há também alguns países da América Central e o México localizados lá . Do outro lado, porém, estão os estados sul-americanos, apoiando uma sugestão vinda do Brasil, China e outros produtores de combustíveis fósseis.

Do ponto de vista climático, acrescenta Piñeros, o imposto universal permitiria uma transição energética mais acelerada e baseada na ciência, evitando que a temperatura do planeta subisse mais de 1,5° ou 2°C até o final do século, em comparação com a era pré-industrial. Buscá-lo por meio de um mercado de carbono, ele acrescenta, "é perigoso porque pode acabar impedindo a transição".

Em documento enviado à OMI e apoiado por Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Paraguai, Peru e Uruguai, os países contrários ao imposto universal expõem algumas de suas razões para se opor a ele. Eles dizem que isso colocaria em risco as exportações dos países em desenvolvimento, aumentaria os preços dos alimentos e aumentaria as desigualdades entre os países.

Mas, para Piñeros, o fato de os países sul-americanos estarem ao lado do Brasil e de outros grandes produtores de combustíveis fósseis revela que eles não estão vendo uma oportunidade: que do outro lado — o bloco que apoia um imposto universal — eles também estão pressionando pela criação de um fundo para coletar todos os recursos do imposto sobre o carbono para redistribuí-los de forma justa e equitativa entre os países.

Se esta parte da proposta for levada em conta, um imposto universal sobre o carbono seria economicamente mais conveniente a longo prazo, ou seja, até 2040 e 2050, conforme observado em um relatório da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento ( UNCTAD ) . 

Os países que se opõem, no entanto, têm medo do que acontecerá no curto prazo: que o Produto Interno Bruto mude e o índice de preços ao consumidor suba.Biocombustíveis, uma luta com sabor brasileiro.

A segunda medida inovadora é criar um padrão global de combustível. Basicamente, os delegados devem concordar com um roteiro para que os combustíveis fósseis eliminem gradualmente a energia marinha. Não é apenas uma questão de determinar quais porcentagens serão permitidas a cada ano, mas também quais delas serão retiradas de cena mais rapidamente. O Brasil —também arrastando consigo os países da América do Sul—está lutando para garantir que os biocombustíveis sejam recompensados ​​por esse padrão. Ou seja, combustíveis produzidos a partir de materiais como milho e cana-de-açúcar.

Para um setor da sociedade civil, isso não é uma boa ideia. “Há uma profunda preocupação de que os impactos na saúde humana estejam sendo negligenciados”, diz Elissama Menezes, codiretora da Equal Routes, uma organização que monitora de perto essas reuniões. “Uma proposta foi até mesmo submetida à OMI para destacar os riscos dos combustíveis marítimos à base de metano, incluindo gás natural liquefeito, biometano e gás natural liquefeito sintético, pois eles liberam poluentes associados a doenças respiratórias, problemas cardiovasculares e um risco maior de câncer”, ele diz. E ele acrescenta que os biocombustíveis têm um impacto negativo no desmatamento e que sua produção pode entrar em conflito com a terra necessária para alimentar o planeta.

De uma perspectiva econômica — não climática ou de justiça, ele esclarece — faz sentido que esta seja uma medida que o Brasil esteja promovendo. O país está alcançando números históricos com biocombustíveis. Em 2024, serão gerados 35,4 bilhões de litros de etanol, 15% a mais que em 2023. No entanto, os outros países sul-americanos que o apoiam não são grandes produtores de biocombustíveis.

Na IMO, países com menos poder o cedem ao gigante Brasil. A participação da Colômbia, por exemplo, está muito longe de sua participação na Conferência sobre Diversidade Biológica (COP16), liderada pela ex-ministra do Meio Ambiente Susana Muhamad, que o presidente Gustavo Petro usou para se retratar ao mundo como um herói ambiental.

Nessas discussões, são os países da América Central, as ilhas e o México que se posicionam em prol da América Latina e do Caribe, posicionando-os como uma região disposta a conter as mudanças climáticas em todas as áreas.

FONTE: EL PAÍS